A série Étoile está prestes a estrear no Prime Video e promete renovar o olhar do grande público sobre a dança clássica. Em um cenário onde o balé costuma ser retratado no cinema como torturante (Cisne Negro) ou melodramático (Flashdance, Momento de Decisão (Turning Point)), raramente há espaço para uma abordagem respeitosa, realista e leve sobre a vida dos bailarinos. É exatamente aí que Étoile se diferencia: com um enredo envolvente, humor sutil e um elenco técnico e artístico de alto nível, a série tem tudo para conquistar tanto os amantes da dança quanto quem nunca colocou os pés em uma sala de balé.


Criada por Amy Sherman-Palladino e Daniel Palladino — o casal por trás de The Marvelous Mrs. Maisel e Gilmore Girls —, Étoile se passa entre Paris e Nova York, alternando as tensões e os encantos de duas grandes companhias de dança. No elenco principal, Lou de Laâge e David Alvarez trazem elegância e veracidade aos seus papéis. Ambos têm formação em dança: Lou estudou no Conservatório de Bordeaux e Alvarez, vencedor do Tony Awards por Billy Elliot, chegou a dançar no American Ballet Theatre. Ainda assim, para os momentos mais exigentes da coreografia, são dublados por bailarinos profissionais.
Lou é dublada por Constance Devernay-Laurence, ex-principal do Scottish Ballet, uma intérprete refinada com forte presença cênica e hoje diretora do Ballet Grand Prix na Escócia. Já Ivan du Pontavice, que vive o temperamental Gabin, tem seus movimentos técnicos assumidos por Arcadian Broad, bailarino e coreógrafo conhecido por seu virtuosismo no Orlando Ballet. A dobradinha entre ator e bailarino é feita com tal precisão que, em muitos momentos, o espectador dificilmente notará a transição entre um e outro — um feito técnico e cinematográfico notável.


David Alvarez, por sua vez, executa todas as suas cenas de dança sem dublês. Sua formação sólida permite que ele habite o palco com autenticidade, algo raro em produções dramáticas sobre dança. Outra que assume o palco com os próprios pés é Taïs Vinolo, estrela do Ballet Nacional do Canadá. Francesa de nascimento, ela interpreta Mishi, uma bailarina que retorna a Paris após uma temporada em Nova York e desencadeia um reequilíbrio delicado entre egos e legados dentro da companhia.
O elenco ainda conta com participações de peso do universo da dança, como Unity Phelan e Tiler Peck, ambas principais do New York City Ballet, e John Lam, primeiro bailarino do Boston Ballet. Esses nomes não apenas emprestam credibilidade à narrativa, mas elevam o padrão de execução técnica da série, fazendo com que Étoile dialogue diretamente com o universo da dança profissional — algo que raramente se vê fora dos palcos.


Um dos méritos da série está no uso sutil da tecnologia para integrar dança e dramaturgia. Desde Momento de Decisão, que contou com Mikhail Baryshnikov e Leslie Browne atuando e dançando, ou Sapatilhos Vermelhos, com Moira Shearer, até Cisne Negro, com Natalie Portman sendo dublada em boa parte das cenas por Sarah Lane, os limites entre atuação e dança vêm sendo testados. Mas Étoile parece apontar para uma nova era, em que o talento cênico e o virtuosismo técnico coexistem com mais harmonia — sem sacrificar a qualidade nem trair a integridade da arte do balé.


Mais do que uma série sobre dança, Étoile é uma homenagem à vida no palco, às rivalidades e cumplicidades nos bastidores e ao corpo como instrumento de expressão. Em tempos em que a dança clássica luta para manter seu espaço na cultura popular, uma produção desse nível — com artistas talentosos, coreografia de excelência e narrativa instigante — tem potencial para inspirar uma nova geração de dançarinos, além de encantar quem apenas assiste de fora. Que venha o próximo ato.
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