Rock In Rio 2024: A Despedida de Cyndi Lauper

Estou chocada com o fato de que as pessoas consideraram o show de Cyndi Lauper “grande” pela razão de que ela – claramente sem voz – não usou playback. Onde chegamos?

Não há maior fã de Cyndi Lauper que eu. Desde que a vi e a ouvi, há 40 anos, fiquei apaixonada e fiel (fiel mesmo, nunca deixei de ouvir, comprar seus álbuns ou ir aos seus shows) sem pestanejar. Cyndi explodiu ao mesmo tempo que Madonna e as duas nunca cruzaram, pessoalmente ou musicalmente, com a material girl a superando em fama e alcance. Enquanto Madonna era lenda, Cyndi seguiu grande, mas paradoxalmente pequena, em comparação.

Eu que amo Madonna, digo a mesma coisa há 4 décadas: Cyndi é mais música, mais intérprete e mais autêntica. Madonna tem um papel ímpar na cultura pop, ninguém tira a coroa dela de Rainha, podem tentar, mas não conseguem. No entanto, foi Madonna que trouxe para os palcos o playback, algo inconcebível para alguém que quisesse viver de música. Cyndi não, rendia muito mais ao vivo, os estúdios limitavam sua voz única e impressionante. As duas sempre foram opostas em tudo, unidas apenas pela dedicação e abraço à comunidade LGBTQI+.

Em 2024, as duas divas, acima dos 65, voltaram aos palcos brasileiros, em especial, cariocas. De novo em comparações vívidas. Ambas estão notavelmente mais velhas e sem voz para performances ao vivo, não que fique tão claro com Madonna como fica com Cyndi, por razões óbvias.

Madonna cantou para milhões de pessoas em Copacabana, batendo recordes e fazendo história. Cyndi foi uma atração de um festival e estava diante de cerca de 100 mil pessoas. E amo Madonna, mas Cyndi foi gigante. Eu, que a vi mais de uma vez no auge e sei o pulmão que sustentava notas altas por tempos que apenas cantores líricos tem ousadia de tentar, fiquei triste de vê-la sussurrando, sem conseguir emitir notas altas ou baixas, mas mantendo seu profissionalismo e amor para desfilar uma lista de grandes sucessos pela última vez no palco. Me emocionei a cada uma, cantei todas e queria mais. Cyndi Lauper vai fazer falta.

Katy Perry a levou para repetir Time After Time em um dos mais icônicos momentos dessa temporada do Rock In Rio, e, mesmo derrapando ao quase chamar Cyndi de velha. “Quero ser como você quando…”, ela parou quando percebeu a gafe. “Quando crescer?”, brincou Cyndi. “Só quero ser você”, desviou Katy.

Katy está certa: as jovens devem almejar ser mais Cyndi do que Madonna. Madonna compensava a “falta” vocal com seu talento de dançarina, por isso seus shows eram meio Broadway, com até 50 bailarinos no palco. Michael Jackson já tinha feito isso antes, para ser justa, que era recriar seus vídeos ao vivo. Mas ele cantava e quando não, deixava para os backing vocals. Hoje, todas cantoras precisam dançar mesmo que não saibam, precisam ocupar o palco. Será mesmo o caso?

Cyndi Lauper é baixa, é tímida e NUNCA fez coreografia nos vídeos ou em apresentações. Dançava do seu jeito particular que honestamente a deixava gigante. Mais ainda porque, sem backing vocals, ela cantava sem apoio de pré-gravação. Isso jamais poderia ser motivo de manchetes de jornais ou elogios. Mas hoje é.

Cyndi Lauper não foi maravilhosa no Rock In Rio, desculpem. Sua despedida dos palcos veio depois de que sua voz já foi embora. Dessa vez, sem volta. O show dela foi emocionante e excelente dentro da limitação física. Eu senti falta da Cyndi de apenas 5 anos atrás, que ainda estava como a que me encantou em 1984. Ainda assim, dito tudo isso, a considero o grande destaque do festival. Cyndi é corajosa e isso não mudou ao longo de quatro décadas. Sem plástica, sem apoio técnico, é alma pura. É uma lenda.


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