Hollywood adora duplas. E nós também.

Quando Tom Cruise e Brad Pitt começaram a dar sinais de que poderiam trabalhar juntos novamente — décadas depois de Entrevista com o Vampiro (1994) —, o público reagiu com um misto de nostalgia e expectativa. A ideia de dois titãs do estrelato dividindo novamente a tela traz à memória outra dupla lendária: Paul Newman e Robert Redford. Comparar os dois pares é inevitável — e revelador.

Newman e Redford imortalizaram sua química em dois filmes apenas, mas que bastaram para gravar seus nomes na história como um dos pares mais carismáticos do cinema: Butch Cassidy and the Sundance Kid (1969) e The Sting (1973). Brad Pitt e Tom Cruise, por sua vez, têm uma história mais breve e conturbada, mas carregam consigo o mesmo tipo de fascínio que sempre paira sobre duplas de galãs com perfis opostos. A diferença é que, no caso deles, o retorno potencial seria não uma repetição da juventude, mas um reencontro entre veteranos — e isso talvez torne tudo mais interessante.

Mentores e pupilos (reais ou projetados)

A construção simbólica em torno dessas duplas passa por outro elemento essencial: a ideia de mentoria e legado. Assim como Redford foi visto como um espelho para Brad Pitt — loiros, de olhos claros, com beleza clássica e inclinações mais sérias no drama e na produção autoral —, Paul Newman foi, por um tempo, uma figura de referência para Tom Cruise, especialmente durante as filmagens de A Cor do Dinheiro (1986), que deu a Newman seu primeiro e único Oscar competitivo.

Na época, Cruise era jovem e impetuoso, e aprendeu com Newman o valor da contenção, da escuta e do silêncio em cena. Ele já declarou que aquele set foi uma espécie de escola. A química entre os dois funciona justamente pela tensão entre opostos: o olhar sereno e calculado de Newman contraposto à exuberância nervosa de Cruise. Eles não se tornaram íntimos depois disso, mas o encontro foi decisivo para a trajetória de Cruise como ator.

No caso de Redford e Pitt, a relação foi menos explícita em tela, mas não menos significativa. Redford foi produtor executivo de Lendas da Paixão (1994), que consolidou Pitt como ídolo romântico e trágico. Quando finalmente atuaram juntos em Spy Game (2001), Redford interpretava o mentor de um agente impulsivo vivido por Pitt — uma dinâmica quase metalinguística. O filme é construído como um jogo de espelhos, com Pitt como uma espécie de “Redford jovem”, ecoando não apenas traços físicos, mas também um tipo específico de magnetismo introspectivo. Não à toa, os fãs e a crítica adoraram brincar com a semelhança.

Cruise e Redford: um encontro esquecido

Curiosamente, Tom Cruise e Robert Redford também atuaram juntos em Leões e Cordeiros (Lions for Lambs, 2007), um drama político que marcou a estreia de Cruise em um papel mais verbal e reflexivo, sob a direção do próprio Redford. O filme foi mais celebrado pelo conteúdo do que pela química entre os dois, mas reforça esse entrelaçamento simbólico entre os quatro nomes. Cruise foi o pupilo de Newman. Pitt, o herdeiro informal de Redford. E em Leões e Cordeiros, os eixos se cruzam.

Amizades reais, amizades míticas

O que distingue Newman e Redford de Pitt e Cruise talvez seja a amizade verdadeira e duradoura entre os primeiros. Apesar das personalidades diferentes, Newman e Redford mantiveram uma relação sólida fora das telas, com carinho mútuo e projetos compartilhados. Redford homenageou o amigo após sua morte com um lamento público: “A única coisa que me dói é que nunca disse a ele o quanto o amava.” A história entre eles não era apenas de cinema — era de vida.

Já entre Cruise e Pitt, a relação foi mais volátil. Durante e após Entrevista com o Vampiro, houve relatos de tensão nos bastidores. Pitt chegou a dizer que a experiência foi desconfortável, e a mídia fomentou a ideia de uma rivalidade silenciosa. Mas os anos passaram, os dois envelheceram bem, e o tom mudou. Recentemente, Cruise elogiou Pitt como “um ator incrível com escolhas ousadas”. Pitt, por sua vez, reconheceu a contribuição de Cruise para a redefinição dos blockbusters. O tempo, como sempre, suavizou as arestas. E agora as brincadeiras é de um reencontro nas telas, “desde que eu fique com a bunda colada no chão e não tenha que me pendurar em um avião”, Pitt brincou.

A imagem dos dois no tapete vermelho da F1, filme de Pitt, viralizou e sinalizou que o papo esteja mais sério do que parece.

Duplas que alimentam mitologias

Hollywood se alimenta dessas narrativas: duplas, amizades, heranças simbólicas. O público quer acreditar que o que vemos na tela reflete uma verdade fora dela então as comparações entre Cruise e Pitt com Newman e Redford talvez sejam mais desejadas do que exatas, mas isso pouco importa. O cinema é feito de projeções, e nós projetamos nessas duplas o que gostaríamos de ver: irmandade, competição, respeito mútuo.

Se o novo projeto entre Cruise e Pitt sair do papel, será não só um reencontro de estrelas, mas a chance de reencenar, com outra geração, o tipo de parceria que se tornou rara no cinema atual. E talvez — só talvez — eles possam finalmente ocupar, juntos, o espaço simbólico que Newman e Redford deixaram vazio: o de uma dupla que não precisa de muitos filmes para virar lenda. Basta um certo olhar, uma troca silenciosa, uma tensão contida — e o mito se renova.


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