Márcia Haydée: A Musa de John Cranko

Por muitos anos, Márcia Haydée foi a maior referência brasileira na dança clássica mundial, mesmo que fosse mais brasileira por nascença do que carreira. Afinal, ela alcançou o estrelado na Europa, onde virou uma lenda, destacada tanto por suas impressionantes performances como bailarina quanto por sua habilidade inovadora como coreógrafa e diretora de companhias.

Nascida em 1937 em Niterói, ela é lembrada pela força dramática de suas atuações e por ter marcado a dança como uma artista versátil e apaixonada. A trajetória de Haydée ilustra a evolução da dança clássica e contemporânea no século 20, desde suas raízes brasileiras até o auge em palcos europeus, onde firmou seu legado.

Início e formação

Haydée começou a dançar em uma idade precoce e, aos 15 anos, decidiu partir para Paris para estudar no balé da cidade, onde aperfeiçoou suas habilidades técnicas e desenvolveu o talento que mais tarde a tornaria famosa. Ainda com 16 anos, Márcia entrou para a escola do Royal Ballet em Londres, mas, como na época não contratavam estrangeiros, foi para Monaco.

Em 1957, mudou-se para o Ballet de Marquis de Cuevas, onde rapidamente ganhou destaque pela intensidade e expressividade de suas performances. Sua presença de palco logo atraiu a atenção internacional, e ela começou a receber convites para participar de companhias renomadas ao redor do mundo.

Stuttgart Ballet: Parceria com John Cranko

O ponto de virada na carreira de Haydée veio em 1961, quando ela se juntou ao Stuttgart Ballet, na Alemanha, sob a direção de John Cranko. A parceria com Cranko foi especialmente significativa para Haydée e para o mundo do balé. Ele a escalou para papéis principais em suas produções, como em Romeu e Julieta, Othello e Onegin. Ela trouxe vida a essas personagens com uma combinação única de força e vulnerabilidade, ajudando a redefinir o estilo e o alcance emocional do balé narrativo.

Juntos, Cranko e Haydée deram ao Stuttgart Ballet uma reputação internacional, que transformou a companhia em um dos principais centros do balé contemporâneo. Haydée tornou-se a musa de Cranko, e muitos dos papéis foram criados com ela em mente, o que permitiu que explorasse diferentes aspectos de sua expressão artística. Cranko faleceu em 1973, e Haydée assumiu um papel ainda mais central na preservação e expansão de seu legado.

Para Márcia, Cranko criou algumas das coreografias mais inovadoras e papéis cômicos e dramáticos, revelando uma das maiores qualidades da bailarina além da técnica de dança, era de atriz. Algo que fez com que se destacasse mesmo em períodos entre as grandes.

Por muito tempo, Márcia era chamada de a Callas da dança, justamente por sua dramaticidade e exigência por perfeição. E ela era, perfeita.

Diretora Artística e Coreógrafa

Após a morte de Cranko, Haydée foi nomeada diretora do Stuttgart Ballet em 1976, posição que ocupou até 1996. Como diretora artística, ela teve um papel crucial em preservar o repertório de Cranko e em introduzir novas coreografias. Haydée também trabalhou com coreógrafos de renome, como Maurice Béjart e Kenneth MacMillan, além de desenvolver suas próprias criações. Sua direção focada em preservar a narrativa emocional das obras garantiu que o Stuttgart Ballet continuasse a ser referência no balé dramático.

Haydée foi uma das primeiras a explorar a ideia de “bailarinos-atores”, incentivando os dançarinos a incorporarem emoções reais e profundas em suas performances. Sua própria carreira era um exemplo claro dessa abordagem: cada movimento, cada gesto, refletia uma dedicação absoluta à arte e à narrativa, e essa qualidade era algo que ela também buscava instilar em seus dançarinos. Como diretora, ela trouxe ao Stuttgart produções icônicas e conseguiu atrair novos talentos que mantiveram a companhia na vanguarda do balé.

Vida Pessoal e Legado

Apesar de sua fama internacional, Haydée sempre manteve uma forte ligação com suas raízes brasileiras. Ao longo dos anos, ela retornou várias vezes ao Brasil para apresentações e colaborações. Entre seus projetos mais notáveis, está a interpretação de obras como Carmen e A Dama das Camélias, nas quais mostrou sua habilidade para reinterpretar papéis clássicos através de uma perspectiva moderna e autêntica. Ela também trabalhou na criação de versões de balés que homenageiam suas origens, adicionando toques de brasilidade e explorando temas ligados à cultura brasileira.

Márcia Haydée continua a influenciar gerações de bailarinos e coreógrafos ao redor do mundo. Sua carreira é marcada por uma capacidade única de viver a dança de forma completa, tanto em cena quanto nos bastidores. Para o público, ela oferece uma experiência profunda e inesquecível; para os dançarinos, deixa um exemplo de disciplina e paixão pela arte. Em reconhecimento por sua contribuição ao balé e à cultura, Haydée recebeu várias honrarias, como a Cruz de Mérito da Alemanha, e é constantemente celebrada como uma das grandes figuras do balé mundial.

Em suma, Márcia Haydée é mais que uma bailarina ou uma diretora de balé. Ela representa um espírito inquebrável, que eleva a dança a um patamar de verdadeira arte dramática, combinando técnica apurada com uma entrega emocional raramente vista. Hoje, ela é um exemplo duradouro de como a dança pode transcender barreiras culturais e temporais, inspirando tanto espectadores quanto artistas a ver o balé como uma forma de expressão que vai além do palco.

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