Qualquer caso de assassinato, de desaparecimento ou sequestro sempre impacta o mundo pois nos lembra da vulnerabilidade da vida, da incerteza de segurança e outros gatilhos. Só piora se envolve crianças. Há dois casos recentes que ainda nos emocionam: o desaparecimento de Madeleine McCann, em 2007, e, apenas onze anos antes dela, o assassinato de JonBenét Ramsey.
Madeleine, que tinha apenas quatro anos quando foi vista pela última vez em Portugal, ainda está desaparecida, mas, JonBenét, com apenas seis anos, foi assassinada dentro de casa, no Natal de 1996. Até hoje, em 2024, ninguém foi preso, nenhum suspeito foi acusado e o caso gera muita polêmica. Na cola dos documentários-releases que geram discussão, a Netflix disponibilizou hoje o documentário Quem Matou JonBenét Ramsey?, com toda intenção de ter a última palavra que, sem dúvida, é um dos maiores mistérios do século 20.

O sequestro e assassinato: questão de horas
JonBenét Ramsey era uma menina de seis anos, conhecida por participar de concursos de beleza infantil. Ela morava com seus pais, John e Patsy Ramsey, e seu irmão mais velho, Burke, em Boulder, Colorado. Na manhã de 26 de dezembro de 1996, Patsy afirmou ter encontrado uma carta de resgate manuscrita em três páginas em sua escada, alegando que JonBenét havia sido sequestrada e pedindo um valor exato de 118 mil dólares — curiosamente, o mesmo valor do bônus recebido por John naquele ano. Patsy ligou para a polícia imediatamente, mas, após várias buscas, o corpo de JonBenét foi encontrado cerca de oito horas depois no porão da casa.
Ela estava com as mãos amarradas, uma corda no pescoço e havia sinais de agressão física, incluindo um traumatismo craniano. O método usado para estrangulamento foi um garrote improvisado, o que levantou suspeitas sobre premeditação.
A investigação foi marcada por controvérsias e erros, incluindo a contaminação da cena do crime, principalmente porque a casa foi invadida por amigos e familiares, contaminando possíveis provas. Além disso, foi John que achou o corpo, depois que uma detetive sugeriu que ele voltasse a olhar a casa para ver se haveria algo estranho. Ao ver a filha, ele se jogou sobre ela, desfez a cena e levou o corpo consigo para outro andar, destruindo a cena do crime e atrapalhando qualquer possibilidade de buscas no local.
A opinião pública contra os Ramsey
Por conta das inúmeras imagens de JonBenét nos campeonatos ou videos caseiros, o público – estimulado pela mídia – imediatamente se voltou contra os Ramseys. A tradição de que os suspeitos iniciais sempre sejam os mais próximos da vítima eliminou para a polícia, ou quem cobria o caso, qualquer argumento da família de que um estranho entrou na casa, levou a menina para o porão, abusou sexualmente dela e a matou enquanto todos dormiam.
Pode ser surpresa para os milenials, mas essa coisa de “detetive” sempre moveu pessoas interessadas em true crime, mesmo há 28 anos. Desde então, foram vários documentários, livros e matérias discutindo quem matou JonBenét Ramsey, sem chegar perto da verdade.

Contra os Ramsey há várias perguntas básicas sem respostas, a principal delas sendo a carta de resgate. A polícia considerou a carta longa e detalhada como possivelmente fabricada. Especialistas apontaram que parecia um desvio de atenção, mas nunca foi provado quem a escreveu embora testes tenham mostrado que a letra e o vocabulário eram muito parecidos com o de Patsy, e sim, o valor do resgate sugere que era alguém que tinha acesso a informações bancárias dos Ramsey.
Não apenas John e Patsy foram tratados como suspeitos, com especulações de que a nota teria sido uma tentativa de encobrir um acidente ou outro ato da família, mas a grande maioria acredita que o assassino teria sido Burke, que tinha apenas nove anos na época. Segundo o depoimento oficial, ele dormiu direto mesmo quando a polícia entrou na casa pela primeira vez e Patsy chorava com alto volume.
O que a família insiste
Desde a época, os Ramseys insistem na tese de que foi um intruso. E há evidências que sugerem a presença de alguém de fora, como marcas de pegadas na neve e uma janela parcialmente quebrada. No entanto, isso nunca foi confirmado. Em 2008, análises de DNA excluíram os Ramsey como suspeitos diretos, mas o caso continuou sem resolução.
O documentário da Netflix é todo montado para que hoje nós concordemos com a versão da família. Dirigido pelo diretor indicado ao Oscar, Joe Berlinger, Quem Matou JonBenét Ramsey coloca o foco no tratamento incorreto do caso pela polícia e pela mídia, ressaltando as falhas dos dois lados, sem chegar perto do problema principal “contra” os Ramseys que é a carta de resgate. Mas é fato, jamais conseguiram levantar sequer algo além de circunstancial contra a família. Quase trinta anos depois, ninguém, incluindo John e Patsy Ramsey, foi acusado do assassinato de JonBenét.

Berlinger acredita na inocência de John e Patsy Ramsey e é com esse objetivo que o documentário quer que essa seja a nossa impressão também. E vai além: ele acha que é possível encontrar o culpado, basta eliminar a presunção que os pais ou o irmão são os culpados.
Patsy Ramsey morreu de câncer em 2009, com apenas 49 anos. Segundo o detetive Lou Smit, que enquanto vivo foi o principal apoiador da teoria do intruso, as últimas palavras de Patsy Ramsey para ele foram “Lou, não tenho muito tempo de vida. Por favor, pegue esse cara antes que eu morra”. Hoje, as herdeiras de Smit estão do lado dos Ramsey para limpar a sombra de suspeita sobre eles.
O TV Movie a caminho
Uma das preocupações de Joe Berlinger de dar essa versão a favor da família é que a Paramount+ está preparando uma série sobre o caso, na linha dos sucessos que a Netflix tem exibido com assinatura de Ryan Murphy. Nada novo, são tantas iguais hoje em dia, mas ainda assim, pare ele, é importante ter uma versão pró família.
“Estou profundamente preocupado com essa produção perpetuando ideias falsas. Não sei o [caminho] que eles estão tomando, mas foi um tanto chocante para mim ouvir de John Ramsey que essa produção não o contatou”, ele disse à Variety. “Não quero criticar outros cineastas, mas Ryan Murphy também não tinha interesse em falar com os irmãos Menendez [para ‘Monstros: A História de Lyle e Erik Menendez’], pelo que li. Se você vai assumir a vida de alguém e não falar com essa pessoa, como ela sabe as nuances de tantas situações?”, questionou.
A série JonBenét Ramsey tem Melissa McCarthy e Clive Owen nos papéis principais e explora o trágico assassinato não resolvido e “segue a família Ramsey, antes e depois da tragédia, enquanto eles passam pela dolorosa perda de uma criança enquanto enfrentam intenso escrutínio público causado por um frenesi da mídia que fez com que esse caso cativasse uma nação inteira. No centro da série, está a história de Patsy (McCarthy) e John Ramsey (Owen) – explorando a parceria inquebrável dessas duas pessoas complexas – como marido e mulher, como mãe e pai – que se comprometeram e seus filhos a construir a narrativa de uma vida perfeita e privilegiada apenas para tê-la destruída em uma noite de Natal em 1996”.

Será que um dia teremos a resposta?
O caso se tornou complexo justamente por considerar tantos “detetives externos” e julgamentos baseados em preconceitos. Particularmente, tenho uma teoria, mas diante de tantas, guardarei para mim. Isso porque a breve vida de JonBenét merece um caminho de Paz. Ele continua sendo objeto de interesse popular, documentários e análises, e um dos mistérios mais discutidos do século 20. Isso, não muda mais.
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