Me parece que ainda teremos mais sextas-feiras comigo falando mal de And Just Like That, mas a minha frustração só aumenta. O fiapo de história em cada episódio reflete como os arcos das personagens são praticamente inexistentes ou desinteressantes. Vejamos o resumo do episódio:
Carrie é convidada para participar de um evento exclusivo da Google, para ter um painel no South by Southwest (SXSW) ou para um evento mínimo na rural Williamsburgh, na Virgínia. Ela escolhe a rural Virgínia para poder esbarrar com Aidan — para um almoço, já que o combinado bizarro dos dois exclui passar a noite juntos — e essa é a aventura da personagem que é a mulher madura mais imatura da ficção. Chegar aos 60 e aceitar um acordo com um ex de “esperar 5 anos” sem estar com ele nem em contato direto jamais funcionaria ou seria aceito por qualquer uma que tivesse amor-próprio ou a vivência de Carrie. Ela é uma viúva milionária, escritora requisitada, mulher independente. Que m… é essa que o Aidan quer fazer com ela?

Paralelamente, estou revendo a quarta temporada de Sex and the City e estou não apenas pegando ick do Aidan, mas considerando-o no mesmo nível de sadismo e toxicidade do Mr. Big. Big ao menos passou por uma profunda transformação, se casou e foi fiel à Carrie como ela era, sem pedir para mudar um milímetro, até o fim. Toda vez que Aidan entra no circuito, ele quer mudar a Carrie. Deixa ele no mato, amiga! Para piorar, a ex-mulher dele tem a cara de pau de ligar para a Carrie, avisando que sabe da visita e pedindo que ela traga remédios prescritos para Wyatt. Olha aí outra oportunidade perdida da série!
Charlotte, que resolve o problema para Carrie em três segundos, comenta o drama das mães modernas que estão lidando com os problemas de saúde mental das crianças — como TDAH e outros — com medicações pesadas. Mas, em vez de mergulhar nesse tema atual, sério e urgente, pronto: todas riem e o problema está resolvido. Em SATC, isso jamais passaria tão solto.
Em seguida, Carrie quer uma amiga para ajudá-la no álibi que ninguém está acreditando e, inicialmente, não consegue.

Isso porque Miranda está retomando sua carreira como advogada e agora tenta decifrar sua relação com a repórter da BBC. Charlotte está revoltada por perder momentos divertidos pós-trabalho porque criou filhas dependentes dela, o que encontra eco em Harry (o melhor marido dos séculos). Com Lilly e Rose garantindo que a mãe deve mesmo reinvestir na carreira de galerista e se divertir, Charlotte e Harry passam a tentar fazer isso. As piadas, no entanto, continuam sempre no campo do escatológico (Harry faz xixi nas calças por não conseguir abrir o zíper a tempo) e mal arrancam um sorriso dos nossos lábios.
A partir daí, briguei com o sono para acompanhar. Foram 10 minutos dos longos 30 de cada episódio. Lisa Todd é abandonada pela editora do documentário que está levando oito anos para ficar pronto e que ainda precisa incluir Michelle Obama (!). Ela está revoltada com o mundo e se sente incompreendida, justificando o atraso com o fato de ter tido dois filhos no meio do processo. Outra oportunidade perdida que SATC jamais teria deixado de lado: explorar como muitas vezes mulheres que tiveram filhos são instrumentalizadas para pressionar ou deslegitimar as que não tiveram. Lisa se acerta com a amiga, mas ainda está em um lugar ruim consigo mesma.

E Seema, a melhor de todas, nem se recuperou do péssimo momento com a casamenteira que seu chefe — que diz adorá-la — arranjou, e já é forçada a lidar com mais uma surpresa vinda desse homem (nada) adorável: ele vai se aposentar e vendeu a companhia para outro. Seema fica em choque, porque o combinado era vender a parte dele para ela — e, claro, ele ignorou isso. É surreal ver esse mal-caráter ainda sendo vendido como alguém que adora Seema. Imagine se a detestasse!
Com isso, Seema tira uns dias de folga, acompanha Carrie até a Virgínia e, no caminho, conhece o jardineiro Adam — um Aidan melhorado, que Carrie está ignorando, mas Seema já se ligou. E claro que, uma vez na Virgínia, Carrie consegue um convite de Aidan para ficar uns dias — desde que fique na casa de hóspedes, enquanto ele fica na casa principal com os filhos. E ELA ACEITA! Deus do céu.
And Just Like That segue assim: solto, tolo, e cada vez mais se aproximando de ser um sonífero. Que triste…
Talvez o mais triste de tudo seja perceber o quanto And Just Like That tem se afastado da alma que fazia Sex and the City ser o que era: inteligente, ousada, divertida e, sobretudo, honesta com as escolhas de suas personagens. Hoje, nos restam caricaturas arrastadas por roteiros que não confiam no próprio universo. O pior não é ver essas mulheres envelhecerem — isso seria lindo, potente, necessário. O pior é vê-las diminuídas, incoerentes, presas em ciclos que negam tudo o que elas já foram. E isso, sinceramente, não tem nada de evolução. É só melancolia.
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