Angela Diniz: Do Desejo ao Controle (recap episódios 4 e 5)

Angela Diniz: Assassinada e Condenada é uma série que já entrega seu desfecho no título e na estrutura narrativa: todos os episódios começam com flashes do vergonhoso julgamento de Doca Street antes de retornarem ao passado, reconstruindo o relacionamento com Ângela Diniz até desembocar em um dos feminicídios mais emblemáticos do país.

Para brasileiros acima dos 50 anos, faz sentido não perder muito tempo explicando quem é quem, quase evitando o que aconteceu antes do romance fatal da socialite com seu algoz. Mas, para leitores mais jovens — ou para o público estrangeiro (todas as séries hoje miram o exterior) — essa escolha narrativa me soa problemática. Estamos a apenas um episódio do final e sabemos que, mais do que assassinada, Ângela também foi considerada culpada. Isso diminui o engajamento com o romance e com a languidez crônica da personagem, que passa 90% do tempo de biquíni, bêbada, se esfregando em homens ou mulheres — e 100% do tempo com os braços levantados. Ela é a “pantera”, e leva o apelido ao pé da letra.

Ainda assim, estou comprometida. Vamos ao recap.

Episódio 4: Ponte Aérea

Depois de apresentar Doca e Ângela em festas da alta sociedade, o episódio mostra como o casal se apaixonou e viveu intensamente os últimos meses da vida dela.

Adelita Scarpa e Doca Street vão ao Rio visitar Ângela, que está morando com Ibrahim Sued. Ele e Ângela ainda não são amantes, mas a atração entre os dois é evidente, assim como os flertes discretos pelas costas dos parceiros.

Na boate, Ângela dança de forma sensual como sempre, flerta com homens e mulheres, enquanto Doca deixa claro que está pronto para ficar com ela. Aproveitando que os acompanhantes estão distraídos, os dois se encontram às escondidas nas escadas.

Na despedida, Doca diz a Ângela que está “na mão dela” e que, se ela der o sinal, ele “topa tudo”.

O advogado de Ângela explica que, na sociedade repressora de Minas — e do Brasil — uma mulher desquitada não pode se casar novamente, o que a impede de obter a guarda da filha. Ela precisa ser, ou ao menos parecer, “domada”. Desesperada, Ângela pede que Ibrahim se case com ela, mesmo que o casamento seja de fachada. Ele lembra que já abandonou mulher e filhos por ela, mas garante que casar é impossível.

Tomada pelo impulso, Ângela vai a São Paulo atrás de Doca. Se o que ele disse era verdade, ela o quer. E, para ele, isso é irresistível. Adelita chega em casa no momento em que os dois estão saindo e sentencia: ele pode ir, mas só com as roupas do corpo — tudo o que estava ali nunca foi dele. Para Ângela, isso basta, mesmo com o aviso explícito de que ele “não vale nada”.

Os dois iniciam um romance passional, feito de festas e jantares. Doca já começa a demonstrar que quer ficar com Ângela “no mato” ou em Búzios, mas sempre sozinhos. Não há mágoas entre Ângela e Ibrahim, e ele ainda a alerta de que Doca não é homem de “brincar de casinha”. Ela discorda.

Essa é, portanto, a versão apresentada pela série: Ângela gostava de Doca, do sexo e da companhia, mas estava com ele porque precisava encontrar um marido ou parceiro estável — e acreditava que poderia moldá-lo para esse papel.

Ela viaja com ele para Belo Horizonte, mas as tensões surgem rapidamente. Doca tem pouca paciência para as hipocrisias da sociedade mineira e não gosta de dividir Ângela nem com a própria filha. No clube, ao cruzar com um ex-namorado dela, ele arma um escândalo público que piora ainda mais a farsa do “companheiro estável”. A briga é tão feia e tão pública que gera sérias consequências: Ângela perde o direito de visita da filha e, ainda pior, a menina passa a não querer vê-la. Isso a destrói emocionalmente.

De volta ao Rio, o casal discute violentamente. Ângela pede um tempo. Doca não aceita — e parte para a agressão física. Ele sai de casa, e ela fica aterrorizada, abalada, sem saber o que fazer.

Episódio 5: Praia dos Ossos

O nome do episódio já causa frio na espinha de quem sabe que a praia em Búzios será o destino final de Ângela.

Após mais uma passagem pelo julgamento, ao som de músicas da época, vemos Ângela chorando na praia, braços erguidos. Depois da agressão ao voltar de Belo Horizonte, ela e Doca haviam se separado, mas ele se desculpa, promete mudar, diz que vai abandonar as drogas e afirma que a ama de verdade. Propõe uma viagem a Búzios. Ângela hesita… por segundos. Em seguida, aceita.

Segue-se mais um clipe embalado por trilhas dos anos 1970. Sexo. Paixão.

Ao chegarem em Búzios, tudo parece recomeço. Mais sexo. Logo fica claro, porém, que Doca quer “esconder” a namorada. Ele não quer que os dois bebam álcool. No jantar, o clima desanda quando ele pede que ela “tenha calma” e não banque a “louca”, para não prejudicar a guarda da filha. Ângela responde bebendo o resto do vinho direto do gargalo.

No dia seguinte, mesmo em uma praia quase vazia, Doca desiste de ficar na Praia dos Ossos porque há pessoas. Os dois vão para uma praia deserta, ficam nus. Mais sexo. À noite, quando ele se recusa novamente a sair para jantar, Ângela tenta ligar para a filha — qualquer coisa que a coloque entre pessoas. Doca passa a ficar colado nela.

A dor de estar afastada da filha a consome. Ela não está feliz. Doca pede que Ângela se case com ele. À noite, a socialite percebe que está praticamente trancada em casa. Quer ver gente, mas ele insiste que organizou tudo para que fiquem apenas os dois. O clima é claustrofóbico. Ao avistar uma conhecida, ela se atira ao mar. Doca se enfurece quando ela volta a beber, flertar e o deixar sozinho. O clima vai pesando, com Ângela aparentemente o “desafiando”. Logo, Doca retorna às drogas.

No meio de uma festa, Ângela conhece a turista alemã Gabrielle, por quem se interessa. Doca a arrasta à força para casa, bêbada. Diz que vai embora, mas antes dá um tapa no rosto dela. Ângela fica transtornada. E tudo se repete: ele volta arrependido, pede desculpas, e ela aceita.

Mas algo muda. Ângela ignora o café da manhã que ele prepara, demonstra frieza. Com as amigas, continua a mesma: festeira, divertida, de riso solto. Os planos de uma “lua de mel a dois” vão por água abaixo, e Doca se mostra abertamente irritado. Afunda-se na cocaína como consolo. O desequilíbrio dele é evidente. Ainda assim, Ângela permanece com ele.

Os dias se tornam insuportáveis para Doca, incomodado com a languidez dela. Para piorar, Gabrielle volta a aparecer. As brigas now acontecem na frente de todos. Quando ficam sozinhos, o embate é inevitável. Ângela tenta romper com Doca porque a violência escala. Ele diz que deixou “tudo por ela”. Ângela o humilha: Doca nunca teve nada, apenas trocou de mulher para continuar assinando cheques. E o expulsa de casa — é a cena que abre a série.

Por poucos segundos, ela respira aliviada. Em seguida, ele retorna. Armado. Ouvimos apenas os tiros. Quatro disparos.

O episódio final será inteiramente dedicado ao julgamento.

A série é bastante cuidadosa na reconstituição de época. Mesmo Búzios, hoje tão organizada, era então uma pequena cidade de veraneio de pescadores e ricos e famosos (descoberta por Brigitte Bardot nos anos 1960). A casa onde o crime aconteceu, na pacata Praia dos Ossos, é bastante fiel ao cenário real — ao contrário do filme Ângela.

Emílio Dantas e Marjorie Estiano não se parecem fisicamente com os personagens reais, o que não é um problema: ambos captam com precisão a alma dos dois, a agressividade e a rebeldia. Ainda assim, permanece a sensação de que algo falta.

A honestidade de mostrar Doca como ele era — um homem que usufruía dos bens de mulheres abastadas, possessivo, ciumento e usuário de drogas — é um acerto importante (lembrando que ele praticamente foi absolvido do assassinato da namorada). Mas o mistério de quem foi Ângela continua como um enigma. A sexualização excessiva da personagem me assusta por se aproximar perigosamente do mesmo machismo que a condenou. Ela era aberta em relação ao sexo — o que na época era chocante e hoje não é —, mas seus passos lânguidos em qualquer situação, a conversa permanente entre beijos e carícias, não me soam realistas.

No julgamento, nossos estômagos ainda serão revirados. Afinal, por causa de tudo isso, a Justiça considerou que o crime foi “defesa da honra”. Algo inaceitável. Sempre foi.


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