Nikolaj Coster-Waldau: Entre Jaime Lannister e William, o Conquistador

Poucos atores conseguem construir uma carreira marcada por personagens tão ambíguos e magnéticos quanto Nikolaj Coster-Waldau. O dinamarquês, nascido em 1970, alcançou a fama mundial ao interpretar Jaime Lannister em Game of Thrones, um papel que transitava entre o repulsivo e o admirável, o criminoso e o heróico. Agora, em 2025, ele retorna ao épico histórico na pele de William, o Conquistador, no drama da BBC King and Conqueror. A comparação entre os dois personagens é inevitável — não apenas pelo figurino de armadura e espada, mas pelas contradições humanas que ambos carregam.

O Ator e sua Trajetória

Coster-Waldau iniciou a carreira no teatro dinamarquês, estreando em 1992 no Betty Nansen Theatre, em Hamlet. E de cara se revelou um ator capaz de unir presença física e sutileza dramática, chegando à Hollywood depois de aparecer em dois filmes de Ridley Scott: Black Hawk Down (2001) e Kingdom of Heaven (2005), produções que abriram caminho para trabalhos maiores, até que Game of Thrones o transformou em um nome global.

Após oito temporadas na pele de Jaime Lannister, Coster-Waldau buscou diversificar: estrelou a comédia Mulheres ao Ataque (the Other Woman) e em 2022, Against the Ice, filme de sobrevivência que também co-escreveu e produziu. Recentemente embarcou em projetos de documentário, como An Optimist’s Guide to the Planet, no qual viaja o mundo explorando soluções para crises ambientais. Essa postura multifacetada revela um ator consciente de sua imagem, mas também interessado em usar sua visibilidade para além da ficção.

Jaime Lannister: O Vilão Humanizado

Na mitologia de Game of Thrones, Jaime Lannister surge como vilão: o cavaleiro arrogante, amante incestuoso da própria irmã, responsável por empurrar Bran Stark da torre. Mas, ao longo da série, Coster-Waldau o transforma em uma das figuras mais complexas de Westeros. O “Cavaleiro Assassino” era também um homem preso a deveres, amores e tragédias pessoais. Sua redenção parcial nunca o tornou “herói” de fato, mas revelou que até os piores pecados convivem com gestos de honra e lealdade.

Esse arco foi moldado, em grande parte, pelo olhar do ator. Coster-Waldau sempre declarou que via em Jaime não um vilão clássico, mas um homem em conflito, capaz de ser cruel e vulnerável na mesma medida.

William, o Conquistador: Ambição e Contradição

No novo épico da BBC, Coster-Waldau dá vida a William, duque da Normandia, que em 1066 invadiu a Inglaterra e mudou para sempre o curso da história europeia. O William da série King and Conqueror não é o mito inabalável das crônicas normandas, mas um homem cheio de contradições: altivo e impetuoso, mas também vulnerável, dependente da força de sua esposa, Matilda (vivida por Clémence Poésy).

Tal como Jaime, William é retratado como alguém que luta contra a visão simplista de vilão ou herói. Ele não é apenas o “vencedor de Hastings”, mas um homem capaz de decisões brutais por orgulho, ciúme ou dor — lembrando, em suas próprias palavras, como “milhares morreram por causa de seus sentimentos feridos”.

O Paralelo Entre Jaime e William

O elo entre Jaime Lannister e William, o Conquistador, vai além da espada e do trono. Ambos são personagens históricos ou ficcionais que desafiam categorias rígidas de “bem” e “mal”.

Ambos lidam com Ambição e Orgulho: Jaime, ao matar o rei Aerys, agiu entre honra e sobrevivência, mas carregou para sempre o estigma da traição. William, ao exigir a coroa prometida, desencadeia uma guerra sangrenta por orgulho e senso de legitimidade.

Encaram o Peso do Amor: Jaime é humanizado por seu amor por Cersei, ainda que incestuoso. William é humanizado por seu vínculo com Matilda, uma relação de poder e afeto que o torna mais tridimensional.

Curiosamente, Símbolos de Poder unem Jamie e William porque ambos são representados por leões como estandartes — Jaime, o Leão de Lannister; William, o duplo leão normando. Uma coincidência que reforça a sobreposição entre mito e história e que os fãs de GOT logo vão pegar.

E claro, nos dois casos, Coster-Waldau insiste em trazer à tona cenas de vulnerabilidade.A brutalidade se equilibra com gestos de ternura.

William, o Conquistador na História e na Historiografia

A verdade é que, falamos de Jamie Lannister, mas o “verdadeiro” William na verdade foi uma inspiração para outro personagem de Game of Thrones, um que era o espelho invertido de Jamie, ninguém menos do que Jon Snow. Isso mesmo.

William, o Conquistador nasceu em Falaise, na Normandia, e era filho ilegítimo de Roberto, o Magnífico, por isso sua origem bastarda foi um estigma que ele carregou por toda a vida, algo que o marcou tanto quanto as cicatrizes de suas batalhas. Ainda jovem, precisou consolidar o poder contra nobres que desprezavam um líder “sem sangue puro”. O menino chamado de o Bastardo tornou-se o duque implacável e, mais tarde, rei da Inglaterra.

Essa narrativa já carrega ecos de Jaime Lannister: o peso de um rótulo infamante, a luta para afirmar-se, o desejo de ser reconhecido não apenas pelo estigma, mas pelas próprias conquistas. Sem esquecer, obviamente, da pitada Jon Snow.

As Fontes e o Viés dos Vencedores

Grande parte do que sabemos sobre William vem de fontes como a Crônica Anglo-Saxônica, os escritos de Guilherme de Poitiers (seu biógrafo) e a Tapeçaria de Bayeux. Mas como lembra o próprio Coster-Waldau, a historiografia medieval era parcial e apenas vencedores ditavam a narrativa. A tapeçaria, por exemplo, mostra Harold como um perjuro e William como herói escolhido por Deus.

Claro que familiarizados com a escola de George R. R. Martin reconhecem sua máxima em Game of Thrones com a ideia de que “a história é escrita pelos vencedores”. Jaime, chamado de “Regicida” por séculos, só mais tarde teve sua versão ouvida — ainda que tarde demais para mudar a percepção popular. William, por sua vez, cristalizou-se como “o Conquistador”, mas para os anglo-saxões derrotados ele foi também “o Usurpador”.

O Rei Cruel ou o Modernizador?

Historiadores divergem: William foi um tirano sanguinário ou um modernizador? Ele introduziu o feudalismo normando, ergueu castelos, fortaleceu a Igreja e produziu o Domesday Book, um levantamento administrativo pioneiro. Ao mesmo tempo, ordenou massacres como o Harrowing of the North, em que terras inteiras foram devastadas para sufocar rebeliões.

Esse contraste lembra Jaime: um cavaleiro capaz de gestos de honra (salvar milhões ao matar o Rei Louco) e atos brutais (empurrar uma criança da torre). Ambos os personagens vivem entre a glória da construção e a sombra da destruição.

Entre História e Fantasia

Por isso com a estreia da série, o paralelo entre Jaime Lannister e William, o Conquistador, não é apenas um recurso de marketing ou uma curiosidade visual. Ele revela como a ficção e a história se encontram naquilo que mais nos fascina: personagens maiores que a vida, ao mesmo tempo heróicos e condenáveis.

William construiu a Inglaterra medieval, mas também deixou rastros de sangue. Jaime foi um cavaleiro de lenda, mas também um criminoso. Em ambos, a humanidade se revela nos paradoxos.

E é aí que o trabalho de Nikolaj Coster-Waldau se destaca: ao invés de encarnar caricaturas de “vilão” ou “herói”, ele se especializou em mostrar que todo conquistador é também prisioneiro de sua própria imagem.


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