Ryan Condal responde à George R.R. Martin

É curioso acompanhar como cada ambiente de fãs de fantasia ou adaptações literárias agem de forma distinta. Enquanto alguns, como os de Reacher, preferem que a série os surpreenda e mude o que está no livro – evitando SPOILERS – em geral, os que curtem fantasia, querem fidelidade do que imaginaram nas págicas transferida para as telas. E isso é mais do que imaginar dragões, demônios ou mágica, é conter toda a complexidade de universos detalhados em mais de 200 páginas em apenas uma hora por semana. Matematicamente é impossível e artisticamente? Bem, é difícil.

Deveríamos com isso dar muito crédito para quem tenta. Quando acertam, são endeusados. Mas quando “fallham”, as pessoas são cruéis. Recentemente, me chamou a atenção a generosidade de Brian Herbert quanto à versão televisiva de Duna:Profecia, que criou personagens novos e alterou detalhes dos livros na série: Esta nova série é cheia de intrigas e suspense. Estou muito satisfeito com ela, e meus pais também ficariam”, ele compartilhou em novembro de 2024.

Notoriamente escritores são bem ciumentos de suas obras. Stephen King e sobretudo George R. R. Martin não economizam palavras quando algo crucial de sua história é “adaptado” na TV. Especialmente Martin. O escritor usa seu blog pessoal para falar mal ou bem de todas as séries que a MAX tem produzido. Em geral começa elogiando e, em seguida, fica desapontado.

Não sabemos qual é sua relação com David Benioff e Dan Weiss depois do caos de Game of Thrones, mas estamos acompanhando que sua amizade com Ryan Condal azedou e um dia aquele que até parecia ser seu sucessor abençoado está entre os piores desafetos. Se uma lista igual a de Arya existisse na vida de Martin, o nome dele estaria lá, sem dúvida.

Ryan Condal é um roteirista, produtor e showrunnerque trabalhou com D&D em GOT antes de assumir sozinho a função de showrunner da série House of the Dragon, o primeiro spin-off de Game of Thrones. Ele é responsável pela adaptação da obra Fogo e Sangue, que serve de base para a série.

Sua colaboração com George R. R. Martin foi fundamental para trazer a complexidade política e o drama das famílias nobres de Westeros à tela, algo que encantou os fãs da saga. Tudo começou bem, mas quando, na segunda temporada, Condal mudou significativamente uma das passagens mais marcantes do livro (Sangue e Queijo), Martin xiou e muito alto, sem poupar em palavras seu descontento do que acabou sendo escolhido para a série.

Agora que a terceira (haverá quatro) começou a ser rodada, Ryan Condal conversou com a Entertainment Weekly sobre essa treta, assim como o que podemos esperar para a próxima fase da história, ciente de que muitos fãs estão do lado do escritor.

O desafio de Condal é quase inglório. A liderança da MAX não é simpática à orçamentos astronômicos que GOT só conseguiu na etapa final (nas primeiras temporadas as batalhas eram offscreen justamente porque não teria como filmá-las sem custo alto) e numa guerra de milhares de mortos e ataques aéreos com dragões – para não ficar ridículo – demanda um cheque significativo. Daí o argumento de que precisa mudar algumas coisas para se ajustar à essa realidade.

Os fãs não querem saber: querem realismo e grandiosidade na guerra civil dos Targaryens, e, vamos combinar, que o que foi alterado quanto à Helaena e seus filhos não passam por questões orçamentárias. Segundo ele, o que fazem é “contar a melhor história possível” com o que tem aprovado.

“Esta é certamente a nossa maior temporada até agora, tanto em termos de ambição quanto em tamanho prático, a quantidade de cenários”, ele diz. “Estamos chegando ao topo dessa parábola narrativa aqui e começando a descer, se não o final, ao ponto médio e chegando ao final do Ato 2 e avançando para o início do Ato 3. Qualquer um que tenha lido o livro sabe que a narrativa fica maior e mais sombria à medida que avança, e o show tem que corresponder a essa ambição da melhor forma possível.”

Há motivos de sobra para que a tensão esteja maior agora: as duas temporadas anteriores prepararam o terreno político para o embate que é sangrento e tão impactante na saga que SPOILER ALERT determina o fim de todos os dragões. Haverá muitas perdas ainda mais tristes e impactantes das que já tivemos, como o próprio showruner sabe, a terceira temporada será definitiva para tirar House of the Dragon da sombra do sucesso de Game of Thrones e a estabelecer como um fenômeno como sua antecedente. Honestamente acho mais fácil Rhaenyra ganhar dos verdes do que Condal conseguir esse feito, mas é o que ele tem pela frente.

Diante disso tudo é que ter um autor reclamando publicamente do que está sendo feito um problema astronômico. Martin fez um post avisando que iria listar “tudo o que deu errado com House of the Dragon” e cada um tem sua lista (eu tenho a minha). É muito chato. E Condal tenta ser político ao dizer que “não viu pessoalmente” o post, mas foi informado sobre ele e ficou decepcionado: como fã, como profissional e como responsável pela adaptação.

D&D enfrentaram anos de assédio semelhante (mas sem Martin falando nada oficialmente contra eles) antes e principalmente depois de GOT, mas Condal está passando por algo ainda pior, o que é assustador para quem lembra da violência da Internet contra a dupla anterior. O showrunner insiste em lembrar que a fonte não é uma narrativa tradicional e dá espaço para outra visão. Ele força um pouco, mas tem razão. O livro é escrito como se um historiador juntasse fatos e fofocas para traçar a narrativa, não há uma voz isenta.

“É uma história incompleta e requer muita junção de pontos e muita invenção à medida que você avança”, ele disse à EW. “Vou dizer simplesmente que fiz todos os esforços para incluir George no processo de adaptação. Realmente fiz. Ao longo de anos e anos. E nós realmente desfrutamos de uma colaboração mutuamente frutífera, pensei, muito forte por um longo tempo. Mas em algum momento, conforme nos aprofundamos na estrada, ele simplesmente se tornou relutante em reconhecer as questões práticas em questão de uma forma razoável. E eu acho que como showrunner, tenho que manter meu chapéu de produtor prático e meu chapéu de escritor criativo, amante do material ao mesmo tempo. No final do dia, eu só tenho que continuar marchando não apenas o processo de escrita para a frente, mas também as partes práticas do processo para o bem da equipe, do elenco e da HBO, porque esse é o meu trabalho. Então, só posso esperar que George possa redescobrir essa harmonia algum dia. Mas é isso que eu tenho a dizer sobre isso.”

Alguém mais precisa elaborar que rolou barraco nos bastidores?

Mas veja, a maior reclamação de Martin tem meu apoio. Eliminar Maelor Targaryen, o terceiro filho da Helaena e Aegon II não apenas tirou o impacto de uma cena extremamente forte (e foi mesmo), mas implica em mudanças significativas do destino da própria Rainha e da força da briga dos Verdes pelo trono. Sim, porque Condal fez questão de incluir a fala de Aegon de que ele ficou mutilado na parte genital quando foi atacado por Aemond, portanto ele não tem herdeiro direto. Claro que essa mudança faz de Aemond um antagonista mais ativo e assustador, mas a SPOILER ALERT morte trágica de Helaena perde um pouco seu impacto emocional.

Condal alega que a abordagem ficou “diferente” mas tem um plano para equilibrar os “efeitos colaterais”.

“Não há nada que façamos no programa sem conversar e pensar muito profundamente por geralmente muitos meses, se não anos”, diz ele na revista. “Vou apenas dizer que as decisões criativas que tomamos no programa fluem através de mim, cada uma delas, e este é o programa que eu quero fazer e acreditar, como um fã de Fire & Blood e um leitor profundo deste material, é a adaptação que deveríamos fazer para não apenas servir Fire & Blood, mas também uma audiência televisiva massiva.”

Taí um dos problemas que atrapalharam GOT já afetando HOTD: o sucesso global. Entram aí argumentos de simplificação para agradar um maior número de pessoas que, de outra forma, não aprovariam a violência das histórias de Martin. Em outras palavras: dinheiro vence a Arte.

A esperança da MAX é investir pesado nas batalhas e já vai abrir a temporada com uma das mais emocionantes delas: a batalha da Goela, citada no livro como uma das mais sangrentas da história, onde as forças da Triarquia defendem os Verdes e quebram o bloqueio dos Pretos no mar. Mas além dessa, haverá “quatro grandes eventos” na mesma temporada. A brincadeira agora é antecipar “quais”.

Nem todos os novos membros do elenco foram anunciados. Há muito segredo em torno de quem será Daeron Hightower (a internet garante que é o ator Harry Gilby) , um personagem ignorado solenemente na 1ª temporada e mencionado apenas na 2ª. O estranho é que como filho de Viserys e Alicent, muitos levaram um susto de saber que havia uma 4ª criança. Ficou realmente confuso, mas o roteiro encontrou um caminho para justificar sua distância e agora, “retorno”. Por outro lado, a entrada de James Norton como Ormund Hightower mereceu destaque na entrevista. “Este é o maior novo papel desde a primeira temporada”, diz Condal. “Acho que Ormund realmente vai encantar e surpreender o público com o que ele traz para a narrativa e com o que James faz com o personagem.”

Falando em “sumidos”, Condal não fala da exclusão de Nettles na história, mas assegura que diferentemente do livro, onde Aegon II fica sumido até sua reaparição surpreendente, veremos mais o rei ferido em seu esconderijo enquanto se recupera.

A confirmação de que Tommy Flanagan vai interpretar o temido Sor Roderick Dustin, líder dos nortenhos e os Winter Wolves é importante. Além dele, Dan Fogler será Sor Torrhen Manderly, outro homem do norte com passagem singular na trama.

As gravações começaram na primeira semana de abril de 2025, isso significa que podemos começar a especular uma estreia para qualquer data a partir de junho de 2026. E claro, tentar ver o que mais está vazando nas redes sociais até lá.


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