Como publicado na Revista Bravo!

Daqui a 10 dias, dia 17 de janeiro (um pouco menos quando a coluna for publicada), estaremos oficialmente discutindo os Oscars de 2025. Os votos acabam dia 12, os contadores passam 5 dias separando os votos e no dia 17 teremos a lista de indicados. Vou lacrar: Fernanda Torres estará nessa lista. 25 anos depois de Fernanda Montenegro, a atriz fará história que esperamos seja “completa”. Há uma corrente a seu favor, mesmo que os números sempre sugiram que vitória de uma estrangeira seja virtualmente difícil. Improvável.

Um histórico de xenofobia em plena revisão

O maior e mais antigo prêmio da Indústria Cinematográfica americana é o Oscar, que chega à sua 98ª edição em 2025. É importante lembrar que ao longo de quase um século, estrangeiros tiveram poucas chances de se destacar em categorias de atuação, sendo ainda pior entre as mulheres. Até hoje – em 98 anos – apenas duas atrizes estrangeiras venceram até hoje como Melhor Atriz em um filme não falado 100% em inglês. Está mais do que na hora de reescrever essa história.

A primeira estrangeira reconhecida pela Academia foi a italiana Anna Magnani, em 1956, por A Rosa Tatuada, um filme americano estrelado por ela e Burt Lancaster e roteiro de Tennessee Williams. Anna, que não era fluente em inglês, atua com forte sotaque e encantou os americanos. Quatro anos depois a grega Melina Mercouri foi indicada por Nunca Aos Domingos, mas perdeu para Elizabeth Taylor em Disque Butterfly 8 (no ano no qual a diva americana quase morreu e anos depois desfez do prêmio alegando que ganhou o Oscar por pena).

Foi apenas em 1961, já uma lenda em Hollywood, que Sophia Loren ganharia seu Oscar de Melhor Atriz por Duas Mulheres, um filme italiano onde ela não fala inglês. Daí até 1999, quando Roberto Begnini ganhou como Melhor Ator e Fernanda Montenegro foi indicada como Melhor Atriz, nenhum outro estrangeiro venceu em um filme não falado em inglês, mesmo com alguns indicados. Entre a vitória de Loren até Marion Cottillard, em 2007, por Piaf, se passaram quase 50 anos. Desde então, mesmo com vitórias de atrizes estrangeiras, nenhuma em um filme estrangeiro (Youn Yuh-jung venceu em 2020 por Minari, mas o filme é co-produção americana). Portanto, se Fernanda Torres for indicada por Ainda Estou Aqui ela será a terceira atriz estrangeira a ter o reconhecimento da Academia em um filme estrangeiro. Seria lindo!

Várias lendas foram indicadas, mas ignoradas

O grande hiato entre uma vitória e outra, especialmente entre as mulheres, fala mais alto do que qualquer discurso: são 18 anos desde o Oscar de Marion Cottilard, a única atriz francesa a ganhar. Atrizes como Anouk Aimée, Isabelle Adjani, Catherine Deneuve, Liv Ullmann, e Isabelle Hupert, entre outras, jamais ganharam uma estatueta americana e isso porque, em geral, os filmes estrangeiros têm distribuição restrita nos Estados Unidos.

Por isso, há 25 anos, Fernanda Montenegro enfrentava muito mais do que a pesada campanha de Harvey Weinstein por Gwyneth Paltrow: ela foi barrada pela xenofobia estrutural e falta de inclusão no cinema americano. Sabe o que é pior? Mesmo na época houve gritos de “injustiça” e a favorita não era Gwyneth ou Fernanda, mas Cate Blanchett por Elizabeth. Atualmente, as “rivais” obvias de Fernanda Torres são Demi Moore por A Substância e Nicole Kidman por Babygirl, sendo que Demi, que venceu o Globo de Ouro como Melhor Atriz Comédia está ganhando tração para ser a favorita do ano, contando com o voto e a campanha aberta de Gwyneth Paltrow pelo Oscar.

Fazendo as contas e as chances de Fernanda no Oscar

Fernanda Torres tem igual prestígio que as possíveis indicadas, com o prêmio de Melhor Atriz em Cannes quando tinha apenas 20 anos, por Eu Sei Que Vou Te Amar, em 1986, e está muito tranquila quanto à pressão da temporada de prêmios. Isso é essencial. Seu discurso emocionado (e emocionante) no Golden Globes a ajuda muito na semana vital da votação para o Oscar.

.Tranquila e segura, em um filme de peso de crítica e bilheteria, mais ainda contexto histórico, é fácil apontar seu favoritismo para estar entre as cinco indicadas, se bobear, tirando Angelina Jolie ou Tilda Swinton do páreo. Explico a razão: a maior parte dos prêmios divide os gêneros (comédia/ musical à parte de drama), mas o Oscar é mais restrito. Apenas há poucos anos ampliou a lista de filmes de 5 para 10, permitindo que filmes não falados em inglês disputem apenas como estrangeiro (não falados em inglês) ou também como Melhor Filme.

Já entre os atores e atrizes isso não mudou. São apenas 5 indicados, de todos os gêneros, com 1 vencedor. Faz da disputa um cenário bem mais complexo e restrito. Do lado “drama”, as favoritas hoje são Nicole, Fernanda, Angelina, Tilda e Kate Winslet. Todas elas com um (ou mais, no caso de Angelina que tem dois Oscars, um deles por seu ativismo) têm um Oscar para chamar de seu.

Do lado comédia/musical é mais difícil. Demi está liderando, mas tem a novidade da hora, a atriz Mikey Madison por Anora, Karla Sofía Gascon por Emília Perez, Zendaya por Rivais e Cynthia Erivo por Wicked. Das 10 atrizes, restarão cinco. E agora?

Com as vitórias no Golden Globes, Fernanda e Demi estão com a preferência, especialmente Demi que está indicada a outros prêmios enquanto Fernanda não foi lembrada no BAFTA ou Critic’s Choice. Das três que restam, é improvável que Cynthia Erivo seja esquecida uma vez que Wicked é sucesso absoluto de bilheteria e garantiria inclusão, mas Zendaya também e é jovem e adorada. Por mais que Rivais seja sucesso, o filme não é mega sucesso e pode ser que a outra vaga fique com Mikey Madison, que está arrasando em Anora.

Agora o impasse: com Demi mais do que assegurada e com muita probabilidade de que Mikey e Cynthia entrem na lista, a vitória do Golden Globes dá força para Fernanda que poderia estar “ameaçada” caso a história fosse ser para para indicar Karla Sofía como a primeira atriz trans no Oscar. Porque ainda estamos falando de ter que escolher entre Angelina Jolie, Nicole Kidman, Kate Winslet e Tilda Swinton! Eu não vejo Angelina nessa lista final, nem mesmo Kate Winslet. Minha torcida por Fernanda me impede deixá-la de fora!

Seja como for, falta pouco para as apostas mudarem de “quem será indicada” à “quem vai ganhar”. Você já tem o seu palpite?

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