Entre os muitos nomes que orbitam o mito de Billy the Kid, nenhum é tão decisivo — e tão enigmático — quanto o de Jesse Evans (c. 1853 – desaparecido em 1882). Fora das telas, ele foi um pistoleiro sanguinário, chefe do Jesse Evans Gang – ou The Boys –, contratado para intimidar, roubar gado e eliminar rivais. Dentro da ficção, tornou-se o espelho moral do protagonista e o fantasma que molda o seu destino.

A história real de Jesse é digna de romance trágico. Nascido provavelmente no Missouri, ele chegou a frequentar o Washington and Lee College, mas a vida o empurrou para o crime cedo. Em 1871, foi preso com os pais por passar dinheiro falso no Kansas; libertado, migrou para o Novo México, onde virou cowboy nos ranchos de John Chisum e, logo depois, integrante da violenta John Kinney Gang. Em 1875, envolveu-se num tiroteio com soldados do Exército e saiu ferido e famoso — pelos motivos errados.
Com a saída de Kinney, formou o próprio bando. O Jesse Evans Gang reunia nomes que entrariam para a história: Frank Baker, Billy Morton, Tom Hill, entre outros. Durante anos, eles aterrorizaram a fronteira com roubos e emboscadas. O auge veio em 1878, quando foram contratados pelos comerciantes James Dolan e Lawrence Murphy para enfrentar os ingleses John Tunstall e Alex McSween na disputa econômica que ficou conhecida como a Guerra do Condado de Lincoln.

Foi Jesse quem liderou o ataque que matou Tunstall em 18 de fevereiro de 1878 — um crime que desencadeou a guerra civil do Novo México. Do outro lado estava Billy the Kid, então um jovem empregado de Tunstall. A vingança que Billy jurou após o assassinato o transformou no fora da lei mais famoso do país. Em cartas posteriores, Billy mencionou temer ser emboscado por Jesse, e há registros de que Evans comandou ataques contra os Regulators, inclusive o que matou Frank McNab.
Preso em 1879 após assassinar o advogado Huston Chapman, Jesse fugiu, foi recapturado e mandado para a penitenciária de Huntsville, Texas. Libertado em 1882, sumiu para sempre. Décadas depois, um homem chamado Joe Hines, na Flórida, afirmou ter participado da Guerra de Lincoln e deixou entender que Billy ainda estava vivo. Há quem diga que Hines era, na verdade, Jesse Evans, vivendo sob outro nome. Nunca se provou nada — o mito preferiu o mistério.

A reinvenção na série da MGM+
Na série Billy the Kid, Jesse Evans ganha contornos psicológicos e profundos. Interpretado por Daniel Webber, ele surge como o primeiro mentor e amigo de Billy, um homem de presença magnética e moral devastada. Webber — já reconhecido por papéis intensos em 11.22.63 e The Punisher — dá ao personagem uma humanidade corrompida, misto de afeto e ameaça.
A ficção reescreve a história para que o conflito entre os dois tenha peso emocional. O assassinato de Tunstall deixa de ser uma ordem dos patrões e passa a ser um ato de traição pessoal. Jesse mata por ego, não por mando. É o momento em que Billy perde a inocência. Na 2ª temporada, Jesse retorna como fantasma moral, lembrança e ferida que Billy não consegue enterrar.

Críticos como o Guardian chamaram o Jesse de Webber de “vilão shakespeariano”, enquanto o Collider destacou a sua presença como “a alma sombria da série”. Webber entende o personagem como tragédia — o homem que ensina, destrói e se apaga, deixando o herói condenado a carregar seu reflexo.
O que a série muda
Para além da estilização estética, a série da MGM+ altera fatos históricos para construir uma narrativa emocional:
- Mentor e irmão simbólico: Billy e Jesse nunca tiveram laços próximos na vida real; a série transforma essa convivência num elo afetivo.
- O assassinato de Tunstall: na história, Jesse agia sob ordens de Dolan e Murphy; na ficção, mata por impulso e ciúme.
- O roubo da lavanderia: atribuído a Jesse, era obra de Billy e Sombrero Jack (George Shaefer).

- A morte de Joe McCarty: a série mata o irmão de Billy cedo, embora Joe tenha vivido até 1930.
- Romances inventados: Dulcinea Del Tobosco substitui Paulita Maxwell, o amor real de Billy.
- Liderança dos Regulators: na ficção, Billy assume o comando; na história, os líderes foram Dick Brewer, Frank McNab e Doc Scurlock.
- Brady e Garrett: o roteiro encurta as sucessões de xerifes e transforma Garrett em figura política antes do tempo; na realidade, ele foi eleito em 1881.
- O batismo “Billy the Kid”: a série o atribui a Garrett; o apelido nasceu entre amigos e foi popularizado pela imprensa.

Essas mudanças servem a um propósito: colocar Jesse no centro da lenda. Ele não é mais só o pistoleiro contratado, mas o motor psicológico da história — o homem que mostra a Billy o que acontece quando se vive sem lei, sem código, sem alma.
Epílogo
Na história, Jesse Evans desaparece, a ver como será na série. Mas desfecho é o mesmo: sem Jesse, Billy não existiria.
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