Todo início de ano, na temporada de premiações, alternamos nosso favoritismo para imediata rejeição, em um complexo quadro de torcer pela zebra. Em inglês – o underdog da canção da banda Kasabian, que diz que “só perco para ganhar”. A gente vibrou com Treta (Beef) em 2023, cantando desde lá que a série “fechou o Emmy”, mas quando isso se confirmou, ficamos nos perguntando ‘mas… e The Crown? E The Last of Us?’ E assim por diante. Todo ano é a mesma coisa.


Se pra gente que está em casa quando a noite vira de um grupo só a gente fica entediado, imagine para os famosos que tem que virar coadjuvante da vitória alheia, manter a pose como se não estivesse em uma competição e indo pra casa como perdedor? Meryl Streep, a rainha, chamou a nossa atenção quando brincou que não entendia porque as pessoas a consideravam tão vitoriosa por ser indicada 21 vezes ao Oscar, se ela só ganhou três. Ou seja, sugeriu que na verdade ela seria a maior perdedora de Hollywood. Obviamente, estava brincando.
Mas é um pouco isso: todo ator que entrava na categoria ‘contra’ Meryl’, se sentia com menos chance (Sandra Bullock brincou com isso quando ela ganhou), mas, se efetivamente Meryl vencesse todas as vezes – e todas as indicações foram merecidas -, de 1979 a 2023, praticamente ninguém mais teria vencido. Estaríamos reclamando, sem dúvida.
O que acontece é que equilíbrio, como em tudo na vida, é tênue em premiações. No Oscar não há separação entre gênero de Comédia ou Drama, o que reduz a lista de indicados e cria problemas de comparações. Até hoje, por qual que seja a razão, artistas tendem a menosprezar a arte de fazer rir, considerando comédia mais fácil do que drama quando é infinitamente mais difícil fazer alguém rir do que chorar. Ícones do drama como Robert DeNiro e a própria Meryl, sofreram anos até encontrarem sua persona na comédia, mas, em geral, um Tom Hanks conseguiu fazer o caminho inverso sem a mesma dificuldade. Alguém lembra dele nas comédias rasgadas dos anos 1980s? Mas ninguém esquece dele em atuações como Forrest Gump ou Filadélfia. Mas estou desviando o assunto. Falamos das injustiças do Oscar por juntar todas as atuações em uma mesma categoria, deixando no ar que o prêmio é para o melhor dos melhores. Sim, parte do prestígio da estatueta é justamente a competição mais acirrada. E injusta.

Portanto, quando todas as outras premiações ampliam as categorias, em tese, teríamos mais nomes no palco, porém o que tem se percebido é que só significa repeteco em vez de diversidade. Claro, estamos falando do “Oscar da TV”, o Emmy.
As regras: há muitas categorias, mas as plataformas submetem os gêneros
A festa divide várias categorias: Drama da Comédia, Série de Minissérie e de Filmes, etc. São mais indicados do que Oscar, o que matematicamente aumenta a chance de diferentes vencedores, mas o que temos visto com a maior frequência é que as premiações agora são festas de um grupo só: se ganhar favoritismo, leva “tudo”. Dessa forma, Succession ganhou diretor, série, roteiro, ator, atriz, ator coadjuvante e o que mais pudesse em 2023. Merecido? Sim, mas… e The Last of Us? Na verdade a expectativa é que os prêmios virão na segunda temporada, especialmente para Pedro Pascal, que é desde já uma aposta mais concreta e, embora não tenha sido televisionado, Nick Offerman e Storm Reid ganharam como Atores Convidados em Drama Series.
Tenho amigos que reclamaram mais de Treta ter ganhado de Daisy Jones e os Seis e até de Dahmer, mas a problemática para mim é ter O Urso concorrendo como comédia. Honestamente, nos poucos momentos leves até rimos, mas não há comédia na depressão e angústia do nosso Chef. Acho ofensivo que Only Murders in the Building, ou Ted Lasso, ou Wandinha (Wednesday) ou mesmo A Maravilhosa Sra. Maisel, que eram cômicas com momentos mais profundos, tenham perdido para O Urso. Era óbvio que o drama deixou tudo mais poderoso! E vou além: se tivessem Jeremy Allen White contra Kieran Culkin, jamais Succession teria levado o Prêmio de Melhor Ator. Teria até risco de concorrência maior em outras categorias também (embora ainda ache que foi merecidamente o ano de Succession). A piada do Drama ser premiado como Comédia está na Academia, mas não tira risadas nossas ou dos comediantes posso apostar!


Os prêmios não gravados dariam uma cara mais equilibrada à festa do Emmy Awards
Na transmissão da festa na HBO Max, a comentarista justifica o óbvio questionamento como se as regras do Emmy medissem o gênero por tempo. Como em geral, na TV aberta, comédia tinha apenas 30 minutos e drama em geral tinha 45, automaticamente O Urso (cujos episódios são curtos), entraria como Comédia. Fiz questão de ler as 82 páginas do regulamento e não encontrei essa informação. Há a categoria de Short Comedy, mas ela é a Série Curta de Comédia, Drama ou Variedades, que efetivamente, tem duração média de episódios entre dois a 20 minutos. Nas regras, Drama ou Comédia “têm limite máximo de 11 participantes” mas “os produtores elegíveis ao Emmy determinam a elegibilidade final”. Só precisam ter “um mínimo de seis episódios, exibidos dentro do ano de elegibilidade para se qualificarem como uma série.” Em outras palavras, a plataforma é que diz o gênero e os membros da Academia aceitam ou não. Pois é.
Aí voltamos ao efeito do ovo ou da galinha: como mudar sem ser injusto? Talvez o que tenha ido ao ar, dentro das 3h usuais e eliminando muitas outras categorias premiadas tivessem tirado a impressão de que estávamos de penetra na festa de três anfitriões. Certamente sem saber quem ganhou de Figurino, Maquiagem, Ator e Atriz convidados ficamos sem entender que The Last of Us teve prêmios, que House of the Dragon e The Great também. Talvez uma homenagem mais séria aos astros de shows históricos não demandasse os teatrinhos sem graça para quem não os reconhecia economizassem mais tempo. Talvez o fato de que os prêmios do 75º Emmy Awards fossem referentes à 2022 e já esquecemos que o tempo passou e que do ano passado ainda teremos que confirmar os indicados e vencedores (sim, teremos outra cerimônia do Emmy Awards em 6 meses, já falo sobre isso) e isso nos confundiu ainda mais. Muitas dúvidas!


Como fica o 76º Emmy Awards?
O fato é que se colocarmos em perspectiva, o Melhor Drama de 2022 foi mesmo Succession e a Melhor Comédia talvez tenha sido Abbot Elementary (certamente O Urso e Abbot Elementary deixam claro qual dos dois não poderia estar sendo chamado de comédia), mas para saber os ‘melhores de 2023’ teremos que esperar até julho. A festa exibida em 15 de janeiro de 2024 era para ter ido ao ar em setembro de 2023. As greves de Hollywood interferiram e atrasaram a festa, e para nos confundir ainda mais, a de 2023, que deveria acontecer em setembro de 2024, será antecipada! Uma confusão de calendários sem fim!
Repetindo: em algumas semanas saberemos os indicados ao Emmy Awards 2024, que leva em consideração o que foi exibido entre junho de 2023 até janeiro de 2024. Na categoria Drama, como não há sucessor para Succession, eu pessoalmente aposto na vez de The Morning Show. Billy Crudup vem como favorito como Ator Coadjuvante (embora tenha sido protagonista), a nossa querida Greta Lee virá com força como coadjuvante e a série deve ganhar de Melhor Drama. Não terá ano mais fácil para isso, uma vez que The Crown perdeu a força pelo cansaço do drama real da Família Real nos últimos anos.


Entre as atrizes da série da Netflix, Elizabeth Debicki tem chance ainda ganha como Princesa Diana em uma segunda indicação pelo papel e Leslie Manville certamente será indicada como Princesa Margaret. Na parte de comédia, Only Murders in the Building vai finalmente ser considerada por sua melhor temporada – a que tem Meryl Streep como estrela – mas sem chances de ganhar justamente porque tem a popularidade de O Urso pela frente.
Saber da realidade de como a premiação se organiza meio que orienta como a gente palpita nos eternos bolões de “quem vai ganhar”, que nem sempre é “quem merece ganhar”. Volto a cantarolar Underdog de Kasabian (o povo adora um lutador, adora ver um vencedor cair (…) Estou sempre perdendo para ganhar) porque ter a unanimidade que O Urso tem no momento pode ferir sua torcida e nós queremos um ambiente saudável com muitas vitórias e artistas agradecendo, não os mesmos. Sobre o próximo Emmy Awards? Vou atualizar meus palpites mais à frente, claro, mesmo minha esperança de algo mais justo é mínima. E a sua?
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