Ballet de um ato: Étoile é cancelado

Durou menos do que o esperado, mas não chega a ser uma surpresa: a série Étoile foi sumariamente cancelada antes mesmo que pudessem ensaiar novos passos. A recepção foi morna mesmo por especialistas de dança (mais sobre isso à frente), e o curioso é que a segunda temporada já estava encomendada, ou seja, não há como fugir do veredito de fracasso.

A série criada por Amy Sherman-Palladino e Daniel Palladino era extremamente pessoal para a dupla – Amy já foi bailarina – e uma segunda tentativa dos dois de cobrir o universo do ballet que não dá certo. Depois do sucesso e prêmios de The Marvelous Mrs. Maisel, a Amazon Prime Video estava tão certa que teria algo bom nas mãos que tinha encomendado duas temporadas diretamente, sem passar por fase piloto. Voltar atrás tão radicalmente é um sinal dos tempos.

Étoile foi produzida rapidamente, e estreou há mais ou menos seis semanas com seus oito episódios de uma só vez. Ambientada no universo do balé, a série acompanhava duas companhias tradicionais — uma em Nova York e outra em Paris — tentando se reinventar. Os diretores das instituições, interpretados por Luke Kirby (também de Maisel) e Charlotte Gainsbourg, decidem trocar seus bailarinos principais, numa tentativa ousada de sobreviver em meio à crise artística e institucional.

No papel, perfeito, mas, apesar da premissa promissora, da estética impecável e das locações em Nova York e Paris, Étoile não chegou a figurar entre os dez títulos mais assistidos nas semanas em que esteve no ar, segundo dados da Nielsen. Com isso, ficou difícil de se justificar financeiramente, especialmente diante de mudanças internas na empresa. Jen Salke, ex-chefe do estúdio e responsável por aprovar Étoile, deixou o cargo no fim de março, embora tenha firmado um acordo de produção antes de sair.

Com isso, Étoile é mais um representante da “nova fase” do streaming onde histórias de custo alto – sejam fantasia, de época ou dramas que se passam em mais de um país como esse caso – têm que estourar para ficarem na planilha. Elogios de crítica ou fãs nichados não justificam o investimento. Para quem trabalhou na indústria, esse momento sempre esteve no horizonte. A mudança de janelas que encurtavam os tempos de cinema ou que não usavam a base de anúncios comerciais da TV aberta sempre foram o impasse de produção. O modelo de negócio que estava estabelecido não foi criado porque executivos eram mais apegados à cinema ou TV, era o contrário, foi a fórmula que garantiu o retorno monetário e que, com isso, estabeleceu a hierarquia que nem a Netflix conseguiu inverter. Falarei sobre tudo isso à parte. Hoje fico no meio do caminho de sentir por Étoile e entender a razão de sua vida curta.

Mesmo com o cancelamento, Étoile segue como um registro delicado e sofisticado sobre o mundo do balé e as tensões entre tradição e reinvenção. Para quem gosta de dança, vale assistir — enquanto ainda está disponível. Mas a verdade é que a dança continua sem conseguir se transpor para outro meio. E isso é muito triste.


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