A série A Small Light está na plataforma da Star Plus há alguns meses, mas praticamente escondida e discreta como sua história, não fosse ela de gigantesca importância. Muitas gerações foram impactadas pelo Diário de Anne Frank, um dos relatos mais humanos e importantes sobre intolerância, medo, esperança e angústia, registrado na primeira pessoa de uma menina de apenas 13 anos.

Anne foi forçada a viver escondida em um lugar confinado com sua família e outras quatro pessoas para fugir do Nazismo e seu único alento era poder escrever em seu diário, que sobreviveu à Guerra enquanto sua autora não. Quem nunca o leu, ou viu os filmes, séries e peças adaptando o relato tem que resolver isso imediatamente. Embora ela jamais tenha sonhado com essa invasão de privacidade, a decisão de seu pai, Otto, o único sobrevivente das oito pessoas confinadas, de publicá-lo após o fim da Segunda Guerra Mundial é heróica pois sem filtro, Anne nos reporta os medos e conflitos de inocentes perseguidos e mortos pelo nazismo. Mas A Small Light é outra história, uma paralela, que jamais tinha sido contada e é igualmente emocionante. É o relato das pessoas que ajudaram aos Franks e outros perseguidos a se esconderem, colocando suas próprias vidas em risco. É, em particular, a história de Miep Gies, uma jovem que trabalhava com Otto e que, com seu marido, Jan, foi essencial e humanitária na resistência.
A série de oito episódios foi criada por Tony Phelan e Joan Rater e não apenas muda o foco da história que conhecemos de Anne, e o que a menina escreveu em seu diário, como reflete como eram os duros tempos de guerra para os que não aderiram à norma de Hitler. A série da Netflix Anne Frank, Minha Melhor Amiga , que conta a história de Hanneli Goslar, a melhor amiga de Anne e possivelmente uma das últimas a vê-la viva, é igualmente comovente, mas o relato dos fatos por Miep é mais próximo e mais longo.
Miep (Bel Powley) era também uma imigrante na Holanda, tendo nascido na Áustria, e vivendo com sua família adotiva, que se preocupa com a jovem porque parece estar sem rumo. Eles dão o ultimato de escolher entre o casamento ou arrumar um trabalho, e como a opção de casar seria se unir a um dos irmãos adotivos, ela tenta conseguir trabalho na Opekta, uma empresa alemã de especiarias, gerenciada por Otto Frank (Lieb Schreiber).
Embora venha a se casar com Jan (Joe Cole), para poder permanecer na Holanda mesmo depois de se recusar a entrar para o partido nazista, Miep se apega à Otto, que se transforma em uma figura paterna, assim como sua família, Edith (Amira Casar), Margot (Ashley Brooke) e Anne (Billie Boullet). A pressão aumenta quando os nazistas chegam à Holanda e os Franks não conseguem obter um visto para ir para os Estados Unidos, forçando a encontrar outra alternativa. Otto pede ajuda a Miep para escondê-los, o que aceita sem pestanejar, apesar do risco.

A grande sacada de A Small Light, que usou a biografia de Miep como base, é recontar uma história tão conhecida por outra ótica, uma que compartilha o cotidiano opressivo da Guerra, das dificuldades, das lutas e das pessoas ‘comuns’ que tentaram ajudar. É emocionante que vemos pouco os Franks, os ouvimos abafados, ao fundo, o que aumenta a dor no coração e a claustrofobia de onde viveram por mais de dois anos (o local hoje é um Museu e um dos mais impactantes que já visitei).
Com grandes interpretações de todo elenco, só posso recomendar muito ver a série. As perguntas que não têm resposta como a quem traiu os Franks, permanecem assim, o que aumenta a dor da conclusão da história. É angustiante, ainda mais porque Anne, sua irmã, sua mãe e os outros escondidos não sobreviveram por pouco. Eles foram descobertos em agosto de 1944, quando os aliados já avançavam contra os nazistas, e foram enviados no último trem para o campo de concentração e extermínio de Auschwitz-Birkenau. , em 3 de setembro de 1944. Dois meses depois, os Franks foram separados, quando Anne e Margot Frank foram enviadas para Bergen-Belsen, onde em três meses morreram de tifo maculoso, apenas a um mês do campo ser libertado pelos britânicos. Apenas Otto sobreviveu.

A série ressalta o que Miep Gies sempre destacou: ela nunca se viu como extraordinária, mas ela mesma era uma sobrevivente. Nascida em uma família católica em Viena, foi enviada para a Holanda ainda pequena porque a sua própria família não tinha condições de alimentá-la. Ela era estrangeira, testemunha das durezas de seu tempo e humanitária.
O detalhe que A Small Light não deixa passar, mesmo sutilmente, é que não teríamos o diário de Anne Frank não fosse pela iniciativa de Miep. Pensando em devolver à autora quando ela voltasse (Miep nunca perdeu a esperança), a secretária jamais leu o que Anne dizia até muitos anos depois da publicação do livro, algo que em sua própria biografia diz ter sido providencial. Se tivesse lido, teria queimado o documento pois Anne falava nominalmente de todos que ajudavam aos Franks, o que na época, seria uma sentença de morte. Mesmo com uma história e dedicações incríveis, Miep se manteve honestamente humilde. O nome da série vem de sua convicção pessoal de que não havia heroísmo na resistência. “Mesmo uma secretária comum, uma dona de casa ou uma adolescente pode, com seus próprios meios, acender uma pequena luz em um quarto escuro”, escreveu ela. Uma centelha de esperança e exemplo para todos nós. Sempre.
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