Há 50 anos, quando o coreógrafo John Cranko morreu, repentinamente, aos 45 anos, o mundo da dança perdeu prematuramente um de seus mais talentosos e promissores criadores. Na época diretor do Stuttgart Ballet, Cranko transformou a pequena companhia alemã em um das mais renomadas casas do balé mundial. Como ainda era jovem, tinha um aparente futuro brilhante à sua frente, mas, quando desmaiou em um voo da Filadélfia para Stutgart, tudo acabou.
Apenas dois dias antes daquele 26 de junho de 1973, o Sttutgart Ballet estava em sua terceira turnê americana, tendo apresentado sua versão do Lago dos Cisnes, na Filadélfia. Era a companhia de dança mais comentada do momento e a proposta de todos era a de tirar férias, tanto que sua musa, amiga e estrela, Márcia Haydée já tinha desembarcado no Rio de Janeiro quando recebeu a notícia. A aeronave fretada pela companhia fez uma parada programada em Dublin, onde Cranko que tinha tomado um remédio para dormir e não acordou, foi declarado morto ao chegar a um hospital. A causa da morte foi um ataque cardíaco.

John Cranko nasceu na África do Sul, e, segundo seus biógrafos, sempre quis coreografar, aprendendo a dançar para ter um meio para alcançar seu objetivo. Informal, fumante inveterado (sempre estava com um cigarro nas mãos) ele era idolatrado por seus bailarinos. Ao lado de Kenneth McMillan, Cranko era um coreógrafo que estava modernizando a dança, não ficando preso em recriar clássicos, mas lançando novos balés completos. Para entender o que isso significava, os balés do século 18 e 19 eram sempre “completos” quando traziam uma trama para conduzir a dança. George Balanchine deixou isso de lado quando foi para os Estados Unidos, criando os “balés sinfônicos”, pequenas peças sem grandes cenários ou histórias para conduzir, usando apenas a música para liderar os passos. John Cranko não se ateve a essa “modernidade”, ele montou novos balés como A Megera Domada e Oneguin, para citar apenas duas de suas contribuições.
“Como coreógrafo, o Sr. Cranko assumiu o risco de reviver o balé de uma noite inteira em uma época em que a maioria do público favorecia o trabalho sem enredo de um ato. Foi uma aposta que ele ganhou”, escreveu a crítica do NY Times, Anna Kisselgoff, que assinou seu obituário e citou uma entrevista com o artista, feita em 1969, no qual ele explicou: “Não vejo por que o balé não deveria ser entretenimento, mas deveria ser mais do que entretenimento. Existe o desafio de fazer um balé funcionar em dois níveis – como dança e como história.”
E foi como um grande contador de histórias que ele sempre foi lembrado. Tendo estudado no Royal Ballet e trabalhado com o Sadler’s Wells Theatre Ballet desde que saiu da África do Sul, tendo que ganhar espaçoem uma companhia que tinha lendas como Frederick Ashton ainda em atividade, John Cranko percebeu que teria que buscar oportunidades para crescer em outro lugar, por isso foi um pouco como surpresa que as pessoas lideram com a notícia que tinha aceitado se tornar diretor de balé em Stuttgart, na Ópera Estatal de Wiirttemberg. Ninguém sabia da capacidade da companhia, mas ele sabia que ali teria espaço e demanda criativa, afinal, no Royal, tinha sorte. decriar um balé a cada ano e meio. Em poucos anos, os nomes de Cranko e Sttugart não apenas eram conhecidos mundialmete, mas reverenciados também.


Os anos 1960s foram de glória para ele, que sobreviveu ao duro divórcio de seus pais criando peças teatrais com seus brinquedos, até que, aos 14 anos, descobriu a dança. Teve aulas de balé na Universidade da Cidade do Cabo (onde coreografou suas primeiras peças) e em 1946 entrou para a escola do Royal Ballet, então Sadler’s Wells Ballet, estando entre os fundadores do Sadler’s Wells Theatre Ballet. Criar era sua meta, não se destacou como bailarino e assim que pôde, começou a coreografar.
Ainda no Royal, não teve bons resultados com o seu balé O Príncipe do Pagodas, mas foi quando o remontou para o Stuttgart Ballet que estabeleceu o vínculo que mudaria sua vida. No ano seguinte foi convidado para dirigir a companhia.
Sua versão do balé Romeu e Julieta, feita dois anos antes da popular produção de Kenneth McMillan para o Royal, é considerada por muitos uma das mais criativas do balé, tendo ganhado mais destaque nos últimos anos.

A grande musa de John Cranko, foi, sem dúvida, a bailarina Marcia Haydée, para quem criou suas obras mais icônicas e com quem trabalhou até sua morte. “Um dia antes de fazer a audição para o Stuttgart Ballet, ele estava dando uma aula, que eram muito estranhas, porque fazia coreografias nas aulas, não era uma aula normal. Então, num momento, disse: ‘Façam isto’, e ninguém fez nada e eu levantei a mão e disse: ‘Acho que sei fazer’. E me soltei como uma louca. Depois ele me contou que foi nesse momento que viu que eu o entendia. No dia seguinte, fiz a audição para o corpo de baile, ensaiei uma parte de A Bela Adormecida e após dançar ele subiu ao palco e disse que eu o esperasse no camarim. Ao chegar, disse: ‘Marcia, não vou contratar você como corpo de baile, você ganhou um contrato como primeira bailarina’. Acho que esse momento foi fundamental na minha vida”, ela comentou em uma entrevista há dois anos.
Com a data de 50 anos de sua morte se aproximando, é sempre hora de lembrar a genialidade de John Cranko e agradecer que suas obras contribuam para a imortalidade da dança.
Descubra mais sobre
Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.

2 comentários Adicione o seu