A amizade de Anne Louise de Brillon de Jouy e Benjamin Franklin

Se você for leitor assíduo de MiscelAna sabe que aqui há uma paixão por séries históricas, onde discuto e destaco fatos reais retratados em séries de época. (Se ainda não é, fica o aviso). Com isso, volto a elogiar mais um grande desempenho de Ludvigne Sagnier em mais uma atuação de uma mulher de importância na História, no caso da Independência Americana, e que não era tão conhecida pelo grande público: a compositora francesa Anne Louise Brillon de Jouy.

Depois de brilhar em uma grande temporada da série A Rainha Serpente, e uma ponta (se piscar perde) em Napoleão, Ludvigne é o interesse romântico de Benjamin Franklin na série da Apple Plus, Franklin e já roubou a cena.

Franklin é um veículo para o ator Michael Douglas, que vive o personagem título, e é uma adaptação do romance vencedor do Pullitzer, Uma Grande Improvisação: Franklin, França e o Nascimento da América, escrito por Stacy Schiff. Em apenas oito episódios, a série narra a missão do inventor Benjamin Franklin em uma viagem de extrema importância à França, onde planejou e conspirou para promover uma aliança franco-americana e vencer a guerra da independência americana. Entre a busca de apoiadores, ele conheceu Anne Louise de Brillon, e logo uma conexão nasce entre eles.

Sobre a verdadeira Madame de Brillon de Jouy

Em um contraste direto com a viva e decidida Diante de Poitiers, de A Rainha Serpente, em Franklyn Ludivine traz uma tristeza e frustrações palpáveis para a doce Anne Louise, que nasceu em há 280 anos, em 1744, em Paris, sendo casada aos 15 anos com Jacques Brillon de Jouy, 22 anos mais velho que ela.

Submissa e bem-educada como todas as mulheres de seu tempo, ela manteve em sua casa a atmosfera que conheceu quando criança, com música, pintura e literatura desempenhando papeis fundamentais no lar dos Brillons.

Mãe de duas meninas, como mostra a série, Anne Louise vivia em Passy e tinha uma relação conflituosa com o marido que era mulherengo e a humilhava abertamente com as amantes. Ter que conviver com essa relação causou uma depressão cada vez mais profunda na compositora, que encontrava na paixão pela música algo para ajudar a lidar com sua infelicidade.

Toda quarta e sábado, Anne Louise recebia convidados em sua casa e por ali circulavam artistas, incluindo músicos estrangeiros que se apresentaram com ela. Aos poucos as soirées foram ganhando fama e prestígio, sendo que ela mesma foi ficando famosa como música e compositora. Por ser mulher, seu trabalho não era tocado publicamente ou foi publicado, mas vários compositores dedicaram sonatas a ela, incluindo Johann Schobert, Luigi Boccherini, Charles Burney, Ernst Eichner e Henri-Joseph Rigel.

Como vimos em Franklin, muitas de sua música era de câmara instrumental, sendo que muitas eram compostas para tocar e cantar com suas filhas. Das quase 90 composições de seu crédito, se destacam as escritas para piano, onde é possível identificá-la como virtuose e com inovações que só foram vistas anos depois com pianistas como Czerny e Liszt.

O nome de Anne Louise ficou obviamente mais conhecido graças à sua amizade com Benjamin Franklin, que conheceu em 1777, como embaixador das colônias americanas. Ele era vizinho dos de Brillon, e o encanto imediato foi mútuo.

Os dois passaram a se encontrar diariamente, para explorarem música, tomarem chá e jogar xadrez. A proximidade dos dois, que durou pela vida de ambos a partir daí, era tão significativa que ela compôs uma sonata para celebrar uma vitória americana na sua luta pela independência.

A amizade com Franklin

Benjamin Franklin era 38 anos mais velho que Anne Louise, e já era conhecido como cientista, inventor e diplomata, sendo que a série da Apple TV Plus foca justamente no lado menos explorado da biografia dele, que é seu envolvimento (crucial) na política americana, mostrando as dificuldades para encontrar aliados, as traições e críticas na França.

A ligação dele com as mulheres, segundo seus biógrafos, o ajudou a circular com maior facilidade pela Corte francesa, sendo que Franklin também usou de sua reputação e popularidade para obter apoio do público, enquanto assegurava a ajuda secreta do governo francês. Porém, com frequência, consideraram essas relações um tanto amorais e escandalosas, como se ele tivesse meio que perdido o foco de sua missão. Como o ex-presidente descreveu mais tarde, “o amigo mais puro e útil que um homem poderia adquirir, era uma francesa de uma certa idade que não tinha projetos em sua pessoa. Elas estão tão prontas para o seu serviço e, pelo conhecimento delas do mundo, sabem bem como servir com sabedoria”, comentou.

A principal das amigas de Benjamin Franklin claramente foi Anne-Louise Brillon de Jouy. Durante os quatro anos que ficou em Paris, ele frequentou a casa dela quase todas as quartas e sábados, onde jantava com ela e o marido dela, assim como suas filhas. Nas cartas trocadas entre eles, se confirma o fato de que houve flerte entre eles e até intenso, quando Franklin tentou fazer do relacionamento algo mais do que uma amizade, admitindo que “cobiçava a esposa de seu vizinho” e sugerindo que “a maneira mais eficaz de se livrar de uma certa tentação” é “satisfazê-la”. Anne Louise habilidosamente se esquivou, pois como os biógrafos relatam, ela o tinha como uma figura paterna e alegou que “mulheres e homens não podiam lidar com a tentação da mesma maneira”.

Ainda assim, a fofoca rolava solta em Paris, tanto que Anne Louise escreve para ele que “certas críticas haviam sido proferidas por pessoas que encontro na sociedade sobre o tipo de familiaridade que reina entre nós”, mas que, mesmo “em paz” com sua consciência, “não é suficiente: é preciso submeter -se ao que é chamado de propriedade (a palavra varia a cada século, em todas as terras!). Embora eu não possa me sentar no joelho com tanta frequência, certamente não será porque eu te amo menos; Nossos corações não serão mais nem menos puros, mas teremos fechado as bocas de falantes malignos, e isso não é pouca coisa, mesmo para um sábio”, explicou.

Franklin vai mostrar que Anne Louise ajudou ao americano a atrapalhar os planos do embaixador britânico, Lord Stormont, de derrotar o movimento de independência impedindo a ajuda do governo francês aos rebeldes. Foi ela que ligou “seu gentil pai” com as pessoas mais influentes da sociedade, com chás, almoços e exposições, ocasiões que permitiram a Franklin a promover a causa dos americanos.

Na França, revolucionários ameaçaram a vida de Anne Louise

Depois que a França reconheceu formalmente os Estados Unidos como uma nação, a amizade e influência de Anne Louise com Franklin seguiu dando prestígio à ela, com a compositora intercedendo com pedidos tanto dele como dela em diferentes aspectos, desde favores para amigos em comum ou sendo intermediária de alguma questão.

Enquanto apoiar o fim da monarquia na América foi de interesse para Anne Louise, quando chegou o fim do regime na França ela passou por maus momentos, como muitos nobres e ricos franceses. A Revolução Francesa pôs fim às recepções dos Brillons e, precisava sobreviver, resgatar seus móveis, apoiar sua família e lidar com a turbulência depois de perder vários de seus netos, Anne Louise viveu dias muito difíceis. Ela dividiu seu tempo entre Paris e o Château de seu cunhado em Villers, na Normandia, mantendo a música com um lugar especial em sua vida até o fim.

Foi em Villers que ela faleceu há 200 anos, em 1824, com uma trajetória incrível na História mundial. Anne tinha 80 anos. Ela viveu 34 anos a mais que Benjamin Franklin, que voltou para os Estados Unidos e faleceu em 1790, em sua casa na Filadélfia, de um ataque pleurítico aos 84 anos. Dar relevância à amizade dele com Anne Louise é, sem dúvida, uma bela homenagem à uma de suas principais apoiadores e um dos destaques de Franklin

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