Como publicado no Blog do Amaury Jr./Splash UOL
A 5ª temporada de Only Murders in the Building aposta nos clichês e clássicos da máfia italiana em Manhattan para decifrar o assassinato do porteiro Lester Coluca, encontrado morto na fonte do jardim interno do Arconia. Funcionário do prédio há mais de duas décadas, Lester era parte da rotina de Oliver, Charles e Mabel, mas ninguém suspeitava de seus vínculos com criminosos. E onde essa investigação improvável poderia levar o trio de podcasters-detetives? Claro: até a icônica mansão dos Corleone, eternizada na trilogia O Poderoso Chefão. Sim, a casa existe — e sua história real é tão fascinante quanto a ficção que a cercou.
Poucas casas do cinema carregam tanto peso simbólico quanto a residência dos Corleone em The Godfather. Localizada em 110 Longfellow Avenue, em Emerson Hill, no alto de Staten Island, Nova York, a mansão tornou-se uma das imagens mais reconhecíveis do filme de 1972 e, desde então, parte do imaginário cultural sobre poder, família e máfia ítalo-americana. Mas antes de se transformar no lar fictício de Don Vito Corleone, a propriedade já tinha sua própria história — e foi justamente esse acúmulo de prestígio, tradição e imponência que chamou a atenção da Paramount.

Construída em 1930 no estilo Tudor inglês, com fachada de tijolos e pedra, janelas de vidro trabalhado e telhado inclinado, a casa tem 6.248 pés² (cerca de 580 m²), cinco quartos e quatro banheiros, em um terreno de meio acre. Foi durante anos a residência de Joseph A. Palma, ítalo-americano que se tornou Presidente do Borough de Staten Island entre 1934 e 1945, e cuja escolha por viver em Emerson Hill dizia muito sobre o prestígio e a privacidade da região.
Quando Coppola e sua equipe começaram a procurar locações, o imóvel acabou ganhando ainda mais relevância por um detalhe curioso: quem teria levado os produtores até a casa foi Gianni Russo, o ator que interpretou Carlo Rizzi, genro de Don Vito na trama. Russo, que cresceu em Staten Island, conhecia bem a vizinhança e indicou a mansão aos responsáveis pelo filme. Assim, um elo direto entre elenco e locação ajudou a selar o destino da casa como cenário de um mito cultural.
O acordo de uso foi simples: a Paramount bateu à porta dos proprietários, explicou o projeto e ofereceu compensação financeira. Eles aceitaram, com a condição de que o interior não fosse filmado — e de fato todas as cenas internas foram gravadas em estúdio, no Filmways Studios, em Harlem. Mas para reforçar a imponência dos Corleone, a produção construiu cenários temporários: um muro de pedra, um portão de ferro e até uma guarita com guardas armados. Nada disso existia na realidade, mas foi incorporado pela memória coletiva.
Foi no jardim dessa mesma casa que aconteceram dois momentos icônicos da saga: primeiro, a grande festa de casamento de Connie, que abre O Poderoso Chefão e apresenta a família ao público; depois, no quintal que hoje abriga uma piscina, a morte de Don Vito, que sofre um infarto enquanto brincava com o neto. Em O Poderoso Chefão II, a residência volta a aparecer como a base de Clemenza em Nova York e, após sua morte, como propriedade herdada por Frankie Pentangeli.

A trajetória imobiliária do imóvel também chama atenção. Em 2012, foi vendido por US$ 1,687 milhão e passou por uma grande reforma — com cozinha atualizada, eletrodomésticos de ponta e um estilo mais contemporâneo. Apenas três meses depois, voltou ao mercado por US$ 2,25 milhões, mas o anúncio foi retirado rapidamente. Em 2014, reapareceu listado por US$ 2,895 milhões, para ser retirado novamente após quatro meses. Finalmente, em 2016, foi vendido por US$ 2,4 milhões. Estimativas apontavam, à época, valor de mercado em torno de US$ 1,5 milhão.
O destino mais inusitado veio em 2022: para celebrar os 50 anos de O Poderoso Chefão, a mansão foi disponibilizada no Airbnb, por 30 noites, a um preço simbólico de US$ 50 a diária. Fãs de todo o mundo puderam dormir na casa dos Corleone, ainda que o interior nada tivesse a ver com os sets construídos em estúdio. A aura cultural já era suficiente para transformar a experiência em um evento único.
Hoje, a mansão é lembrada tanto por sua beleza arquitetônica quanto por seu papel na história do cinema. Mais do que um lar, tornou-se um símbolo cultural: um espaço em que a realidade — a residência de um político ítalo-americano, depois reformada e comprada por diferentes famílias — se mistura com a ficção — a fortaleza impenetrável da família mafiosa mais famosa da cultura pop.

E agora, com Only Murders in the Building voltando suas lentes para a mansão dos Corleone, o mito se expande ainda mais. Uma casa que já pertenceu a um presidente do distrito, depois virou a fortaleza de Don Vito e Michael Corleone, agora ressurge como pista em uma comédia de mistério contemporânea. Realidade e ficção, passado e presente, se entrelaçam mais uma vez — provando que este lar em Staten Island permanecerá para sempre maior que a vida, tanto nas telas quanto fora delas.
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