Como publicado no CORREIO DO ESTADO
Tenho certeza que você já ouviu de muita gente “não suporto o Oscar”, mas todos assistem e acompanham a cerimônia que Cate Blanchett, a favorita do ano, chamou de “corrida de cavalos televisionada”. Outra certeza é que mesmo falando mal da festa, ninguém deixa de entrar para bolões de aposta ou assistir e comentar. É um vício cafona assumido.
A “corrida” começou oficialmente no dia 24 de janeiro quando confirmamos os indicados para o seleto grupo dos “melhores” da Indústria do ano. Vejam que falo sobre confirmar porque quem acompanha a ‘temporada de premiações’ percebe que rapidamente descobrimos os que sempre estarão na lista, só que esperamos até o final do mês para ter certeza. A partir dessa lista saem outras: a dos esnobados, a das novidades, as dos azarões. E se tem uma coisa que as últimas cerimônias mostraram é que literalmente tudo pode acontecer…
Então vamos falar de favoritos e azarões das cinco principais categorias? São tantas que até março, quando a festa acontece, prometo que voltarei ao tema. Hoje vou falar de Melhor Ator, Melhor Atriz e Melhor Filme apenas. Combinados?


Damas primeiro. Entre as atrizes há menos “drama” porque há muitas “novatas” e um favoritismo para Cate Blanchett levar seu terceiro Oscar para casa, o segundo como Melhor Atriz por sua atuação em Tár. Ela está estupenda em um papel antipático e até controverso, algo que ninguém pode negar. Sua principal adversária é Michele Yeoh, cuja atuação no elogiado Tudo Ao Mesmo Tempo Agora é sensível, divertida e empoderada em iguais medidas. Era inegável que a impressionante atuação de Ana de Armas como Marilyn Monroe em Blonde recebesse reconhecimento até porque é a única coisa que seria injusto ignorar de um filme horrível e massacrado pela crítica. A indicação já é sua vitória, as chances são menores.
Quem pode vir a causar a surpresa da noite é Andrea Riseborough, pelo dramático To Leslie, que comprova que a lista do SAG é a que espelha a o Oscar quase 100%. To Leslie é inspirado em uma história real e Andrea está no típico modelo de “sem maquiagem e sofrida” que é um estilo favorito do Oscar. Mais ainda, tem o apoio declarado de nomes influentes na votação como o de Gwyneth Paltrow e a própria Cate Blanchett. Fiquem de olho nela. Por último vem Michelle Williams por Os Fabelmans, que eu acho a injustiça da noite. Ela trabalha bem, e como a história do filme é a biopic de Steven Spielberg, parece que ficou impossível excluí-la. Sei sou impopular e diferente em discordar dos que vêem versatilidade nela, mas Michelle tirou a vaga de outras atrizes com entrega mais relevantes no ano (como Danielle Deadwyler em Till – A Busca por Justiça) e suas chances são remotas em 2023.


Entre os atores há um franco favorito que é quase certo: Brendan Fraser, mas há mais interesse típico do Oscar por conta das narrativas pessoais impactantes.
A “volta” de Brendan Fraser em The Whale, em uma atuação tão arrasadora é também uma história de recuperação. Brendan surgiu nos anos 1990s estrelando sucessos comerciais que exploravam seu físico e assim como a sua flexibilidade de se destacar tanto em dramas como comédias. Ter estrelado George, O Rei da Floresta e Deuses e Monstros em menos de um ano comprova o fato. Aliás, foi por Deuses e Monstros, em 1998, que muitos ficaram chocados que ele tenha sido esnobado como coadjuvante, vocalizado pelo respeitado Sir Ian McKellen (indicado a ator naquele ano). Os anos 2000s tinham tudo para vê-lo entre os atores em maior demanda, mas Brendan deu um freio no cinema depois de um divórcio conturbado, cirurgias no joelho, nas cordas vocais e ter passado por um assédio sexual (ele revelou há poucos anos que em 2003 foi abusado sexualmente por Philip Berk, presidente da Associação dos Correspondentes Estrangeiros em Hollywood durante o Globo de Ouro). Tudo isso somado foi o gatilho para uma depressão profunda e praticamente o afastamento dos holofotes. Agora, quase irreconhecível no papel de um professor obeso tentando se reconectar com a filha completa uma narrativa que a Academia simplesmente não resiste. O Oscar tem toda cara de já ser dele (e será merecido).
Outro entre os indicados a Melhor Ator também tem uma história de redenção: Colin Farrell. “Importado” da Irlanda ainda quando mal tinha 20 anos, era apontado na época como uma das maiores promessas mundiais no cinema, porém a dependência química e o alcoolismo interferiram nessa trajetória. De ator ultra requisitado, carregou nos ombros o fracasso de Alexandre, de Oliver Stone e apenas agora chega aonde previram que estaria ainda nos anos 1990s. Sua atuação em Os Banshees de Inisherin é uma das melhores de sua carreira, mas como fã nunca achei que Colin perdeu uma oportunidade de sempre estar bem, fosse em comédias, dramas ou filmes de ação. Sua história pessoal tem impacto como a de Brendan, mas a disputa está mesmo com um novato, Austin Butler.


Austin incorporou de tal forma Elvis Presley em Elvis que até hoje fala como ele. Sua atuação foi estupenda mesmo. O recente falecimento de Lisa Presley reascendeu a possibilidade de vir a ser uma linda homenagem à família Presley na cerimônia, mesmo que seja mórbido mencionar isso. Por outro lado, desde que Elvis chegou aos cinemas era certo que Austin estaria entre os favoritos. (Ainda aposto em Brendan Fraser)
Para fechar, temos o sempre querido Bill Nighy na refilmagem da obra Viver (Living), que consolida seu prestígio dos últimos 25 anos, mas é como Ana de Armas: a indicação já é a vitória. A mesma experiência coloca o novato Paul Mescal, o bebê dos indicados, como vencedor de estar entre os cinco. Paul é o “novo prodígio do ano”, em ascensão e só colhe elogios, seja nos palcos, nas plataformas e nas telas. Sem surpresa é apontado entre os favoritos para ser “o novo James Bond” e Aftersun é um drama elogiado que se render um Oscar para ele, seria “A” zebra do ano.


E entre os filmes, entre os 10 indicados a disputa parece estar entre dois favoritos. O às vezes confuso Tudo Ao Mesmo Tempo Agora pode fazer história se bater o tradicional Os Fabelmans, mas ainda acredito na força de Steven Spielberg que completaria um ciclo belíssimo em sua carreira se em 2023 ganhasse o Oscar de Melhor Filme homenageando o cinema e a seus pais. É “a cara do Oscar” se nos últimos anos o Oscar fosse tudo menos “surpresas”. Aliás, recomendo mais uma vez que busquem o belíssimo documentário Spielberg (exibido na HBO há alguns anos) porque ele é o contraponto de Os Fabelmans. Emocionante, perfeito e confere a popularidade do diretor que deve fazer do Oscar 2023 uma noite possivelmente nostálgica.
Antes de encerrar, não enlouqueci sobre não mencionar as chances de Top Gun – Maverick como o Melhor Filme do ano. É o melhor filme do ano, estabelecendo recordes nas bilheterias, adorado nos quatro cantos do mundo e sendo um esforço pessoal de Tom Cruise de manter o cinema, bem, no cinema. Seria um grande prestígio para ele ganhar seu primeiro Oscar como produtor diante de tudo que vem fazendo pela Indústria. Porém Top Gun pode não estar mais tão fresco na memória dos votantes nem Tom tão popular entre seus colegas (que não curtem sua opção religiosa). Tudo isso conta na hora do voto! E mais uma vez, se for a noite de Tom, será uma noite histórica.
Então, o Oscar de 2023 tem tudo para ser uma noite de belas homenagens. Será que diremos que será tediosa? A ver!

