Um dos meus livros favoritos sempre foi O Grande Gatsby, escrito por F. Scott Fitzgerald e publicado em 1925. O aniversário do centenário foi há três dias – 10 de abril – mas vale ainda explorar essa obra perfeita.
O livro abre habilmente com Nick Carraway, o narrador (e alter ego do escritor) aludindo ao conselho paterno de que “‘Sempre que você sentir que está prestes a criticar alguém, lembre-se de que não todas as pessoas neste mundo tiveram as vantagens que você teve.'” Nick, primo de Daisy Buchanan e amigo de seu marido, Tom, é vizinho e depois confidente de Jay Gatsby. Ao fim, quando a tragédia marca a trajetória do enigmático milionário, Nick conclui que Gatsby nadava contra a corrente que sempre o puxava para o passado, ainda que acreditasse “na luz verde, no futuro orgástico que ano após ano recua diante de nós”.

Nick começa com uma visão de empatia e reflexão, onde tenta se colocar no lugar dos outros, o que talvez o faça entender mais sobre os erros e falhas dos personagens, como Gatsby e os Buchanans. Ao mesmo tempo, ele é constantemente influenciado pela sua própria moralidade e pelas expectativas da sociedade e termina constatando que a tragédia da busca incessante e da impossibilidade de alcançar os nossos ideais, o que o faz ser menos sonhador, mais triste, e penalizado de toda uma geração que buscava a perfeição.
Mesmo com esse resumo breve e superficial, não há como insistir mais que leia o livro e que veja os filmes. O impacto certamente é inevitável.
A trama se passa nos anos 1920, durante a chamada Era do Jazz, uma época de excessos, festas extravagantes e desilusões. Como mencionei, o livro é narrado por Nick Carraway, um jovem que se muda para Long Island em busca do “sonho americano” e acaba se tornando vizinho de Jay Gatsby, um homem misterioso e rico, conhecido por suas festas luxuosas e pela sua obsessão com a mulher que ama, Daisy Buchanan.
Daisy, porém, é casada com Tom Buchanan, um homem arrogante e infiel. Gatsby, que, aos poucos descobrimos, nasceu pobre, fez sua fortuna de maneira duvidosa, agora vive apenas para tentar reconquistar Daisy, que ele conheceu e amou antes da guerra, mas perdeu para Tom.
O livro acompanha Nick enquanto ele se envolve nesse triângulo amoroso, vendo como Gatsby tenta de todas as maneiras possíveis realizar seu sonho de voltar a ter Daisy, agora idealizada em sua mente. Porém, o final é trágico: Gatsby é assassinado por engano, por um crime que está diretamente ligado ao seu desejo incontrolável de viver uma fantasia de amor e sucesso. O romance termina com uma reflexão amarga sobre os limites do “sonho americano” e a futilidade de tentar reviver o passado.
A culpada? Daisy, que atropela deliberadamente a amante de Tom e se une ao marido para colocar a culpa em Gatsby. Como melhor diz Nick: “Pessoas descuidadas, que destruíam coisas e criaturas e então se refugiavam em seu dinheiro ou em seu vasto descuido ou no que quer que os mantivesse juntos, e deixavam outras pessoas limparem a bagunça que eles haviam feito”. Tão perfeito e atual! Mesmo 100 anos depois.

Quem Inspirou F. Scott Fitzgerald?
Fitzgerald se inspirou muito em sua própria vida e em pessoas que conheceu durante sua juventude e vida adulta. Uma das principais inspirações para o personagem de Gatsby foi a figura de Max Gerlach, um milionário novo-rico que Fitzgerald conheceu e que, como Gatsby, vinha de origens humildes e usava sua riqueza para impressionar os outros. A “prova” mais cabal era o fato de que Gerlach chamava as pessoas de “old sport” (igual ao Gatsby) e que teria feito fortuna de maneiras um tanto obscuras. Gerlach é a principal inspiração para a personagem porque era um “dândi marginal duvidoso”, que se apresentava como um barão alemão fugido da Europa durante a Primeira Guerra Mundial, mas na verdade era um contrabandista que usou uma concessionária de carros e amigos da alta sociedade para esconder seus ganhos ilícitos. Uma história considerada “típica” a Era do Jazz.
Mas há outros.
Estudiosos dizem que o lado flamboyant de Gatsby também tinha outras fontes, sendo a mais frequentemente citada como a do milionário Joseph G. Robin, um banqueiro nova-iorquino que enriqueceu muito durante a Era Dourada, acumulando e desenvolvendo imóveis, construindo uma rede ferroviária e fazendo alguns negócios obscuros com empresas de energia que surgiram na costa das Cataratas do Niágara. Em 1910 seus negócios escusos foram revelados e ele foi preso.
A dose pessoal do autor em Gatsby está no seu amor por amor uma mulher inconstante e fútil. Há unanimidade em apontar que Daisy tinha muito de Zelda Sayre, sua esposa. Zelda era uma mulher rica e cheia de charme, mas a relação dela com Fitzgerald era conturbada, cheia de altos e baixos. O amor de Gatsby por Daisy pode ser visto como um reflexo da relação de Fitzgerald com Zelda — uma busca incessante pelo que parecia ser uma perfeição impossível. Também há indícios de que a obsessão de Gatsby por Daisy foi inspirada em Ginevra King, um antigo amor de Fitzgerald que era rica e inatingível — e cujos pais disseram uma vez a ele: “os pobres não se casam com os ricos.” Difícil ignorar o paralelo.

Por Que Não Foi Sucesso Imediato?
Apesar de ser considerado hoje um dos maiores clássicos da literatura americana, O Grande Gatsby não fez sucesso na época de sua publicação. Fitzgerald já era conhecido, mas o público estava mais interessado em romances mais leves ou em histórias de aventura. O tema do livro — uma crítica ao “sonho americano” e à busca desenfreada por riqueza e status — era algo que muitos leitores não estavam prontos para abraçar na época. O foco de Fitzgerald na futilidade e na superficialidade da vida da alta sociedade não foi bem recebido por todos.
Outra barreira seria o fato de que o grande público da época não se identificava com o tipo de vida que Fitzgerald descrevia: milionários hipócritas e festas da alta sociedade. Os leitores queriam histórias que celebravam o sucesso e o otimismo, enquanto O Grande Gatsby oferecia uma visão mais sombria e desiludida, especialmente sobre a busca por riquezas.
O sucesso só veio anos depois, quando os soldados da Segunda Guerra Mundial começaram a lê-lo, encontrando no romance uma conexão com as dificuldades e as ilusões que sentiam após a guerra. Com o tempo, o livro se consolidou como um ícone da literatura americana.

Recepção e impacto inicial
Quando foi lançado, o livro não fez muito sucesso, acredita? Vendeu pouco, recebeu críticas mornas, e Fitzgerald ficou bem frustrado. Ele acreditava que tinha escrito algo grande, mas o público não entendeu muito bem — talvez por ainda não estarem prontos pra crítica sutil que o livro faz ao sonho americano e à superficialidade da elite.
Fitzgerald morreu em 1940, pobre e meio esquecido. Só que aí, durante a Segunda Guerra Mundial, o livro começou a ser distribuído aos soldados americanos — e essa nova geração enxergou nele algo profundo, quase mítico. A partir daí, Gatsby foi redescoberto, passou a ser estudado em escolas e universidades, e virou um clássico absoluto.
O impacto cultural
Hoje, O Grande Gatsby é considerado uma das maiores obras da literatura dos Estados Unidos. É leitura obrigatória nas escolas, citado em filmes, músicas, citado até em discursos políticos. Ele captou com uma precisão absurda essa sensação de beleza e vazio ao mesmo tempo — o brilho das festas e a tristeza que vem depois, como a ressaca de uma ilusão.
A figura de Gatsby virou um símbolo: o cara que corre atrás de um sonho impossível, que constrói uma vida inteira pra impressionar alguém que talvez nem valha tanto a pena. Sua primeira adaptação para o cinema foi ainda em 1926, no cinema mudo. Em 1949, um jovem Alan Ladd foi um Gatsby mais sombrio, refletindo o clima pós-Segunda Guerra. No hiato de 25 anos, veio o filme com roteiro de Franis Ford Coppola, estrelado por Robert Redford e Mia Farrow, que não fez sucesso (mas é extremamente fiel ao livro). Alguns acham que ficou um pouco fria.

Em 2013, veio a versão mais conhecida da nova geração, dirigida por Baz Luhrmann, com Leonardo DiCaprio como Gatsby, Carey Mulligan como Daisy, e Tobey Maguire como Nick. É visualmente deslumbrante e com trilha sonora moderna, mas que dividiu opiniões por tomar algumas liberdades artísticas. Ainda assim, renovou o interesse no livro. Atualmente há uma versão musical em cartaz na Broadway.
No fim das contas, O Grande Gatsby é um livro sobre querer algo com tanta força que você se perde tentando alcançar. É sobre identidade, ilusão, status, amor e a sensação de que talvez tudo isso seja só fumaça e espelhos. Não é à toa que, quase 100 anos depois, ele ainda nos faz pensar. Vale rever, reler e sempre lembrar.
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