David Lean é um dos melhores diretores da História do cinema. Assinou produções vencedoras do Oscar como Dr. Zhivago, A Ponte do Rio Kwai e Lawrence da Arábia, para citar apenas três produções. Quando resolveu fazer o drama romântico A Filha de Ryan, estava no auge. Nada poderia dar errado. Mas deu.
A história é quase uma versão inglesa do clássico Madame Bovary, mas rodado na Irlanda, usando o conflito com a Inglaterra como pano de fundo. O americano Robert Mitchum, em um papel atípico, era a maior estrela do elenco, que incluía John Mills, Leo McKern e Sarah Miles.

Em uma pequena cidade isolada no norte irlandês, a jovem Rose, inexperiente e sem muitas possibilidades de mudar de vida, se casa com um homem muito mais velho, mesmo sendo advertida que seria um erro. Rapidamente se frusta com a união sem grande paixão e acaba se envolvendo com um jovem major britânico, traumatizado pela guerra. O amor dos dois é verdadeiro, mas contrário às morais de um período repressor e, mais ainda, por ser com um homem de nacionalidade inimiga. O que ninguém sabe é que o pai de Rose, Ryan, é na verdade um informante para o exército britânico e, quando acidentalmente o caso entre Rose e o major é revelado, ela é perseguida e humilhada pela cidade como se fosse a traidora do movimento rebelde.


O filme, todo rodado in loco, levou mais dois anos para ficar pronto. As histórias de bastidores sobre o perfeccionismo de David Lean são lendárias, como a que o diretor deixou de gravar por semanas por não ter captado a imagem que queria do vento movendo as nuvens. A sequência da tempestade sozinha, levou um ano para estar nas condições exatas que David Lean imaginou. A camera usou um equipamento especial, uma espécie de vidro acoplado que girava em grande velocidade para evitar que as gotas da água embaçassem a lente. Não foi por nada que um dos Oscars que o filme levou, em 1971, foi justamente de fotografia. Aliás, as imagens de A Filha de Ryan, filmado em Super Panavision, são tão perfeitas que Ron Howard as usou como referência para fazer Um Sonho Distante, 22 anos depois.

Além da lentidão do diretor, o elenco também teve alguns problemas. Sarah Miles, casada na época com o roteirista (Robert Bolt), não se entendeu com Christopher Jones, seu par romântico. O ator, também americano como Mitchum, teve que ser dublado por não acertar o sotaque inglês, gerando grande frustração.


Os críticos massacraram o filme, considerado arrastado (mais de três horas) e tolo. O status de cult foi quase imediato e A Filha de Ryan fez sucesso de bilheteria. O que ninguém ousa criticar é atuação de John Mills como o deficiente Michael, que lhe rendeu o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante, em 1971. Talvez se chamar o filme de “história de amor” diminua o que realmente trata, o conflito nacionalista que leva os irlandeses e apoiarem os inimigos alemães para poderem lutar contra os ingleses.

David Lean ficou extremamente magoado com a reação negativa para A Filha de Ryan. Ficou 14 longos anos sem trabalhar novamente até 1984 (quando ganhou novo Oscar, com Passagem para Índia). Hoje, A Filha de Ryan é basicamente elogiado pelo que tinha sido considerado negativo.
Não é um filme fácil de achar, mas vale a pena.

Reza a lenda, que o diretor David Lean passou enorme constrangimento para pedir à atriz Sarah Miles que simulasse um orgasmo. Ele simplesmente não sabia como tocar no assunto sem magoar a atriz. Coube à própria atriz a tarefa de perguntar-lhe se queria que ela fingisse um orgasmo. Além de excelente diretor, Lean era um perfeito cavalheiro.
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Vou postar sobre ele em breve! Completando 30 anos de sua morte…
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