Na primeira temporada de The Morning Show, que foi inspirada em fatos verídicos, o foco foi o movimento do #metoo e a mudança das mulheres em ambientes de trabalho, dando um fim ao ambiente masculino tóxico. Por outro lado, através de Mitch Kessler, a showrunner Kerry Ehrin mandou recados duros que refletiam os sentimentos de homens héteros pegos no meio de um momento comportamental que afeta várias gerações. Ao colocar o ator popular e doce como Steve Carell no papel do âncora cancelado trouxe o incômodo necessário para a história. Kerry, que tem 60 anos (é importante identificar a sua idade apenas para contextualizar sua narrativa) e vem de sucessos como The Bates Motel, é precisa em suas críticas e é justamente o que está nas entrelinhas, não necessariamente o que se vê à princípio da série, que faz de The Morning Show um conteúdo diferente. E importante.
Personagens complexos, e uma mensagem incômoda para todos
Os bastidores de um jornal matutino é um ótimo cenário para contar a história. São jornalistas, em tese treinados para questionar e revelar as informações que precisamos para formarmos opinião, mas, ao mesmo tempo, são indivíduos competitivos, perdidos, problemáticos e pegos na onda que inverteu tudo.
O feminismo versão millenial, vai soar duro, é efetivamente agressivo, importante e, de novo a palavra, complexo. A cobrança pelo imediatismo, pela transparência e pela polarização já seria difícil para mulheres que se viram oprimidas em um jogo – na época – difícil de inverter, porém com as possibilidades atuais, a cobrança retroativa gera angústia nas gerações anteriores, representadas pela personagem de Jennifer Aniston, Alex Levy. Jennifer, que ganhou o SAG como melhor atriz pela série, aceitou o desafio de uma personagem frequentemente antipática, às vezes duvidosa, e está muito bem.
Já Reese Witherspoon, com Bradley Jackson, volta às personagens ansiosas e irritadas, que têm razão em suas lutas, mas poucos aliados devido à sua personalidade. Bradley e Alex sempre foram colocadas para competir, mesmo com elas se esforçando a manter sororidade, porém estão em uma posição onde o gênero não se aplica, que é a luta pela liderança e poder no programa que conduzem.
A segunda temporada começa com Alex tendo abandonado tudo, usado o movimento de exposição dos abusos sexuais da emissora ao seu favor, e Bradley, fisicamente ajustada à sua posição de estrela (mudou o cabelo, agora tem uma equipe que trabalha para ela, etc), luta – sem saber – contra uma rejeição na audiência.
São tantos os assuntos que Kerry Ehrin traz à tona em um único episódio, criticando todos os lados, que demanda tempo para respirar e vários posts. E teremos. O que fica no momento é a recomendação de assistir The Morning Show com coração aberto. Fala de perdão, de “falso” perdão, de ambição, de arrogância, de empatia, de evolução, de feminismo, de falsidade e de, sim, esperança. Só que não nessa ordem ou nessa clareza. Resisti a gostar da série, mas ela é reflexiva e vale acompanhar.