O silêncio que Amy merecia

A expectativa sobre a biopic sobre a Amy Winehouse colocou a diretora Sam Taylor-Johnson em uma armadilha anunciada. Ela tinha a seu favor o ótimo filme Nowehere Boy, de 2009, uma biografia da juventude de John Lennon, interpretado por Aaron Taylor-Johnson, que foi interessante e nem tão “protetora” do legado do artista. No entanto, estávamos certos quando a notícia foi que a família da cantora “aprovou” e “adorou” o que Sam estava preparando. Nunca uma biografia pode ser 100% de agrado de um lado, especialmente uma artista controversa como Amy. Resultado: o filme tem sido massacrado pela crítica mundial.

Autenticidade e transparência são dois atributos que sempre mereceram prioridade, mas como equilibrar isso com o inegável “controle da narrativa”? Um dos exemplos mais citados é Bohemian Rhapsody, que fez mega sucesso, ganhou Oscar e apenas tardiamente despertou críticas quanto a alterar inclusive datas na história, amenizando pontos que poderiam chatear a família de Freddie Mercury e assim ter uma versão controlada de como queriam que lembrássemos dele. Mais recentemente o controle chegou a tal ponto que Madonna escreveu o roteiro e ia dirigir o filme sobre ela mesma, com o arquivado Live to Tell.

No meio disso tudo, Rocketman foi um dos mais abertos sobre Elton John, sem meias voltas sobre seu uso de drogas ou inseguranças ao longo do caminho. Nem Elvis ou Priscila agradaram a todos, sempre pendendo para a simplificação que poupa o protagonista de ser julgado. Back to Black, infelizmente, parece que é um dos piores exemplos desse tipo de versão controlada.

Já tínhamos visto isso quando tentaram filmar a vida de Whitney Houston: todos os filmes patinam quando precisam endereçar o uso de drogas e o affair homoafetivo que ela fez de tudo para esconder a vida toda. Em Back to Black, Amy é mostrada com o oposto de suas letras tão honestas, cheias de palavrão e referências pessoais. É transformada em uma alma destruída pela fama e exposição que em parte foi uma parcela dolorosa de sua vida, mas nem de longe a principal. Quem viu o maravilhoso documentário Amy, de 2015, tem melhor noção de tudo do que o filme. Aliás, recomendo.

O fracasso de Back to Black coloca em cheque imediatamente a biopic de Michael Jackson, Michael, também aprovada pela família do cantor. Embora o diretor Antoine Fuqua garanta que nada vá ficar de fora, é muito improvável que as acusações de pedofilia sejam “esclarecidas”. E o sobrinho do cantor, Jaafar Jackson, que está igual ao tio, não será exposto, tenho certeza.

Sabe o que é mais justo? O que a família de Janis Joplin faz. Eles não permitem que tentem recontar a história dela, barram as tentativas. A Rosa, de 1976, com Bette Midler não se encaixa em biopic por isso. Sim, é descaradamente “inspirado” em Janis, mas não é ela. Apenas o documentário Amor, Janis (outro imperdível) é foi aprovado. Nele falam de muitos dos problemas de Janis com bebidas e drogas, mas transformam um romance inacabado em uma grande história de amor. Verdade? Não sabemos, mas é linda.

Melhor seria ter prestado atenção na dor de Amy Winehouse, que detestava o lado da fama no qual tinha que conversar com jornalistas, ser fotografada ou exposta. Sua felicidade estava na música apenas. Pena que ainda queiram forçá-la a cantar. Parte meu coração.


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