Agente 86: A Espionagem que Virou Comédia

Em 1965, o mundo vivia sob o fascínio da Guerra Fria, de James Bond e da espionagem glamourosa que os cinemas e a literatura alimentavam. Foi nesse contexto que dois gênios do humor, Mel Brooks e Buck Henry, tiveram uma ideia ousada: e se, no lugar de um espião irresistível e infalível, o protagonista fosse um completo trapalhão? Assim nasceu Get Smart, conhecido no Brasil como Agente 86, que estreou na NBC no dia 18 de setembro de 1965 — e que, neste ano de 2025, completa 60 anos de história.

A Criação: Mel Brooks, Buck Henry, e o Anti-Bond

Mel Brooks, então um jovem roteirista que já demonstrava sua vocação para o absurdo, descreveu Get Smart como “uma mistura de James Bond com meu próprio humor caótico”. A rede de TV queria um produto que surfasse na onda de 007, mas Brooks e Henry entregaram algo muito mais ousado: uma sátira que desmontava todos os clichês do gênero. Maxwell Smart não era elegante como Sean Connery, nem um gênio da dedução — era desajeitado, literal, sem noção, mas, por algum milagre, sempre acabava cumprindo a missão.

O personagem caiu como uma luva para o ator Don Adams, que deu vida a Maxwell Smart com sua voz característica, timing impecável e uma seriedade absurda diante do ridículo. Ao seu lado, Barbara Feldon como a Agente 99 trouxe inteligência, charme e eficiência — ironicamente, era ela quem resolvia a maior parte das situações, embora o crédito sempre recaísse sobre Smart.

Bordões, Gadgets e o Humor que Ficou Ícone

O sucesso da série não pode ser contado sem seus bordões. Expressões como:

“Sorry about that, Chief”
“Missed it by that much”
“Would you believe…?”
“…and loving it”

entraram para o vocabulário popular e até hoje são lembradas.

Os gadgets também se tornaram lendários, sobretudo o telefone-sapato — talvez um dos objetos mais icônicos da cultura pop. Havia ainda o telefone dentro do espelho, o que ficava escondido no esmalte de unhas da Agente 99, e a impagável Cone of Silence, supostamente criada para garantir sigilo absoluto, mas que, na prática, só impedia que os personagens se ouvissem, deixando tudo audível para quem estivesse de fora.

Get Smart funcionava como uma caricatura das paranoias da Guerra Fria, ridicularizando tanto a agência de espionagem CONTROL quanto sua rival, KAOS. O humor era ingênuo, mas também sofisticado, subvertendo a lógica do gênero de espionagem.

O Sucesso e a Audiência

Nos Estados Unidos, a série fez barulho imediato. Já na primeira temporada, entrou no Top 15 do ranking Nielsen, garantindo o 12º lugar em audiência. Logo depois, manteve-se entre as mais assistidas, acumulando 138 episódios ao longo de 5 temporadas.

A produção ainda colecionou 14 indicações ao Emmy, vencendo 7 vezes, incluindo prêmios de Melhor Série de Comédia. Em 2010, a abertura de Get Smart — aquela sequência de portas que se fecham antes de Smart chegar ao telefone-sapato — foi eleita a segunda melhor abertura de todos os tempos pela TV Guide.

No Brasil: Do Preto e Branco à Memória Coletiva

Por aqui, Agente 86 estreou na TV Record e, depois, passou por TV Bandeirantes, Rede Globo, RedeTV! e até pelo Multishow. Ganhou várias gerações, seja na dublagem clássica — que transformou os bordões em verdadeiras pérolas nacionais —, seja nas reprises que encantavam tanto crianças quanto adultos.

O humor de Maxwell Smart, mesmo datado em alguns aspectos, permaneceu universal, garantindo gargalhadas em qualquer época.

Cultura Pop: Um Legado Inquebrável

Get Smart não apenas fez sucesso em sua época, mas se espalhou em paródias e referências:

O desenho animado mexicano Super Agente 3.1486. O MadTV, que criou esquetes chamados “Get Smarty”. Os Simpsons, que já usaram a icônica abertura como “couch gag”. Filmes como The Nude Bomb (1980) e Get Smart, Again! (1989).

E claro, o revival cinematográfico mais famoso: o filme de 2008, estrelado por Steve Carell e Anne Hathaway.

O Filme de 2008: Uma Nova Geração Descobre o Agente 86

Lançado em 2008, Get Smart trouxe Steve Carell como Maxwell Smart e Anne Hathaway como a Agente 99, em uma adaptação que manteve o espírito da série, mas atualizou o humor para o público contemporâneo. O elenco ainda contou com Alan Arkin como o Chefe e Dwayne Johnson como o Agente 23.

O filme mesclou comédia física, sátira e ação moderna, apresentando novamente ao mundo os gadgets absurdos, o telefone-sapato e até a famosa Cone of Silence. Embora tenha dividido a crítica — alguns acharam que faltava a ingenuidade charmosa da série original —, o longa foi um sucesso de bilheteria, arrecadando mais de 230 milhões de dólares mundialmente.

Para muitos jovens, foi o primeiro contato com o universo de Maxwell Smart e abriu caminho para que a série clássica fosse redescoberta em DVDs e streaming.

A Despedida de Don Adams, o Agente 86

Apesar de o personagem ser eterno, Don Adams não está mais entre nós. O ator faleceu em 25 de setembro de 2005, aos 82 anos, em decorrência de uma infecção pulmonar e de um linfoma ósseo. Sua morte encerrou uma era, mas o legado de Adams como Maxwell Smart permanece inabalável: ninguém jamais repetiu com tanto carisma e precisão a mistura de trapalhada e heroísmo que definiu o Agente 86.

A Despedida de David Ketchum, o Agente 13

Já em 2025, o universo de Get Smart voltou às manchetes com a morte de David Ketchum, aos 97 anos. Ele interpretava o hilário Agente 13, sempre confinado em esconderijos improváveis — dentro de caixas de correio, hidrantes ou cabines telefônicas — e aparecendo para trocar informações com Maxwell Smart.

Ketchum foi muito mais do que ator: também escreveu roteiros para séries lendárias como M*A*S*H, MacGyver, Full House e The Love Boat. Sua longevidade artística impressiona tanto quanto sua idade. Deixou esposa, filhas, netos e um bisneto, além de um legado de humor e talento discreto, mas essencial.

Mel Brooks: Um Mestre que Ainda Vive

E se Adams e Ketchum já se foram, o criador Mel Brooks segue vivo — e inacreditavelmente ativo — aos 99 anos. Um dos raros artistas a conquistar o EGOT (Emmy, Grammy, Oscar e Tony), Brooks continua sendo celebrado como um mestre da comédia. Sua longevidade é quase tão extraordinária quanto seu talento. Ele, que idealizou um espião atrapalhado há seis décadas, ainda testemunha como sua criação resiste ao tempo.

Sessenta Anos Depois

Get Smart completando 60 anos em 2025 é mais do que uma efeméride: é prova de que a comédia, quando feita com inteligência e frescor, nunca envelhece. O Agente 86, sua inesquecível parceira Agente 99, o Chefe paciente e os vilões da KAOS ainda vivem no imaginário popular.

O telefone-sapato pode ter virado peça de museu, mas o riso que a série provocou permanece atual. Talvez porque, no fundo, todos nós tenhamos um pouco de Maxwell Smart: atrapalhados, insistentes, errando muito — mas, de alguma forma, sempre chegando lá.


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