A verdade, o amor e os casais de ferro de The Gilded Age

Ah, o amor em The Gilded Age pode ser bem complexo. A terceira temporada fo intensa e circulou em torno de uma questão: confiança. Quem mente? Quem manipula? Quem sabe o que é a verdade? Quando uma omissão pode ser justificada? Quando confrontar segredos é invasivo, lucrativo, justificado ou simplesmente cruel? Nenhuma resposta foi fácil para os casais da série.

Ironicamente, George Russell enxerga tanto de si mesmo no filho que, inevitavelmente, reconhece em Marian Brook qualidades que ele também vê – ou viu um dia – em Bertha. E o curioso é que os dois casais estão lidando, ao mesmo tempo, com exatamente o mesmo tipo de problema. Na 1ª temporada, George omitiu de Bertha um enorme problema, pagou o preço por isso e, depois de todo o desgaste, os dois conseguiram fazer as pazes. Já quando chegou a vez de Bertha, ela não apenas omitiu, como mentiu, ignorou completamente os sentimentos e pensamentos dele e, para piorar, mostrou-se tão insensível que nem foi capaz de identificar onde errou. Nesse aspecto, Larry está muito mais próximo dela do que de George. Concordam?

Sim, quando falo de tudo isso estou me referindo a como Bertha lidou com toda questão do casamento de Gladys. Implacável, Bertha forçou a filha em um casamento que não queria, a igreja inteira sem ar com a noiva aos prantos e apenas sua mãe em delírio festivo. George se sentiu, corretamente, um merda por não ter conseguido evitar ou contornar a manobra da esposa.

Já Marian ficou furiosa com Larry por causa da mentira, e tudo o que está acontecendo só reforça a certeza de que ela estava absolutamente certa. Caso tenha esquecido, no mesmo dia que a pediu em casamento, Larry passou a noite com amigos em uma despedida de solteiro em um bordel. Ele disse à noite que ia celebrar com eles, mas disse que era um jantar em um restaurante. Quando Marian descobriu a verdade, Larry se manteve incerto onde estava o erro dele. A diferença dele com seus pais é que espero, sinceramente, que a 4ª temporada comece com o casamento dos dois — e não com um adiamento indefinido até o momento em que ele sentir que ela “se submeteu” a ele reconhecendo uma razão inexistente. Se adiarem demais a reconciliação efetiva de Marian e Larry, corremos o risco de ver a trama esfriar e, pior, entediar. Larry, até outro dia, não conseguia tirar as mãos de Marian. Será que perdeu o desejo? Isso não seria nada bom…

E George? Bem, para Bertha, o desafio é ainda maior. Mas sabemos que Alva Vanderbilt, na vida real, mudou radicalmente e de uma milionária fútil tornou-se uma mulher completamente diferente e engajada nos últimos anos — é verdade que com um novo marido, mas Bertha não é Alva. Ela ama George de verdade e pode reconquistá-lo. Para isso, porém, primeiro — assim como seu próprio filho — precisará reavaliar profundamente o significado da palavra verdade: saber exigir e também manter. Ela já pagou pelo que fez. E, se tudo correr como espero, poderemos ver uma nova fase de “lua de mel” lá por 2026 ou 2027, certo?

E já que esta análise está virando quase um livro, vale a pena brindar também a Peggy e William. Eles mostraram, para todo mundo, que dor, segredos e erros, por mais difíceis que sejam de enfrentar, só precisam de transparência para que se possa encontrar um ponto de encontro. William sabia exatamente o que sentia por Peggy, enxergou quem ela realmente era e não apenas se recusou a culpar o pai dela por ter arruinado sua reputação, como também não deu ouvidos à mãe, que além de julgadora, chega a flertar com o mal. Isso, aliás, é exatamente o que Larry deveria ter feito por Marian. Peggy merecia — e teve — o apoio público de um grande homem. E foi, sim, um final muito feliz.

Mas se Bertha e George representam a luta para reencontrar a confiança perdida, e Marian e Larry encarnam a tensão entre orgulho e reconciliação, há um quarto casal que subverte totalmente essa lógica: Oscar Van Rhijn e Enid Turner. Curiosamente, a dupla mais “mentirosa” da série talvez seja também a mais honesta. Oscar é obrigado a esconder de toda a sociedade — e até de sua própria família — sua homossexualidade, mesmo quando perde o amor de sua vida, John Adams, e, junto dele, seu maior investidor. Não é que ele queira enganar alguém; é que, na Nova York da época, ser honesto significaria prisão ou exílio. Desde a 1ª temporada, acompanhamos sua busca por uma esposa que, mais do que um romance, seja uma boa companheira e aliada.

Ele foi prático com Gladys, oferecendo a ela exatamente a liberdade e autonomia que ela queria, mas George percebeu a estratégia e bloqueou o plano antes que fosse tarde. Já Maud Beaton — cujo próprio nome era falso — o enganou e acabou levando parte de sua fortuna. Agora, quando finalmente estava se reerguendo, Oscar sofre o golpe mais duro: John morre. E é então que o reencontro com Enid Turner, agora viúva Winterton, se mostra simplesmente perfeito.

Enid está rica, mas sem acesso à sociedade que só a tolerava por causa do marido. Como esconde de (quase) todos que, até pouco tempo atrás, era camareira, sente-se particularmente à vontade com Oscar, porque ele sabe a verdade — e não se importa. Desde a 1ª temporada, eles compartilham esse jogo de flerte, golpe e cumplicidade, que começou quando Turner quis ajudar Gladys a escapar dos planos de Bertha para um casamento de conveniência, movida por pura vingança contra a ex-patroa. São, em muitos sentidos, almas gêmeas.

Agora, Enid teria nele o marido com nome respeitável, capaz de cuidar de sua fortuna e abrir as portas das festas certas. Ele, por sua vez, teria uma esposa que jamais o questionaria por passar temporadas inteiras longe — fosse com homens ou mulheres. É a fachada perfeita. E, de forma quase tortuosa, talvez mais alinhada e feliz do que Bertha e George ou Larry e Marian. Porque, no fim das contas, o pacto deles não é sustentado por ilusões de romance idealizado, mas por uma clareza brutal sobre quem são e o que esperam um do outro. E talvez, em um universo onde todos mentem, isso seja a forma mais rara de verdade.


Descubra mais sobre

Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.

Deixe um comentário