O Quebra-Nozes no Theatro Municipal: tradição, reinvenção e o olhar do diretor artístico Hélio Bejani

Como publicado no Blog do Amaury Jr./Splash UOL

Todo fim de ano, O Quebra-Nozes volta ao palco do Theatro Municipal do Rio como quem retorna a um lugar afetivo. Há ali algo de ritual: para o público, para os bailarinos, para a própria cidade. Criado no fim do século 19, o balé de Tchaikovsky atravessou gerações não apenas como um espetáculo natalino, mas como uma das principais portas de entrada para o universo da dança clássica. É o primeiro balé de muitas crianças, o reencontro anual de famílias com o Municipal e, também, um termômetro silencioso da saúde artística da companhia.

Na temporada de 2025, em cartaz até 28 de dezembro, esse retorno ganha um peso adicional. O Ballet do Theatro Municipal chega ao fim do ano após um período de reconstrução interna, amadurecimento técnico e retomada de identidade, um processo visível no palco e perceptível na resposta do público. À frente da montagem está Hélio Bejani, atual diretor do Ballet do Theatro Municipal do Rio de Janeiro e da Escola Estadual de Dança Maria Olenewa, além de diretor da pós-graduação em Dança Clássica do TMRJ, um nome profundamente ligado à história da casa.

Bejani conhece o Municipal por dentro. Ingressou no Corpo de Baile do Theatro Municipal do Rio de Janeiro em 1985, por concurso público, e construiu carreira como solista e bailarino principal. Acompanhou de perto as transformações da companhia, seus momentos de glória e de crise, foi premiado como melhor bailarino clássico no Concurso do Conselho Brasileiro da Dança e atuou como parceiro e coreógrafo de Ana Botafogo. Sua ascensão à direção não é apenas administrativa, mas simbólica: representa uma liderança nascida no palco, com escuta do elenco e consciência do que significa manter um repertório clássico vivo no século 21. Ao longo da carreira, coreografou e dirigiu espetáculos emblemáticos e remontou títulos fundamentais como Giselle, O Lago dos Cisnes, Dom Quixote, A Bela Adormecida, Coppélia e, claro, O Quebra-Nozes.

Numa conversa rápida em meio à correria de mais uma temporada bem-sucedida, Bejani fala sobre as escolhas da montagem atual do balé, o equilíbrio delicado entre tradição e renovação, o papel estratégico da obra dentro do Municipal e o momento vivido pela companhia em 2025, além de apontar os caminhos que começam a se desenhar para 2026.

MISCELANA: O Quebra-Nozes é um clássico que o público retorna para ver ano após ano. O que mudou nesta montagem — em termos de concepção, elenco ou leitura artística, em relação às anteriores? Houve algo que você sentiu necessidade de atualizar ou recalibrar em 2025?

BEJANI:   Nesta montagem de 2025, procuramos inovar enquanto honramos a tradição. As atualizações incluem uma leitura artística das coreografias, com um foco em aprofundar as emoções dos personagens, assim como o uso da iluminação para criar uma atmosfera envolvente e mágica. Os bailarinos com uma forte conexão emocional com a obra principalmente no 1º ato, trazendo vivacidade e frescor ao espetáculo. Sentimos que era essencial ajustar alguns elementos para se adequar ao contexto mais atual, mantendo a essência do clássico.

MISCELANA: Manter um balé clássico vivo é sempre um exercício delicado entre tradição e renovação. Como você equilibra a fidelidade ao repertório clássico com a necessidade de dialogar com o público de hoje, especialmente com novas gerações que talvez estejam vendo O Quebra-Nozes pela primeira vez?

BEJANI: O balanço entre tradição e contemporaneidade é fundamental em todos os aspectos.  Mostramos ao público que o balé clássico também pode dialogar com a modernidade e evoluir. Isso se reflete em algumas adaptações e interpretações de cenas e da história contada. Em vez de apenas recriar, queremos interpretá-lo de uma maneira que ressoe e converse com o público atual, criando uma ponte entre passado e presente.

MISCELANA: O Balé do Theatro Municipal viveu nos últimos anos um período de reconstrução artística e institucional. Como você avalia 2025 para a companhia, em termos de maturidade do elenco, resposta do público e identidade artística? Que tipo de ano foi esse internamente?

BEJANI: Em 2025, o Balé do Theatro Municipal mostra-se fortalecido e em um caminho contínuo de evolução. O amadurecimento do elenco tem sido notável, com bailarinos exibindo uma técnica precisa e um entendimento artístico profundo dos papéis. A resposta do público tem sido muito positiva, refletindo um renovado interesse pelo nosso repertório e nossa identidade artística. Internamente, o ano foi caracterizado por um forte compromisso com a excelência e colaboração, solidificando nossa posição no cenário da Dança.

MISCELANA: O Quebra-Nozes costuma funcionar como porta de entrada para o balé e como um ritual afetivo para muitas famílias. Você sente que essa obra tem hoje um papel estratégico dentro do Municipal, tanto na formação de público quanto na relação emocional da cidade com o teatro?

BEJANI:  O Quebra-Nozes desempenha um papel crucial não apenas como uma obra de ballet, mas também como um evento familiar que provoca nostalgia e cria memórias afetivas. Ele é um símbolo de celebração e união, e percebemos que muitas famílias aguardam ansiosamente esta produção ao longo do ano. A obra é, portanto, estratégica na formação de público e na construção de uma relação emocional entre a cidade e o nosso teatro, reafirmando a importância cultural do Municipal.

MISCELANA: Depois de um ano como 2025, o que podemos esperar de 2026 para o Balé do Theatro Municipal? Há um direcionamento artístico mais claro, novas ambições ou projetos que ajudem a consolidar esse momento de retomada?

BEJANI:  Para 2026, planejamos construir sobre os sucessos de 2025 com uma visão artística focada em novas narrativas e colaborações inovadoras. Estamos explorando projetos que expandem o repertório, trazendo obras contemporâneas que dialoguem com os clássicos. O objetivo é consolidar essa retomada e firmar ainda mais o ballet como uma arte acessível e relevante para todos os públicos.




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