O ‘new look’ e sua relevância 77 anos depois

Como filmes e séries andam em ondas, estamos começando a marola fashion, uma oportunidade para abordar pautas femininas e históricas via Moda. A biosérie espanhola Cristobál antecipa a grande produção da Apple TV Plus, New Look, que traz grande elenco e aborda outro grande designer do período pós-guerra, Christian Dior.

As duas séries, distintas em narrativa e produção refletem bem suas personagens: o misterioso Cristobál Balenciaga, cuja aura de genialidade também é calcada em sua insistência em ser tão exclusivo que evitava cair no popular tem na série da Starplus essa mesma ‘distância’. Já Dior, que era o querido da mídia e midiático, traz holofotes para The New Look, com Ben Mendelsohn, Juliette Binoche e John Malkovich no elenco. Um dos grandes lançamentos de 2024, sem dúvida.

O ‘novo visual’, tradução do ‘the new look’, foi o nome que a coleção de Christian Dior lançada em fevereiro de 1947 ficou conhecida. O designer, na verdade, a batizou como La Corolle, uma alusão às pétalas das flores, um desenho que ele usou para criar o modelo de cintura fina e saia arredondada. Era uma mudança radical na moda e a editora da Harper’s Bazaar, Carmel Snow, colocou na capa da revista chamando de “the new fashion”. (Na série da Starplus, há uma alusão de que Balenciaga teria feito algo na mesma linha ANTES de Dior, provocando a mesma reação na jornalista, mas, como ele era defensor ferrenho da exclusividade, não causou o mesmo impacto de comunicação, ‘perdendo’ a novidade para Dior). 

A revolução pós-Guerra

“É uma grande revolução, querido Christian! Seus vestidos estão com um visual tão novo!”, ela teria dito ao final do desfile na Maison Dior. Um repórter da Reuters teria escutado a declaração e a citado em sua matéria, criando o termo que passou a ser usado para todos os vestidos assinados por Dior e/ou que tivessem a mesma silhueta de cintura muito fina e saia muito cheia, ou o visual ampulheta.

A revolução – que alguns como Balenciaga detestavam – era justamente marcar um modelo de ombros largos e cintura ultra fina para destacar ainda mais a feminilidade que estava esquecida durante a Segunda Guerra-Mundial, onde as curvas jamais eram acentuadas. O designer espanhol era “contra” afinar a cintura porque considerava que isso tirava o conforto e criava uma meta física impossível para grande parte das mulheres. Mas há mais nisso também.

Historiadores apontam que o racionamento da guerra implicou também em menos tecidos, portanto a Moda não tinha como ‘crescer’, os modelos menos marcados e retos refletiam esse cenário. Com a Paz, viria a abundância e Dior saiu na frente com vestidos cheios, elegantes e dignos de sonho. Era original e glamouroso como nada visto antes.

Já na época os críticos consideraram ”new look” algo anti-feminista pois sua inspiração eram os modelos do século 18 e 19, onde espartilhos destruíam a saúde de muitas por ser irrealmente apertados afim de criar uma imagem quase não-humana, algo que tinha ficado para trás. Mesmo que literalmente os espartilhos tenham sido esquecidos, havia a ‘cinta’, até hoje usada para ‘apertar’ corpos ‘menos magros’.

Seja como for, com a aprovação em massa do ‘new look’, alimentado pelas estrelas de cinema como Grace Kelly, todos os designers ‘tiveram’ que seguir a tendência, incluindo Balenciaga e Givenchy. E as lojas de departamento passaram a adotar os modelos e consolidar o efeito de consumo de massa. O estilo ficou em alta por nada menos do que 15 anos.

A reação Chanel: a invenção do Tailleur

A série The New Look vai se concentrar na ira de Coco Chanel diante da revolução criada por Christian Dior. Segundo consta, ela teria definido a La Corolle como “roupas de um homem que não conhece mulher, nunca teve e sonha ser uma!”.

Quem ganhou? O glamour, sem dúvida, uma vez que tanto o ‘new look’ como o tailleur (que não obrigava a cintura ser fina) passaram a ser os ‘uniformes’ das décadas de 1950s e 1960s.

A rivalidade não poderia ter sido mais pessoal. Toda linha Chanel era famosamente calcada no prínçipio de “conforto feminino” para mulheres independentes que ainda queriam manter a elegância. Todo volume que estava de volta era exatamente o que ela tinha eliminado em suas coleções. A resposta veio em estilo: Chanel criou sua assinatura mais famosa, o “terno” de saia e cardigan mais conhecido como ‘tailleur’.

Foi dessa rivalidade, dessa discussão que Moda passou a ser Pop, isso quer dizer que qualquer um com acesso à informação e em qualquer parte do mundo passou a dizer os nomes de Dior, Chanel, Givenchy e Balenciaga mesmo sem ter acesso aos exclusivos desfiles, ainda feitos apenas em suas Maisons em Paris. A capital francesa assumiu a posição de ‘coração da moda’ por reunir os principais designers, quase todos ‘vizinhos’ na Avenue Montaigne.

Diante disso tudo, a série da Apple TV Plus será mega interessante para quem gosta de História. Atualmente a popularidade de Coco Chanel está infinitamente manchada por sua vida pessoal, seu envolvimento com nazistas e nobres (tudo que certamente será explorado na série). Vai ser incrível.


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