Maestro: Bradley Cooper se transforma em Bernstein

Enquanto esteve vivo, Leonard Bernstein despertava críticos e adoradores com uma paixão similar. Tudo nele parecia exagerado: os cigarros sempre acesos, os gestos exagerados na regência, a força da música e da orquestração. Desde que ‘surgiu’, ainda jovem, ‘gênio’ parecia fazer parte de sua marca.

Se a intensidade no palco era evidente, nos bastidores era de se imaginar. O filme Maestro, dirigido e estrelado por Bradley Cooper, confirma toda e qualquer suspeita. Nada que a gente pudesse sequer ter discutido pois boa parte da discussão em torno da produção girou em vários tópicos, em especial, o nariz prostético do ator. Se você não é da geração que conviveu com ele ainda vivo – ou não faz um google – fica nesse campo. A maquiagem deixou Bradley assustadoramente I-GUAL a Leonard Bernstein. O gestual seria fácil ‘imitar’, mas o ator incorporou os mínimos detalhes inclusive da fala do maestro. O filme, como ele, parece que a música que ele mais apreciava vinha de sua própria voz: fala, fala, fala…

Os bastidores de Maestro são confusos como a vida dele e levaram pelo menos 5 anos para chegarem às telas e à plataforma. Inicialmente batizado como The American, o filme traria Jake Gyllenhaal no papel principal. Porém a produção não conseguiu liberar os direitos musicais e sem música seria virtualmente impossível contar a história desse compositor e regente tão ímpar. Quando Bradley Cooper, que já correia em paralelo com a sua versão, conseguiu a música, Maestro passou a ser o único filme a seguir em frente.

Embora tenha grande força em toda narrativa (eu acho alguns trechos longos), o roteiro passeia pela música e criatividade de Bernstein, mas foca mais na incomum história de amor dele com sua esposa, a atriz chilena Felicia Montealegre, interpretada por uma eternamente brilhante Carey Mulligan. Isso porque o maestro era homossexual, um fato “escondido”para o grande público, mesmo que aberto para o meio artístico e íntimo do casal.

Tanto Carey como Bradley já podem contar seus nomes na seleta lista de indicados ao Oscar 2024, sendo que o ator, para mim, já pode preparar o discurso vencedor. Carey já esbarra com o favoritismo de Emma Stone por Pobres Criaturas (Poor Things). Como diretor não há como Maestro tirar o hype em torno de Greta Gerwick por Barbie, mesmo que eu considere o trabalho de Bradley Cooper superior. Outro prêmio inegável e merecido será de Kazu Hiro, que já ganhou o Oscar por transformar Gary Oldman em Winston Churchill em The Darkest Hour assim como Charlize Theron em Megyn Kelly em Bombshell. Quando Bradley Cooper é Leonard Bernstein aos 70 anos, você jura que ele envelheceu diante dos seus olhos.

Maestro espertamente evita a narrativa da moda, que evita ser não-linear. E agradeço à isso! Começamos com Leonard Bernstein lembrando saudoso de Felicia e voltamos no tempo acompanhando desde o momento que ganhou o estrelato, num ritmo frenético que vai sendo reduzido aos poucos, quando a relação dele com Felicia foi se desfazendo aos poucos. Curiosamente há no início muita gente dizendo a ele o que devemos saber que é o artista inovador que mesclou o clássico e o jazz, que era passional e inquieto. 

Concordo com os outros críticos que há uma indecisão até estética de Bradley Cooper na direção, há momentos propositalmente tecnicamente e visualmente deslumbrante, sem explorar as músicas mais esperadas, clipes alongados de concertos entrecortados por vazios e pausas nos diálogos, que não preenchem o vazio emocional. Se você não conhecia Bernstein antes, continua sem entendê-lo. Nem artisticamente, nem pessoalmente. O que faz de Maestro um filme bom, possivelmente premiado, mas longe de uma unanimidade. Como eu não gostei de nada que vi para o próximo ano, não curti Barbie, e fiquei irritada com Oppenheimer, me preocupa o vazio artístico que estamos vivendo. Há muita necessidade dos diretores de imporem ’assinaturas estéticas’ que ficam muito obvias, atrapalhando o básico de simplesmente nos contarem uma boa história. No caso de Maestro, faltou a genialidade do biografado, por outro lado, aumenta o mistério da lenda.


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