Mad Monster Party? – A Festa Monstruosa Mais Encantadora do Halloween

Há muitos anos que pra mim festa de Halloween remete a um dos filmes mais impactantes que já vi, que passava raramente na TV e que povoou minha imaginação desde então. Até pet com nome de “Francesca” tive. Se você é 50+ pode ter captado a dica de que filme estou falando, um dos maiores clássicos da animação: The Mad Monster’s Party. E hoje, dia 31 de outubro, vou resgatar meu Bluray para matar as saudades.

Em 1967, Arthur Rankin Jr. e Jules Bass já tinham conquistado o Natal. Desde Rudolph the Red-Nosed Reindeer (1964), a dupla reinava absoluta nos especiais televisivos que definiam a estética e o espírito da época: inocência, brilho e esperança em stop-motion. Mas, depois de anos de sinos e neve, veio o suspiro criativo — e o desejo de trocar a luz pelo luar.

Procurando um novo desafio, Rankin e Bass decidiram olhar para o lado oposto do calendário. Queriam um feriado igualmente simbólico, mas mais sombrio e divertido: o Halloween. Como Jack Skellington faria décadas depois, eles quiseram inverter os papéis e trocar o “Ho-ho-ho” pelo “Boo!”. Assim nasceu Mad Monster Party?, uma das mais improváveis — e mais mágicas — obras da animação dos anos 1960.

A gênese de um projeto monstruosamente criativo

Rankin/Bass convocou sua equipe fiel e embarcou em uma última colaboração com o animador japonês Tadahito Mochinaga, no estúdio MOM Productions, em Tóquio. Foi ele quem aperfeiçoou o processo Animagic, a técnica de stop-motion artesanal que deu vida a cada frame. A parceria terminaria ali — antes da dupla migrar para outros estúdios japoneses como Toei e TCJ — mas o resultado seria uma das animações mais singulares de sua carreira.

Para o roteiro e design, eles buscaram sangue novo: o lendário Harvey Kurtzman, criador da Mad Magazine, e o cartunista Jack Davis, mestre em transformar o grotesco em adorável. O humor anárquico da Mad se misturava à doçura visual de Rudolph, resultando em algo que parecia impossível: um filme de monstros para rir, cantar e se apaixonar.

O título — com seu enigmático ponto de interrogação — já sugeria a ironia: uma festa, sim, mas louca. A Embassy Pictures ofereceu orçamento e distribuição para o cinema, permitindo que Rankin e Bass reunissem um elenco de vozes de luxo, liderado por Boris Karloff, Phyllis Diller e Gale Garnett.

A história: uma festa entre monstros, amores e desastres

No coração da trama, o Barão Boris von Frankenstein (voz de Karloff) alcança seu feito máximo: o segredo da destruição total. Decidido a se aposentar como líder da Organização Mundial dos Monstros, ele envia morcegos-mensageiros com convites para todos os grandes ícones do terror — Drácula, o Lobisomem, a Múmia, o Corcunda de Notre-Dame, o Homem-Invisível, o Criatura da Lagoa Negra, Dr. Jekyll e Mr. Hyde — para que viajem até sua ilha caribenha, a Isle of Evil.

Seu plano: anunciar o novo sucessor. O escolhido, porém, não é nenhum deles — mas seu sobrinho humano (ou assim parece), Felix Flanken, um farmacêutico asmático e atrapalhado. A notícia enfurece Francesca, a bela assistente ruiva do Barão, que sonhava com o cargo. Enquanto os monstros conspiram entre brigas, cantorias e jantares desastrosos, Francesca trama eliminar Felix com a ajuda de Drácula — mas acaba se apaixonando pelo “inocente” sobrinho.

No caos da festa, surge o temido “It”, uma paródia de King Kong que não havia sido convidado. Ele destrói a ilha num acesso de raiva, levando consigo os monstros e o próprio Barão. Felix e Francesca escapam de barco, mas o final revela o toque melancólico da Rankin/Bass: Francesca confessa ser uma androide criada por Frankenstein, e Felix, sem perceber, revela ser também uma invenção do tio.

“None of us are perfect”, ele diz — uma frase que ecoa como filosofia de toda a animação.

Bastidores, vozes e música

O elenco de Mad Monster Party? é um show à parte. Boris Karloff, eterno Monstro de Frankenstein, empresta gravidade e humor à despedida de seu próprio legado. É sua última contribuição ao mito que o eternizou. Phyllis Diller, caricaturada em boneco, brilha como a “Monster’s Mate”, soltando trocadilhos de duplo sentido com precisão cômica (“Lembra da última vez que você teve um olho que andava? Guardei num vidro por uma semana!”).

Mas o grande herói anônimo é Allen Swift, que dublou praticamente todos os outros personagens: Drácula, o Homem-Invisível, o Lobisomem caipira, Dr. Jekyll e Mr. Hyde, o Múmia, o Corcunda, o capitão do navio e até o mordomo Yetch — este uma imitação brilhante de Peter Lorre. Swift ainda fazia vozes paródicas de Jimmy Stewart, Sydney Greenstreet e Charles Laughton, num verdadeiro tour de force vocal.

A trilha sonora, composta por Maury Laws, inclui canções de Ethel Ennis, Gale Garnett e Phyllis Diller, com destaques para “Mad Monster Party”, “One Step Ahead” e “Never Was a Love Like Mine”. Curiosamente, o disco prometido nos créditos nunca foi lançado na época. O álbum só apareceu em 1998 (Percepto Records) e depois em vinil em 2016 (Waxworks Records), tornando-se item de colecionador.

Humor, camp e autopercepção

O charme de Mad Monster Party? está na sua consciência do próprio absurdo. Rankin e Bass não queriam assustar ninguém — queriam rir do medo. O filme transforma os monstros clássicos em celebridades de um baile psicodélico, com piadas que variam entre o infantil e o picante. Drácula solta trocadilhos do tipo “You’ve always been my type — O negative!”, enquanto o Barão ironiza um antigo convidado: “It was a crushing bore — crushing boars right in its hands!”

Essa mistura de Borscht Belt comedy, estética pop e humor autoconsciente cria o que hoje chamaríamos de meta-terror. O filme antecipa a ironia de What We Do in the Shadows e o espírito anárquico dos filmes de crossover e universos compartilhados — décadas antes da Marvel tentar o mesmo com monstros.

Recepção, restauração e legado cult

Lançado em 1967, o filme teve recepção morna, mas crítica curiosamente afetuosa. The New York Times escreveu: “This party should make everybody chuckle.”

Durante anos, sobreviveu em cópias ruins de 16 mm com cores desbotadas, exibido ocasionalmente na TV americana em noites de Halloween — sempre como raridade. Quando o negativo 35 mm foi redescoberto, a Rankin/Bass pôde restaurá-lo digitalmente, e o resultado foi o Blu-ray de 2012, depois relançado em 2023 pela Umbrella Entertainment, agora no formato original 1.85:1.

Essa redescoberta consolidou o status cult. Para muitos — eu incluída — o filme é uma memória mágica de um tempo em que o Halloween era televisivo, artesanal, ingênuo. Uma tradição secreta que sobreviveu em fitas VHS gastas e hoje ressurge com o brilho da restauração.

A festa que nunca acabou

Mad Monster Party? é mais que um filme: é uma cápsula de imaginação. É o elo entre o Natal colorido de Rudolph e o Halloween poético de The Nightmare Before Christmas.

É um lembrete de que monstros também cantam, dançam, se apaixonam — e que rir do escuro é um dos gestos mais humanos que existem.

Rever o filme hoje, em alta definição, é como reabrir um portal de infância. É sentir o mesmo fascínio que o stop-motion desperta: o movimento invisível das mãos que criam, quadro a quadro, uma eternidade.

O mundo mudou — mas aquele baile de monstros ainda acontece, toda vez que alguém aperta play. Feliz Halloween!


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