A História Real Por Trás Tubarão e o Pânico Coletivo

Antes de chegar às telas dos cinemas e virar um fenômeno, em 1975, Tubarão foi um livro e – antes disso – um pesadelo bem real. Isso mesmo, para escrever Jaws (que foi publicado em 1974), Peter Benchley, buscou inspiração em DUAS histórias muito reais e as transformou em um conto que teria ficado esquecido nas páginas, não fosse o brilhantismo de Steven Spielberg.

Jaws, o livro, conta a história de um enorme tubarão-branco que ataca banhistas em uma fictícia cidade costeira chamada Amity, levando o chefe de polícia local, um ictiólogo e um caçador de tubarões a unirem forças para matá-lo.

A verdade foi bem mais trágica. Embora o gatilho principal para o livro tenha sido o episódio real ocorrido em 1964, quando um pescador capturou um enorme tubarão-branco de mais de 2 toneladas ao largo de Montauk, em Nova York, foi uma série de ataques de tubarão de 1916 em Nova Jersey, nos Estados Unidos, que é mais apavorante. Benchley juntou as duas histórias para criar Jaws, nós vamos no caminho oposto.

Os ataques em Nova Jersey de 1916: o verão do medo

Entre os dias 1º e 12 de julho de 1916, uma sequência de ataques de tubarão assolou a costa de Nova Jersey, nos Estados Unidos. Ao todo, cinco pessoas foram atacadas, e quatro morreram — um número extremamente elevado para eventos desse tipo, que eram considerados extremamente raros, quase impossíveis, em águas americanas na época. O caso causou pânico generalizado, sendo amplamente noticiado na imprensa.

A primeira vítima foi Charles Vansant, 25 anos, foi morto por um tubarão enquanto nadava próximo à praia em Beach Haven. Dias depois, Charles Bruder, 27 anos, foi atacado enquanto nadava en Spring Lake e teve as pernas arrancadas. Morreu no resgate.

Na semana seguinte, três vítimas sofreram ataques no mesmo dia quando nadavam em Matawan Creek, um rio de água salobra a cerca de 18 km do oceano, em um local onde jamais se imaginava encontrar tubarões, mas Lester Stillwell, de apenas 11 anos, foi morto; Stanley Fisher, 24 anos, tentou salvar Lester e foi fatalmente ferido e Joseph Dunn, 14 anos, foi atacado pouco depois, mas sobreviveu com ferimentos.

Imaginem a comoção? Hoje seria um pânico generalizado, há 109 anos era ainda pior. As autoridades fecharam praias, patrulhas armadas foram organizadas e a “caça ao tubarão” se tornou obsessão nacional.

Cientistas ficaram perplexos com a ideia de um tubarão nadar rio adentro e muitos acreditam que o culpado foi um tubarão-branco ou um tubarão-touro, este último conhecido por entrar em rios e águas salobras.

O caso foi um dos primeiros a causar pânico coletivo sobre tubarões nos EUA, ajudando a consolidar o medo que Benchley exploraria em Jaws.

Frank Mundus e o tubarão de 1964: o caçador que virou lenda

Embora essa história de 1916 pareça ser o suficiente para inspirar filmes e livros, em 1964 – 10 anos antes do livro – foi o pescador Frank Mundus que ganhou manchetes mundiais ao caputurar um turabrão-branco gigante.

Mundus pescava em Montauk, Long Island (Nova York) e seu tubarão-branco gigante pesava aproximadamente 2 toneladas. O animal foi pescado com arpões e guincho, e sua carcaça foi levada à praia para exibição. A imagem do predador colossal, pendurado como troféu, foi amplamente divulgada na imprensa e marcou profundamente o imaginário popular.

O que ajudou foi o fato de que Frank Mundus era um pescador carismático e excêntrico, conhecido por suas roupas extravagantes e por promover “safáris de tubarão”. Ele costumava levar turistas e curiosos para caçar grandes tubarões, muito antes da conscientização ambiental moderna.

Peter Benchley, um jornalista e escritor para revistas como a National Geographic e a Newsweek, e sempre manteve um interesse pessoal pela vida marinha e ficou fascinado com Mundus. Ele se inspirou na história da pesca do tubarão gigante para imaginar o que aconteceria se um animal desses se tornasse uma ameaça constante a uma comunidade litorânea, como já tinha acontecido em 1916. E usou Mundus como a inspiração direta para o personagem Quint, o caçador durão e fanfarrão do filme Jaws.

Curiosamente, anos depois, Mundus também se tornaria defensor da preservação dos tubarões, reconhecendo que muitos dos seus feitos ajudaram a alimentar uma imagem negativa desses animais.

Mudanças no filme

Embora o filme dirigido por Steven Spielberg mantenha a estrutura central do livro, há algumas diferenças importantes. O livro, por exemplo, contém subtramas envolvendo adultério (a esposa do chefe Brody tem um caso com o oceanógrafo Matt Hooper) e tensões políticas mais acentuadas sobre o fechamento das praias. Spielberg optou por eliminar ou suavizar esses elementos para manter o foco no suspense e na ação, o que acabou contribuindo para o sucesso universal do filme.

Curiosamente, Peter Benchley, assim como Mundus, depois se arrependeria da forma como retratou os tubarões no livro, ajudando a alimentar uma imagem monstruosa e imprecisa do animal. Ele se tornaria, nos anos seguintes, um defensor da conservação marinha e porta-voz da proteção aos tubarões, chegando a dizer que não teria escrito o livro se soubesse mais sobre o comportamento real da espécie.

Assim, Jaws nasceu da fusão entre eventos reais, mitos do oceano, medos coletivos e uma dose de imaginação jornalística. O resultado foi uma obra de ficção que mudou para sempre a relação do público com o mar — e que, ao ser adaptada por Spielberg, inaugurou a era dos blockbusters no cinema. Eu diria que os ataques de 1916 poderiam voltar ao imaginário coletivo… não?


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