Não sou fã de folhetins nem de dramas absolutamente irreais — e, por isso mesmo, Ginny & Georgia, um mega sucesso da Netflix, sempre pareceu algo que eu manteria a quilômetros de distância. No entanto, a série chega à terceira temporada mantendo o vício que provoca em quem assiste: reviravoltas inacreditáveis, revelações dramáticas e uma trama que, embora disfarçada de comédia adolescente, tem um subtexto sombrio e cruel.
A premissa continua girando em torno da sobrevivente nata Georgia, interpretada com carisma e talento indiscutíveis por Brianne Howey. Ela é uma mulher que fará de tudo — absolutamente tudo — para proteger seus filhos, Ginny (Antonia Gentry) e Austin (Diesel La Torraca), cada um com um pai diferente e com personalidades igualmente complexas. Ginny, uma adolescente que à primeira vista poderia ser “típica”, revela camadas densas de sofrimento e distúrbios de saúde mental — inclusive automutilação, um dos aspectos mais fortes e dolorosos da trama.

Mas é impossível ignorar que Ginny também herda os impulsos destrutivos da mãe. Por mais que tente se colocar como vítima, ela mesma se envolve em mentiras, chantagens e atitudes moralmente ambíguas. Se dependesse dela eu provavelmente não acompanharia a série.
Georgia, por sua vez, não é apenas uma mãe protetora — é uma ladra, golpista e, sim, uma assassina. Mas uma que sabe manipular, seduzir, escapar e ainda se beneficiar disso tudo. Ela é o tipo de personagem que provoca repulsa e fascínio em igual medida.
A terceira temporada mergulha mais fundo nessa ambiguidade. As atrizes já haviam avisado que o novo ano seria ainda mais dramático, e não estavam exagerando. Com o casamento de Georgia com o prefeito Paul sendo interrompido de forma abrupta — e trágica — e a prisão da protagonista logo depois, a série abraça de vez o melodrama criminal. A tentativa de manter a aparência de normalidade enquanto os esqueletos se acumulam no armário não se sustenta mais.

Os episódios se dividem entre os efeitos da prisão de Georgia, a reação da comunidade (que inclui desde hipocrisia até solidariedade) e o desmoronamento emocional de Ginny, que tenta pela primeira vez romper verdadeiramente com o legado sombrio da mãe. Há ainda novas ameaças do passado, incluindo personagens que sabem demais — e não têm medo de confrontá-la.
Por mais que o roteiro às vezes escorregue no excesso — há cenas que flertam com a paródia involuntária — a verdade é que Ginny & Georgia nunca foi uma série sobre realismo. É sobre aparência versus essência, sobre sobrevivência feminina num mundo que cobra demais de mulheres que ousam tomar as rédeas da própria vida. E nesse ponto, continua extremamente eficaz. Além disso, aborda com surpreendente transparência e acolhimento temas de saúde mental muito fortes e presentes nas vidas dos adolescentes. É algo que conecta e gera discussões importantes, mais do que a vida atribulada (criminosa e quase psicótica) de Georgia.
Com mortes inesperadas, revelações incômodas e uma reviravolta final que promete transformar completamente a dinâmica entre mãe e filha, a terceira temporada é provavelmente a mais pesada até agora. E já deixa o terreno preparado para um quarto ano — porque, como Georgia, essa série sempre tem mais um truque escondido.
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