A quarta temporada de The Bear: brilhante, mas…

Serei contraditória, sim — e talvez até injusta — ao falar da quarta temporada de The Bear. Porque ela é excelente. Mas também é, em muitos momentos, pretensiosa. Ao escolher desacelerar, tirar o ritmo frenético narrativo e suavizar a toxicidade que fervia nas panelas e nas vidas dos Berzattos, a série sacrifica algo fundamental: sua maior e incontestável estrela, Jeremy Allen White. Carmy, o chef genial e emocionalmente instável que nos arrebatou desde o piloto, tem sua presença sensivelmente reduzida. A decisão parece clara: dar a temporada para Sydney Adamu (Ayo Edebiri). E aqui está o problema — ou, pelo menos, o meu.

Sydney nunca me convenceu. Sei que estou sozinha nessa, já que a personagem é celebrada, premiada, elogiada. Mas sempre me irritou. Não se trata da atuação, que é impecável, ou da construção dramática, que nesta temporada é cuidadosa e comovente. O incômodo está em como a série insiste em torná-la o coração emocional do restaurante, quando a pulsação, para mim, sempre foi Carmy.

A temporada começa com um tom melancólico e quase contemplativo. O restaurante acaba de receber uma crítica morna — ou, no mundo de Carmy, uma tragédia em forma de palavras. O chef obsessivo e perfeccionista agora precisa lidar com o fracasso de sua tentativa de se superar sem se repetir. E também com os escombros emocionais deixados para trás: os colegas afastados, a família desestruturada, o romance perdido. Depois de levar todos à beira da loucura, ele agora tenta pedir desculpas e mudar genuinamente. Mas será tarde demais?

Enquanto isso, Sydney, pressionada por decisões que ela mesma posterga, ensaia ir embora. Sente-se pouco valorizada — justo agora que Carmy finalmente começa a escutá-la. Ela sofre, hesita, fica. Já Claire, o amor doce e idealizado de Carmy, não está tão disposta a reembarcar no trem do dramalhão emocional. (Pelo menos a princípio)

A temporada abre com o episódio em que Carmy acorda assistindo a Feitiço do Tempo (Groundhog Day) e não apenas é um dos mais simbólicos da temporada, vai pontuá-la do início ao fim. O filme, sobre um homem preso no mesmo dia até conseguir mudar profundamente seu comportamento, ecoa o próprio estado de espírito do protagonista. Ele está travado — na culpa, no medo, na obsessão. E, para piorar, o restaurante Bear precisa dar lucro em dois meses. Caso contrário, fecha. Paradoxalmente, é nesse cenário de pressão que a cozinha encontra alguma paz. Ao estilo Urso, claro: desorganizado, afetivo, explosivo, mas funcional.

A temporada está repleta de participações especiais, algumas desnecessárias, outras brilhantes. Mas o maior risco de The Bear agora é virar fórmula. Cenas clipadas como videoclipes, diálogos intensos em corredores apertados, closes de comida como metáforas de vida. A série ainda é linda, angustiante, sofisticada. Mas começa a seguir uma receita — e isso, para uma série que tanto criticava a previsibilidade, é um alerta.

Ainda assim, é impossível não se emocionar. The Bear continua sendo uma das experiências mais visceralmente humanas da TV recente. Os silêncios dizem tanto quanto os gritos. O elenco está no auge — e mesmo que Jeremy Allen White tenha tido menos espaço, sua presença ainda reverbera em cada prato, cada decisão, cada gesto. E quando volta a ter momentos para monólogos, lágrimas e reflexão, ele voa.

Essa é uma análise sem entrar em detalhes da trama, mas com um spoiler inevitável da conclusão. Com o cronômetro, as metáforas de tempo e citações de filmes, livros ou poesias, a sugestão de que o hábito de Carmy de abandonar projetos e ir embora é sua forma de brigar com sua carga genética bipolar é simplista e contraditória. A família Berzatto é “doida”, para ser mais direta, mas a um grau que – como Sidney admite – absorve quem entra em sua esfera e destroi também. A decisão de Carmy que o restaurante ficará melhor sem ele é para ser altruísta, mas é mais um exemplo de seu narcisismo e depressão ao ser um chef genial, mas incapaz de ganhar sua estrela enquanto os que estão ao seu redor começam a ter reconhecimento. E fica um drama que eu, honestamente, cansei.

Assim, a próxima temporada será com Sydney lidando com o protagonismo e Carmy, distante, apenas uma sombra. Contraditória? Sim. Mas com amor. Porque The Bear, mesmo em sua temporada mais irregular, ainda cozinha com alma. E sem nos fazer rir, tem atuações espetaculares. Só está começando a faltar sal.


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