Freedom! ’90: O Impacto Cultural de uma Revolução Musical

O tempo voa. Nem parece que há fazem 35 anos que George Michael gritava o que todo artista em algum momento precisa dizer: Freedom! . Não era um grito irrelevante e certamente bem diferente da mesma liberdade que cantou quando ainda formava a dupla Wham!

Não, dessa vez o grito era dele, não mais o refrão alegre e adolescente, mas um desabafo adulto, melancólico e libertador. “Freedom! ’90” não é só uma canção, é uma carta de ruptura com o passado, com a fama, com a própria imagem. É a confissão de um homem que entendeu que o sucesso pode ser uma prisão dourada, e que para continuar vivo — de verdade — precisava destruir o reflexo que o público havia construído dele.

A primeira Freedom, lançada em 1984 pelo Wham!, era puro pop britânico: leve, dançante, solar. Era a trilha sonora da juventude, da energia sem culpa, da euforia colorida dos anos 1980. George Michael, ainda no auge da dupla com Andrew Ridgeley, escrevia sobre independência amorosa, mas cantava como quem ainda acreditava que liberdade era apenas poder escolher com quem dançar. Seis anos depois, em Freedom! ’90, o conceito de liberdade se tornaria outro — mais denso, mais dolorido, mais humano.

Quando a música saiu, George já era um dos maiores artistas do mundo, mas estava cansado de ser a vitrine. O videoclipe dirigido por David Fincher é uma das declarações mais poderosas da história do pop: ele simplesmente decide não aparecer. Em seu lugar, cinco das maiores supermodelos da época — Naomi Campbell, Linda Evangelista, Christy Turlington, Cindy Crawford e Tatjana Patitz — “cantam” por ele, como se representassem as muitas faces que o pop impõe a quem vive dele. É uma obra sobre identidade e sobre apagamento: George destrói seus próprios ícones — a jaqueta de couro, o toca-discos, o símbolo de Faith — para mostrar que a persona ficou para trás.

“Freedom! ’90” é mais do que um manifesto contra a indústria fonográfica, é um lamento íntimo travestido de hino. “I won’t let you down, I will not give you up… I just hope you understand, sometimes the clothes do not make the man.” Essa frase sozinha resume o dilema de quem se tornou prisioneiro da própria imagem. George Michael queria ser ouvido, não apenas visto. E sua recusa em aparecer foi, paradoxalmente, o gesto mais visível de sua carreira.

Comparada à “Freedom” do Wham!, a diferença é quase filosófica. Na juventude, a liberdade era conquista; na maturidade, é renúncia. A primeira era o som de alguém abrindo as asas; a segunda, o som de alguém despindo-se delas. E é exatamente por isso que “Freedom! ’90” continua tão viva: porque fala da coragem de dizer não, de recomeçar, de admitir que crescer é se desfazer.

Trinta e cinco anos depois, o impacto permanece. O clipe é referência na moda e no cinema — um retrato definitivo da virada dos anos 1980 para os 1990, quando o brilho deu lugar à introspecção. A música sobreviveu a tendências, a décadas, à própria ausência de George. É um lembrete de que a liberdade verdadeira raramente é barulhenta; às vezes, é o silêncio de quem decide desaparecer para continuar sendo quem é.

“Freedom! ’90” não envelheceu — amadureceu conosco. E ainda hoje, quando toca, sentimos o mesmo impulso que ele sentiu: o de romper as amarras e respirar, finalmente, como se fosse pela primeira vez.



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