Foi em 2016, diante do público da Balticon, em Baltimore, que George R.R. Martin quebrou um silêncio raro e deu um presente inesquecível aos leitores atentos. Além de ler um novo capítulo de The Winds of Winter, ele fez uma revelação que mudou para sempre o modo como enxergamos uma das personagens mais queridas de Game of Thrones: Brienne de Tarth é descendente de Ser Duncan the Tall.
Até aquele momento, era uma teoria quase mítica.
Os fãs mais atentos aos contos de Dunk and Egg e aos capítulos de A Feast for Crows já haviam percebido os ecos — a altura, a bondade, a ingenuidade honrada de quem acredita que o mundo pode ser justo.
Mas a confirmação da boca do próprio autor deu corpo àquilo que era, até então, uma hipótese poética: Brienne carrega o sangue e o espírito do último cavaleiro verdadeiro de Westeros.

Quem foi Ser Duncan, o Alto
Poucos nomes são tão reverenciados nas crônicas dos Sete Reinos quanto o de Ser Duncan the Tall.
Ele nasceu sem brasão, sem herança, sem nobreza. Era apenas Dunk — um garoto órfão das favelas de Porto Real, criado entre poeira e sonhos. Sua vida muda ao se tornar escudeiro de um cavaleiro errante e, depois da morte do mestre, ele assume a armadura e o nome, tornando-se um cavaleiro por convicção, não por título.
Dunk é o protagonista das novelas The Hedge Knight, The Sworn Sword e The Mystery Knight — histórias que Martin sempre tratou com enorme carinho.
O cavaleiro errante encontra um menino chamado Egg, um pequeno Targaryen disfarçado, e entre eles nasce uma das amizades mais comoventes do universo de A Song of Ice and Fire. Anos depois, Egg se tornaria o rei Aegon V Targaryen, e Dunk, seu mais fiel protetor — o Lord Comandante da Guarda Real.
A série A Knight of the Seven Kingdoms, que estreia em 18 de janeiro de 2026, adaptará justamente esses contos: o início de tudo, a pureza perdida de Westeros antes das guerras e o nascimento de uma amizade que termina tragicamente em fogo e lealdade.

O elo de sangue com Brienne
Em A Feast for Crows, Martin deixou pequenas migalhas que conduzem à revelação.
Brienne, descrita como “thick as a castle wall”, carrega a mesma frase usada para descrever Dunk nos contos.
O brasão encontrado em seu escudo — um campo azul com um sol dourado — remete à iconografia de Evenfall Hall, lar dos Tarth, mas também lembra a simplicidade dos brasões improvisados de Dunk em suas viagens.
E, claro, há a estatura: ambos são gigantes gentis, com força física descomunal e uma delicadeza moral que contrasta com o mundo cruel à sua volta.
Na Balticon, Martin tirou as dúvidas:
“Sim, Brienne descende de Ser Duncan the Tall — mas ela mesma não sabe disso.”
A frase encerrou anos de especulação e, de certo modo, reescreveu a própria dor de Brienne.
A mulher que sempre se viu como “Brienne, a Bela” — ironia cruel que a acompanhou desde a infância — ganhou um passado que dignifica cada traço que o mundo zombava.
Ela não é apenas uma exceção. Ela é herdeira de um legado.

A linhagem dos Tarth e o eco de Dunk
A Casa Tarth, leal aos Baratheon e governante da Ilha de Safira, sempre foi marcada pela honra e pela lealdade. Localizada nas Terras da Tempestade, região onde Dunk viveu boa parte de sua juventude como cavaleiro errante, é totalmente plausível que um de seus descendentes tenha se unido a uma das famílias locais.
O sangue de Dunk pode ter se misturado à linhagem dos Tarth há gerações, diluído no tempo, até ressurgir em Brienne — alta demais, bondosa demais, nobre demais para o mundo em que nasceu.
A beleza da revelação está nisso: não há glória, não há coroa, só a continuidade silenciosa da virtude.
Em Brienne, o idealismo de Dunk sobrevive.

As outras teorias — e o mito das quatro linhagens de Dunk
Com a confirmação de 2016, antigas discussões de fóruns e Reddit voltaram à tona.
Há quase uma década, fãs de A Song of Ice and Fire especulavam que Ser Duncan the Tall teria deixado mais descendentes espalhados por Westeros, e que até quatro personagens vivos nos livros carregariam seu sangue.
O raciocínio era lógico e irresistível: Dunk, antes de entrar para a Guarda Real e fazer voto de castidade, viveu anos como cavaleiro errante ao lado de Egg — viajando por todas as regiões dos Sete Reinos. Durante esse período, ele poderia ter tido filhos bastardos que se misturaram a linhagens menores e cujas características — altura, força e um tipo raro de ingenuidade honrada — continuaram surgindo aqui e ali, séculos depois.
Entre os nomes mais citados, além de Brienne, surgiram Hodor, os irmãos Clegane, Small Paul e Grenn, da Patrulha da Noite. A teoria sobre Hodor é especialmente popular: em uma visão de Bran, o garoto vê uma jovem mulher e um cavaleiro muito alto junto ao bosque de Winterfell — alguns acreditam que seriam Old Nan e Dunk, o que faria de Hodor um descendente distante.
Outros apostam nos Clegane como distorções brutais dessa herança física e moral: a força de Dunk corrompida pela violência. Há ainda quem veja traços do cavaleiro em Small Paul e Grenn, descritos como gentis e desajeitados, homens grandes demais para o mundo — ecoando a mesma bondade simples de Dunk.

Nada disso é confirmado, claro. Diria até que a série Game of Thrones descartou qualquer possibildiade. Mas faz parte do encanto de Westeros: mesmo as lendas deixam rastros suficientes para que os leitores possam seguir os passos do mito. E, entre todos esses ecos possíveis, Brienne permanece como a herdeira legítima, tanto por sangue quanto por essência.
Ela é o que restou da antiga cavalaria — a última portadora da fé na retidão num mundo em que a virtude virou deboche.
O fim de Dunk — e o início da lenda
O destino de Ser Duncan é uma das passagens mais trágicas e misteriosas da história de Westeros.
Sabemos apenas que ele morreu em Summerhall, ao lado de Rei Aegon V, em um terrível incêndio que ficou conhecido como a Tragédia de Summerhall.
O rei, obcecado por restaurar a glória dos Targaryen, tentou chocar ovos de dragão petrificados — talvez com magia, talvez com fogo, certamente com desespero. O castelo ardeu. Poucos sobreviveram.
Entre os mortos estavam:
- o próprio Aegon, o rei sonhador;
- o príncipe Duncan Targaryen, filho do rei, que abdicara do trono por amor à Jenny of Oldstones;
- e Ser Duncan the Tall, que, segundo as crônicas, morreu tentando salvar o rei e sua família das chamas.
George R.R. Martin já afirmou que Dunk “morreu como viveu: salvando pessoas.”
Não há descrição direta — apenas a lembrança de um cavaleiro que foi fiel até o fim, consumido pelo mesmo fogo que tentou conter.

Décadas depois, esse fogo simbólico acenderia outra cena inesquecível.
Na véspera da batalha contra o Rei da Noite, em Game of Thrones, foi justamente “Jenny of Oldstones” — a canção nascida da tragédia de Summerhall — que ecoou pelos salões de Winterfell.
Naquela mesma noite, diante de uma lareira acesa, Jaime Lannister fez de Brienne o Cavaleiro dos Sete Reinos.
O gesto uniu, em um único instante, todos os ecos do passado: o cavaleiro que morreu entre as chamas e a mulher que renasceu delas.
As cinzas e a canção
Entre as ruínas daquela noite nasceu Rhaegar Targaryen — o príncipe melancólico, músico e sonhador.
Dizia-se que Rhaegar passava horas em Summerhall em silêncio, tocando sua harpa, chorando pelos mortos que nunca conheceu.
Jenny, a mulher que perdeu tudo naquela tragédia, teria sobrevivido, e de sua dor nasceu uma das canções mais tristes de Westeros:
“High in the halls of the kings who are gone, Jenny would dance with her ghosts.”
E entre esses fantasmas, dançam também Dunk e Egg, o cavaleiro e o rei, o homem simples e o sonhador — unidos para sempre nas chamas daquilo que tentaram salvar.

A chama que Brienne carrega
Quando Brienne ajoelha-se para jurar lealdade, quando luta sozinha contra um mundo que zomba da honra, há um fantasma de Summerhall por trás de cada gesto.
Ela carrega o sangue, o semblante e o código moral de Ser Duncan the Tall, ainda que não saiba.
É como se o espírito daquele cavaleiro sem brasão, queimado junto com um rei em nome da lealdade, ainda vivesse nela — na mulher que, séculos depois, se tornaria a cavaleira mais verdadeira que Westeros já conheceu.
Dunk acreditava que o mundo poderia ser justo se cada homem fizesse o que era certo.
Brienne continua acreditando.

E é por isso que, mesmo entre dragões e traições, entre reis e profecias, é o nome de Duncan, o Alto que permanece — o cavaleiro que não buscou poder, mas deixou um legado de bondade, coragem e tragédia.
Ser Duncan the Tall não é apenas uma lembrança dos dias antigos de Westeros.
Ele é o coração moral da história.
E talvez, quando virmos A Knight of the Seven Kingdoms ganhar vida, vejamos o começo de tudo: o homem que sonhou com um mundo justo — e cuja chama, embora tenha morrido em Summerhall, nunca se apagou.
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