Anéis do Poder: A Humanização de Sauron e sua Complexidade na Saga

Gostaria tanto acreditar que a produção de Anéis do Poder foram geniais ao colocar um ator carismático no papel de Sauron, mas a verdade é que eles erraram na narrativa de Galadriel – e até a atriz – transformando no antagonista declarado da saga em nosso personagem favorito. Sim, eu torço por Sauron! Entendem como a incompetência de roteiristas deram um nó na minha cabeça?

Não é de hoje que reclamo de Morfydd Clark como Galadriel e depois de uma temporada de prepotência e enganos, ela não apenas deixou que Sauron (Charles Vickers) vivesse, mas deu a ele a chance de avançar no seu maligno plano de domínio total, só dispensando ficar ao lado dele como consorte depois de muita hesitação, devo acrescentar.

Em Game of Thrones e agora em House of the Dragon, a história nos faz ter empatia por antagonistas embora não necessariamente passemos a “gostar” deles. Sim, tínhamos os psicopatas Ramsay Bolton ou Joffrey Baratheon, Cersei Lannister era nojenta, assim como Alicent Hightower e sua cria nos alucinam, mas o que sabemos de suas motivações e falhas os tornam mais interessantes, não os tornam populares ou justificados. Em Anéis do Poder, Sauron não apenas adotou uma imagem de um homem interessante, sua inimiga é tão terrena para uma elfa que ELA parece estar errada o tempo todo e ele? Bem, um homem complexo.

Aliás, Sauron não é um homem. Como figura central na mitologia criada por J.R.R. Tolkien, ele era originalmente um Maia, um tipo de ser espiritual criado por Eru Ilúvatar, o deus supremo no universo de Tolkien. Ele serviu a Aulë, um dos Valar, antes de ser corrompido por Melkor (ou Morgoth), o primeiro Senhor do Escuro, que veio a ser o mais poderoso dos Valar. No livro Silmarillion, que serve como base para a série, Morgoth era o principal antagonista e responsável por grande parte do mal que assolou Arda, a terra onde se passam as histórias de Tolkien.

Antes de mudar de lado, quando ainda era tido como “admirável”, Sauron serviu Aulë, o ferreiro dos Valar, adquirindo o conhecimento vital para seu plano futuro. Ele se aliou a Morgoth porque odiava desordem e o poder do vilão era algo que considerou irresistível. Agiu primeiro como espião, depois traidor até abertamente se alinhar ao inimigo dos Valar, já demonstrando seu maior talento: o de manipulação. Já como tenente, tem um papel significativo nas batalhas e na criação dos Orcs, mas quando Morgoth é capturado e exilado, Sauron escapa.

Tudo isso é explicado e citado na série, mas não vimos o conflito da Primeira Era, só sabemos que Morgoth foi derrotado pelas forças combinadas dos Valar, elfos e homens e lançado no Vazio, uma espécie de exílio fora do mundo de Arda.



Com a ausência de Morgoth, um vácuo de poder foi criado e Sauron, que é um ser espiritual de menor poder do que os Valar, aproveitou a oportunidade para se estabelecer como o novo senhor do mal em Arda. Na 1ª temporada isso é citado e é o motor da vingança pessoal de Galadriel pois seu irmão teria sido morto por Sauron. Na 2ª temporada, vemos o momento no qual Sauron (na pele de Jack Lowden) tenta se impôr no lugar de Morgoth, mas é traído e presumivelmente “morto”. Só que vemos que como uma espécie de Venom e Voldemort, ele muda de forma conforme a necessidade e leva um tempo até assumir uma imagem humana, com o australiano Charlie Vickers se destacando como sua cara.

O plano de Sauron é claro e até simples: quer seguir o que Morgoth começou e dominar o mundo. Sem o mesmo nível de poder que Morgoth, ele compensa essa “falha” sendo extremamente astuto e manipulador. Uma das suas atitudes mais certeiras é de jamais mentir, mas deixar que os outros preencham o que não diz com o que querem ouvir. Ele sabe mapear seus oponentes com facilidade e agilidade e sabemos que será vitorioso por um tempo, conseguindo enganar muitos povos e consolidar seu domínio sobre a Terra Média. Seu reinado de terror culmina na criação de Mordor como seu principal reduto. Tudo isso é o que podemos esperar de Anéis do Poder.

Especialistas comentam que Tolkien era contrário à ideia de um mal absoluto, mas que sim, Sauron seria o que se aproximaria mais do que chamou de “uma vontade totalmente maligna”. Meio como um Drácula, do livro de 1897 de Bram Stoker, e mais ainda como a lenda de Balor do Olho Maligno, personagem da mitologia irlandesa, Sauron não teve um rosto na trilogia de Peter Jackson (o que os mais apaixonados não gostaram), sendo mais um espírito e influência maligna do que um ser físico, por isso o espaço da série da Amazon Prime Video para explorar sua aparência como quisesse.

Porém a popularidade de Sauron soa hoje mais como um acidente do que algo planejado, como venho dizendo. Estamos acompanhando como ele está seguindo seu plano de ter anéis de poder presenteados aos líderes de cada espécie e como já quer forjar o Anel Único para dominar a todos. É onde estamos em Anéis do Poder, com Sauron agora usando um look élfico e dourado, assumindo a aparência de Annatar, o “Senhor dos Presentes”. É assim que está enganando o ferreiro Celebrimbor, ajudando a forjar os Anéis do Poder.

Em uma história mais do que conhecida spoilers são inevitáveis. Sabemos que Sauron vai fazer o Anel que domina os outros em Mordor, e que isso levará o mundo a entrar em Guerra contra ele. Sauron vai matar Celebrimbor e tomar os Sete e os Nove Anéis do Poder, mas os três que estão com os Elfos Gil-galad, Círdan e Galadriel, ficam longe de seu domínio.


Embora nos livros Galadriel, seja perspicaz e desconfiada, nunca confiando completamente em Annatar, alertando aos outros elfos sobre ele, na série ela chega a ser manipulada por ele e tem uma ligação quase romântica com o vilão. No momento, como uma de suas principais oponentes, ela está empenhada em usar seu poder e influência para resistir às forças de Sauron e proteger seu reino, Lothlórien. O anel dela, Nenya, conhecido como o Anel da Água, vai ajudar a preservar e proteger Lothlórien dos males de Sauron.

Mas é a a batalha de Númenor que promete ser um ponto alto da temporada, assim como o controle de Sauron em Mordor, completando a Torre Negra de Barad-dûr. Com os Sete e os Nove Anéis, Sauron vai escravizar os Homens os transformando Nazgûl, e fazendo dos Orcs e Trolls seus servos, junto com os Orientais e homens de Harad. Além dos Elfos, os Anões não se curvarão à sua vontade.

Os conflitos da Segunda Era serão violentos. Elfos e Homens formarão uma aliança, liderados por Gil-galad e Elendil, que foi citado como prólogo da trilogia de Peter Jackson, mas é o coração de Anéis do Poder. Sabemos que eventualmente Elendil é derrubado por Sauron e que Isildur e que antes disso, Sauron perderá sua habilidade de ter uma bela aparência física, mas, até lá, estamos tortuosamente inclinados a gostar mais dele do que dos mocinhos. Falta aqui a figura do herói perfeito – Aragorn (Viggo Mortensen) – que, embora da linhagem de Elendil e Isildur, tinha um caráter incorruptível e muito empático. E sim, reparamos que Charlie tem a aparência de Viggo e isso deliberadamente nos confundiu na 1ª temporada, quando ele ainda aceitava ser chamado de Hallbrand.

Estamos ainda com apenas três dos oito episódios da temporada liberados, mas Charlie Vickers me parece estar assegurado de sobreviver o caos que é essa produção. Anunciada por anos como o maior investimento criativo da plataforma, errou feio na estreia e está com dificuldades de se recuperar. Anéis do Poder precisa de Sauron e ele, cruelmente, já nos domina. Seria culpa de Tolkien?


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