The Idol: nem tanto, nem menos

Quando o showrunner vira assunto como seu conteúdo, a meu ver, desvia muito da proposta de nos levar em uma viagem de outro universo e nos envolver com as personagens. Foi assim com True Detective, onde se ouvia falar mais de Nic Pizzolatto nos bastidores querendo as coisas do jeito dele do que ter uma trama que fizesse sentido, e me parece que está sendo assim com a recém estreada The Idol, de Sam Levinson, o autor da premiada Euphoria. As críticas negativas sobre os primeiros episódios exibidos em Cannes, a diretora Amy Seimetz saindo antes de terminar o trabalho e as notícias de cenas de sexo ‘ultra gráficas’ geraram mais curiosidade do que a história da pressão da fama sobre a estrela Jocelyn (Lily-Rose Depp). Armadilhas! Vamos analisar o que foi apresentado.

No único episódio liberado na plataforma da Max (ex HBO), somos apresentados a uma espécie de Britney Spears pós crise: Jocelyn é a maior estrela pop do momento, teve uma crise nervosa após algo que aconteceu com sua mãe (morreu? se sim, como? brigaram?) e está ensaiando um retorno, mas está cercada por uma equipe que a ‘protege’ das verdades, que nunca diz ‘não’ a nada que ela faça ou peça e assim a isola da realidade e da conexão com as pessoas. Jocelyn é uma pessoa sexual e frágil, busca preencher seu vazio existencial com drogas, bebidas e festas. Em uma de suas ‘escapadas’ na noite de Los Angeles cai no colo de um dono de uma boate, Tedros (Weeknd), que imediatamente estabelece uma influência sobre ela – criativa, sexual e amorosa – sendo uma figura sombria e claramente oportunista. Pelo teaser do que vem a seguir, ele vai tomar o comando da vida e da carreira de Jocelyn, mas ao mesmo tempo a expondo a um mundo ainda mais perigoso do que ela possa antecipar.

A proposta da trama não é nada inovadora e se levarmos a ficção em consideração, o universo da música é perigoso e repleto de parasitas, prontos para destruir a alma de artistas sensíveis. A lista que reconta essa história é longa, seja com humor (Be Cool: O Outro Nome do Jogo é uma pérola) ou drama (The Rose, Nasce uma Estrela, Daisy Jones e os Seis, etc), portanto The Idol facilmente cai na rede de clichês sobre Hollywood, sem deixar de ser honesta.

Lily-Rose Depp está ótima, não achei a figura soturna de Weeknd tão problemática e a trilha sonora obviamente não decepciona. O ‘problema’ da série está na intenção de ser ‘disruptiva’/ousada como motor da narrativa, esquecendo de nos conectar com as pessoas e por isso, pelo menos com o público feminino, acaba sendo machista e vazia. Me lembrou o erro principal de Blonde que ao ‘criticar’ a exploração de um ídolo, a explora ainda mais. Ana de Armas foi perfeita como Marilyn Monroe, mas em constante crise mental, alternando as cenas de sexo e de lágrimas em segundos, como demandada. Lily-Rose passa pelo mesmo problema com Jocelyn: está mentalmente frágil, chora, fuma e faz sexo como se fosse oxigênio. Não há um frame no qual não esteja lânguida ou praticamente nua, ou, simplesmente sem roupa. A cena na qual ridicularizam o consultor de intimidade, que tenta protegê-la e que é literalmente trancado em um banheiro foi minimamente agressiva e retrógrada. A exploração sexual e feminina gratuita é nociva e é uma das principais armas de The Idol. Não será reduzida em nada até o fim da temporada.

É estranho que machos tóxicos ainda insistam em normalizar a exploração, tachando críticos de puritanos. E infelizmente estrelas de talento se submetam a isso. Uma nudez bem usada é muito mais sexy do que exposta 99% do tempo. Mas que seja. Lamento e passo a ver o peso de Euphoria com outros olhos. O outro recado agressivo foi a frase claramente forçada de que “saúde mental é sexy”, para desenvolver o poder da exploração sobre a fragilidade de Jocelyn. Fora o perigo da afirmação, se a história é alertar o problema da vulnerabilidade de astros como a mola da fama, passou longe do marco. Sim, é uma tese interessante achar que seja a instabilidade do ídolo que o torne mais humano para os fãs, que vêem nisso a chance de aproximação, mas é também simplificar demais o que o universo do entretenimento faz com a alma de pessoas mais sensíveis. Como foi apenas um único episódio, é cedo para já esperar o pior. Por outro lado, um diálogo tão forçado e manipulador como esse tira o charme de que o público possa descobrir isso sozinho.

Em resumo, The Idol não é tão ruim como dizem, mas não mostrou potencial de ser tão ousada como anunciam. É uma espécie de Blonde sobre Britney Spears em vez de Marilyn Monroe, um conto sobre um universo machista e opressor explorando a alma de uma mulher em crise. Já vimos isso mil vezes antes.

Dito tudo isso, pensamentos soltos:

  • Que casa linda é a do Weeknd! Isso mesmo, as filmagens da casa de Jocelyn foram feitas na casa verdadeira do músico. Que bom gosto!
  • Ultra suspeita a relação de Anys (Jenny Kim) com Jocelyn e com Tedros. Ela faz parte do esquema. Ela é quem sugere à Joss de irem a uma boate que ela ainda não conhece e assim que entra Tedros começa a agir para se aproximar da estrela. Igualmente todos estão atentos aos esforços de Leia (Rachel Sennott) de proteger a amiga/chefe, portanto a aparição de Izaak (Moses Sumney) também foi ultra suspeita.

    O que fica claro é que não houve acaso para facilitar o acesso de Tedros à Jocelyn, é um plano bem bolado. O que ele quer além do dinheiro e fama dela? Veremos. Isso faz um pouco de eco com a crítica de mulheres da produção de que a história passou a ser de um abusador e uma vítima complacente em uma relação tóxica e perigosa.
  • A cena de abertura, como nos dizem no featurette sobre o episódio, é importante para pensarmos em Jocelyn. Em frações de segundos e sob comando ela consegue entregar várias reações que vão do riso às lágrimas, é uma atriz nata, o que os outros ainda não perceberam. Eles vêem suas alterações como prova de seu desequilíbrio mental e não sua decisão de fazer o que quer, como quer e quando quer. Em outras palavras, Jocelyn pode não ser tão vítima como estamos vendo. (Nada mais machista e antiquado do que essa narrativa, mas ok)
  • O que aconteceu com a mãe de Jocelyn? É um assunto que todos evitam aprofundar, mas é o catalizador dos problemas da estrela. Aposto que ainda saberemos mais sobre o assunto.

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